Numa embarcação, quem governa é o homem do leme, que em cada momento escolhe o rumo e a velocidade para ir de um ponto para o outro. O homem do leme deve perceber os avisos à navegação que lhe chegam da "tripulação", perceber os sons, os alertas, os "barulhos" dos mares em que navega. Ao entrar por mares nunca dantes navegados, o homem do leme não pode perder a possibilidade de entrar no mundo alheio, de perceber que há mais mundos para além do seu mundo; que há um mundo por descobrir, com visões e opiniões diferentes. Um mundo de gente que segue na mesma embarcação, que navega no mesmo mar, que quer ouvir do homem do leme em que direcção aponta a bússola, qual o sentido do vento. Há quem pergunte e há quem se cale, o homem do leme deve também ter a capacidade de decifrar os silêncios e interpretar os barulhos.
"Sozinho na noite/ Um barco ruma/ Para onde vai?/ Uma luz no escuro/ Brilha a direito /Ofusca as demais". A navegação será muitas vezes solitária, feita no escuro e parecendo, muitas vezes, sem direcção. Haverá questionamentos, incertezas e indecisões, mas ele não pode perder o leme e ficar sem norte. Ele é o homem do leme, que assumiu a embarcação e que, entre ventos e tempestade, terá de nos levar a bom porto. O homem do leme deve navegar sem temer, porque a tormenta pode ser só uma tempestade e o " Cabo da Boa Esperança" pode estar já à vista. A vida é sempre a perder, o homem do leme tem uma rota traçada, com uma tripulação que já navega há quatro anos e sem ver terra firme, que sofre com as tempestades do mar. Uma tripulação dividida entre aqueles que desconfiam da rota seguida, que têm medo de naufragar, que tentaram, inicialmente, ter dois homens no leme e que agora desconfiam do actual homem do leme. E aqueles que confiam na rota, seguem tranquilamente a viagem, afirmando que em 2022 se vai atracar em bom porto, será feito o abastecimento da embarcação, ligeiras mudanças na tripulação e seguir nova viagem com paragem marcada apenas em 2027.
E o homem do leme segue viagem. Os "marimbondos" vão ficando em terra, os caranguejos maus são atirados de volta para o mar e os caranguejos bons colocados em baldes onde já se sabe que de lá nunca sairão. É uma viagem onde os seus são só os seus e os outros são apenas os outros. Tudo depende do homem do leme, da rota traçada e do destino almejado. Num mar em que ainda lhe incomodam alguns "barulhos" e onde pretende navegar em silêncio, sem a possibilidade de ser alertado para os mistérios e perigos do mar, ou do "mostrengo", a figura que Pessoa diz estar no fim do mar e que assim resumiu na sua obra.
" Aqui do leme sou mais do que eu.
Sou um povo que quer o mar que é teu
E mais que o Mostrengo qu e a alma teme
E roda nas trevas do fim do mundo
Manda a vontade que me ata ao leme"