Entre bom, péssimo e mal, como o UNICEF classifica a situação da criança em Angola?
A situação é regular. Não é má, nem boa e nem óptima. A criança em Angola ainda tem muitos desafios. Não tem todos os direitos respeitados. Temos muitas crianças que ainda não têm acesso à saúde, que ficam fora da escola ou que sofrem violência sexual. A situação melhorou, mas ainda não está onde o País tinha que estar. Ainda precisa de muito trabalho.
A que trabalho se refere e como é que pode ser melhorada a situação ?
O maior desafio está ligado à implementação das leis e das políticas [públicas] nacionais. O País tem um avanço muito importante em termos de legislação. As políticas têm todo o conceito dos direitos da criança incorporado, mas o problema é a implementação. Não temos todos os recursos financeiros que se precisam para a implementação dessas políticas. Não temos ainda mecanismos de monitoramento para saber exactamente qual é a situação da criança. Temos apenas os dados de 2015/2016, não temos dados novos para saber exactamente qual é a situação da criança em muitos aspectos: nutrição, saúde e educação. Então é difícil para um País ter políticas e programas se não souber qual é a situação da criança. É por isso que o maior desafio está na disponibilização de dados e de um sistema de monitoramento para saber qual é a situação da criança, para a implementação das políticas nacionais.
Então é aí que reside o problema?
O que está acontecer é que temos os documentos, as políticas, os 11 compromissos da criança. Temos a Declaração de Luanda, um documento em que o Governo se compromete em melhorar a situação da criança em relação à imunização, desnutrição crónica e acesso à atenção primária de saúde. É um documento muito bonito, mas ainda não temos um plano de implementação desse documento. Esse é o maior problema, a implementação das políticas. E possível que tenhamos ainda também a decisão política. O Governo conhece qual é a situação, sabe que precisamos da implementação, mas ainda o maior desafio é precisamente na implementação dos programas e das políticas nacionais.
Mas o que se pode fazer para se avançar com a implementação?
O desafio não é só para o Governo. É também para a sociedade civil e a cooperação internacional. Estamos aqui para trabalhar com o Governo, para tentar, por exemplo, que o Orçamento Geral do Estado tenha os recursos para garantir o acesso universal aos serviços essenciais básicos, como a imunização. Ainda temos 300 a 400 mil crianças que nunca foram vacinadas. Não pode ser. É uma prioridade. O serviço básico da saúde é a imunização. Toda a criança tem que ter acesso à vacina. Não é uma coisa nova que a cooperação internacional está a trazer. O Governo e a Assembleia Nacional conhecem os dados, mas precisamos mesmo é de trabalhar para procurar uma maneira inovadora de fazer as coisas. É possível, porque agora estamos a utilizar muito mais a tecnologia, porque os processos estão a mudar e não podemos continuar a fazer as mesmas coisas que fazíamos há 10 anos, temos que mudar a maneira como trabalhamos com as crianças e com as famílias. E a inovação não só tem que ver com as tecnologias. A inovação pode ser só trabalhar a nível das casas e das famílias. A inovação é uma coisa que precisamos de incorporar em tudo o que fazemos.
Mas como incorporar essa inovação?
O problema tem muito que ver com a logística. Por exemplo, o Governo está a procurar todas as vacinas de que o País precisa. Agora o OGE tem pressuposto para a compra das vacinas, mas, se quisermos chegar a uma criança numa comunidade muito longe da cidade, precisamos de logística, viaturas e de pessoal da saúde para vacinar ou levar a informação para que as famílias possam trazer as crianças aos postos de saúde. O que não está a acontecer muito bem é a logística. Esse é o maior problema, o acesso aos serviços básicos sociais.
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