Neste contexto, os mecanismos não formais de controlo social emergem como ferramentas poderosas. São acções individuais ou colectivas, não institucionalizadas, que partem da sociedade civil, da imprensa livre, do sector privado ou mesmo de cidadãos comuns. Estes mecanismos não substituem o sistema formal, mas complementam-no, pressionam-no e obrigam-no a funcionar.
A transparência, a prestação de contas e a responsabilização são os três pilares que sustentam qualquer democracia funcional e contribuem para a prosperidade económica de qualquer país . Mas, em Angola, onde o acesso à informação é frequentemente negado ou dificultado, e onde o cidadão é muitas vezes excluído dos processos de decisão, é necessário que a sociedade tome a iniciativa.
Imagine-se um cidadão que ouve, num discurso oficial, que uma estrada nacional foi reabilitada. Ao visitar o local, constata que a obra está parada ou mal executada. Esse cidadão pode recorrer à Lei de Acesso à Informação, divulgar imagens nas redes sociais, organizar reuniões comunitárias e envolver a imprensa. Esta sequência de acções, embora informal, cria uma pressão real e imediata sobre os responsáveis públicos.
Organizações como o OPSA, o Centro de Investigação da Universidade Católica, e outros, têm desempenhado um papel fundamental ao traduzir dados técnicos em informação acessível. Movimentos cívicos mostram como o protesto público pode forçar respostas institucionais. O jornalismo cidadão, amplificado pelas redes sociais, transforma cada telemóvel num instrumento de fiscalização.
A imprensa independente é outro actor essencial. O jornalismo investigativo revela escândalos que escapam ao radar das instituições formais. Os editoriais moldam a narrativa pública e colocam temas críticos na agenda nacional, obrigando os decisores a prestarem contas.
No sector privado, os denunciantes - ou whistleblowers - são peças-chave. Funcionários que expõem irregularidades, movidos por um sentido ético, precisam de protecção legal e apoio social. As práticas de compliance e ESG também têm um papel importante, ao elevar os padrões de transparência e pressionar o Estado a seguir o exemplo.
Contudo, estes mecanismos enfrentam riscos significativos. A intimidação de jornalistas e denunciantes, a desinformação nas redes sociais, a descrença cívica e o acesso limitado a dados são obstáculos reais. A frase "isso não vai adiantar nada" é talvez o maior inimigo da cidadania activa e do progresso que todos e todas almejamos.
Por isso, é fundamental investir em educação para a cidadania, proteger os denunciantes, apoiar o jornalismo independente e desenvolver tecnologia cívica que facilite o controlo social. A transparência não é um fim em si mesma, mas o caminho para a responsabilização. E esta só se concretiza quando os cidadãos assumem o seu papel de fiscalizadores da coisa pública.
Em Angola, onde o Estado de Direito ainda se consolida, os mecanismos não formais são o anticorpo social contra a corrupção e a má gestão da coisa pública. São a ponte entre o cidadão comum e as instituições formais. Tornam a governação um processo vivo, dinâmico e participativo - e não apenas uma formalidade distante.
Não devemos esperar que as instituições funcionem por si só. Devemos ser nós, com as nossas acções, a garantir que elas funcionem.
*Coordenador OPSA

