O agora diplomata e general de quatro estrelas, que comandou as forças ucranianas na guerra com os russos até Fevereiro deste ano, altura em que foi substituído pelo general Oleksandr Syrskyi, citado pelos media britânicos, disse ainda que este conflito "fica mais todos os dias".
Estas declarações foram feitas esta semana, durante uma visita a um campo de treino de recrutas ucranianos no Reino Unido, onde estão a ser preparados para serem enviados para a frente de guerra e onde, segundo o agora diplomata ucraniano, vão para morrer.
"Lembrem-se que esta guerra está a ficar mais cruel todos os dias e não deixa praticamente nenhuma hipótese de sobreviver", explicou o ex-CEMGFA ucraniano aos jovens que se preparam no sul do Reino Unido para ocupar as trincheiras da linha da frente.
Na mesma ocasião, segundo The Times, Zaluzhnyi pediu aos mancebos para inserirem nas suas mentes a ideia de que na frente vai ser "matar ou morrer" e que não lhes vai chegar sobreviver o mais tempo possível, têm igualmente que cumprir as suas tarefas e objectivos aprendendo a lidar de frente com a ideia de que vão morrer.
Os jornais britânicos não fazem qualquer menção a eventuais reacções dos recrutas depois de ouvirem o embaixador do seu país e histórico comandante militar ucraniano a dizer-lhes que vão morrer no leste a combater os russos.
O general Valerii Zaluzhnyi deixou o cargo de comandante das forças ucranianas claramente em confronto de opiniões com o Presidente Volodymyr Zelensky, com quem se desentendeu sobre o desenho da estratégia para conduzir a guerra, tendo sido enviado para Londres como diplomata por pressão britânica de forma a aliviar tensões.
Com estas declarações que, como é natural, foram ouvidas pelos futuros ocupantes das trincheiras no leste ucraniano com, no mínimo, apreensão, as relações do general Zaluzhnyi com o Governo ucraniano não terão melhorado.
Entretanto, no teatro da diplomacia em Kiev...
... as embaixadas ocidentais, cerca de uma dezena, que foram a reboque dos Estados Unidos e fecharam as portas na quarta-feira, 20, devido à existência de informações sobre um iminente ataque de grande envergadura russo à capital ucraniana, preparam-se esta quinta-feira, 21, para reabrir.
A ameaça de ataque russo surgiu num contexto de uso, pela primeira vez, dos misseis balísticos de alcance intermédio norte-americano, ATACMS, com 300 kms de alcance, sobre a profundidade do território da Federação Russa, sendo esse ataque a Kiev uma resposta de Moscovo a esse atrevimento. (ver links em baixo nesta página)
Porém, já nesta quinta-feira soube-se, por confirmação oficial, que também os Storm Shadow britânicos, misseis de cruzeiro que alargam o risco de retaliação abrasiva russa devido ao seu alcance superior aos ATACMS, perto de 550 kms, o que permite a Kiev atingir Moscovo ou São Petersburgo.
O Presidente ucraniano não gostou de ver as embaixadas ocidentais fechadas, mesmo que temporariamente, e criticou vigorosamente os países que o fizeram, considerando que os EUA, Reino Unido... soçobraram à "guerra psicológica" do Kremlin.
Em dois dias, a Ucrânia usou, depois de obter autorização para isso de Washington e Londres, contra alvos russos além da linha de combate, misseis ocidentais que integram as linhas vermelhas do Kremlin, aumentando o risco de chuva de misseis sobre Kiev.
Os ATACMS e os Storm Shadow são projecteis já familiares no terreno desta guerra, sendo usados em sucessivas tentativas, sem sucesso, de destruir alvos simbólicos para Moscovo, como a Ponte da Crimeia.
Depois de mais de um ano de insistência por parte de Kiev ao Presidente norte-americano, apenas a menos de dois meses de sair de cena é que tal autorização foi dada por Joe Biden, e numa altura em que os analistas sublinham que já não poderão fazer qualquer diferença no desfecho da guerra, que está inequivocamente a cair para o lado russo.
A possibilidade com mais acolhimento entre os especialistas e analistas é que Joe Biden esteja a tentar complicar a vida ao seu sucessor e arqui-inimigo, o Presidente-eleito Donald Trump, para quando este tomar posse, a 20 de Janeiro, não conseguir, como prometeu, acabar com o conflito em pouco tempo.
Existe ainda uma segunda e concomitante possibilidade de Biden estar a querer garantir como legado a ideia, mesmo que tardia, de que tudo fez para acomodar os pedidos de Kiev para poder levar de vencido este conflito.
Vitória em que os ucranianos já não acreditam
Uma das fórmulas mais conhecidas para levar a opinião pública de um país a aceitar condições menos vantajosas num cenário de negociações é elaborar estudos de opinião, sondagens, onde a maior parte dessa população aceita as "perdas inevitáveis" em nome do fim da guerra.
Isso mesmo já tinha sido colocado como cenário possível por diversos analistas para alivair tensões sociais em caso de a Ucrânia ser forçada a sentar-se à mesa com a Rússia para acabar com a guerra.
E esta quarta-feira, a norte-americana Gallup, uma das mais poderosas organizações privadas de sondagens e aconselhamento para empresas e países, divulgou uma sondagem que mostra que a maioria dos ucranianos passou a defender negociações comos saída para o conflito.
Este estudo põe em evidência que o número de ucranianos que defendem essa via para acabar com a guerra duplicou em menos de um ano, sendo agora 52% os ucranianos que defendem como melhor caminho as negociações, quando ainda há menos de um ano eram apenas 27%.
No preâmbulo do estudo, pode-se ler, segundo o site Gallup News, que "depois de dois anos de um doloroso conflito, os ucranianos, de forma crescente, mostram-se cansados da guerra com a Rússia".
O estudo, realizado entre Agosto e Outubro, diz ainda que, agora, apenas 4 em 10 ucranianos (38%) defendem que o país deve lutar até ao fim com os russos, quando esta percentagem era de mais de 70% no início de 2023.
"Estes dados recolhidos pela Gallup mostra uma viragem enorme no sentimento público na Ucrânia à medida que o impacto negativo da guerra na sociedade ucraniana aumenta", o que, acrescenta o texto, mostra o aumento substantivo do cansaço social da guerra no país.
Um dos elementos percepcionados neste estudo de opinião é que a sociedade ucraniana está consciente de que a chegada ao poder de Donald Trump nos EUA exige acção em conformidade, nomeadamente aproveitar este lapso temporal para poder negociar em melhor posição.
"A perspectiva do regresso de Donald Trump à Casa Branca pode estar a criar incerteza sobre o decorrer do apoio militar e financeiro dos EUA", alerta ainda o texto do Gallup News.