As suspeitas do envolvimento de políticos com assento no Parlamento da República Democrática do Congo (RDC) surgiram depois da divulgação de uma gravação encontrada no computador pessoal da funcionária sueca da ONU, Zaida Catalan, morta em Março passado, no Kasai, quando investigava a violência nesta província que faz fronteira com a angolana Lunda Norte.

Em particular evidência, como estão a divulgar os media congoleses, está uma alegada conversa entre o deputado e antigo ministro, natural do Kasai, Clément Kanku, e um líder local das milícias de Kamwina Nsapu, o chefe tradicional morto em Agosto de 2016 pelas forças de segurança, depois de, em Abril do mesmo ano, se ter sublevado em armas contra o poder central de Kinshasa.

A confirmar-se este envolvimento de Clément Kanku na violência no Kasai e Kasai Oriental, dificilmente será caso único, e eleva esta questão de grande melindre a um nível cujas consequências podem ser trágicas.

Para já, como revela a rádio Okapy, criada pela missão da ONU na RDC, a MONUSCO, nos corredores da política congolesa começa a exigir-se um inquérito rigoroso a este episódio por forma a determinar se os conflitos nos Kasai estão a ser usados por forças políticas com interesses ainda por determinar.

Até ao momento sabe-se de forma segura que os combates entre as Forças Armadas da RDC (FARDC) e os milicianos de Kamwuina Nsapu, que têm aparecido, à medida que o tempo passa, melhor armados, sendo certo que inicialmente tinham apenas catanas e alguns canhangulos, continuam sem que surjam sinais de poderem terminar em breve, apesar da operação de larga escala que as forças de segurança enviadas por Kinshasa têm em curso desde Março.

Sabe-se ainda que desde Fevereiro deste ano começaram a surgir relatos de confrontos entre as etnias locais que se posicionaram a favor ou contra a acção das FARDC, envolvendo, inclusive, os Tshokwe, cuja ramificação étnica para os Tchokwe das Lundas, Norte e Sul, é evidente e constitui um facto extra de preocupação para as autoridades angolanas, já a braços com uma crise severa provocada pelos mais de 30 mil refugiados que chegaram á Lunda Norte em fuga da violência nos Kasai congoleses.

Mas, sendo já uma situação de extrema gravidade o que se passa no país vizinho, junto à fronteira com Angola, pode ainda piorar se se confirmar que há envolvimento de políticos a incentivar a instabilidade e a violência.

E sinal de que assim é surgiu na gravação da funcionária da ONU, onde o antigo ministro e deputado eleito pelo Kasai, Clément Kanku aparece a falar com um líder das milícias que, segundo a Okapy, o informa da evolução de um combate que está a decorrer entre os homens de Nsapu e as FARDC.

Da parte angolana, como confirmaram as chefias militares, foram reforçados os contingentes junto à fronteira e também, como foi igualmente admitido, em território congolense, junto à linha divisória dos dois países na região mais exposta aos conflitos vigentes.

Entretanto, ma conversa, o chefe miliciano reporta a Kanku um episódio de violência em que esteve envolvido na zona de Tshimbulo, uma localidade da província do Kasai, sendo este o diálogo gravado: Miliciano: - Queimamos tudo em Tshimbulo! Kanku: - É bom queimar tudo"

Um dos riscos possíveis para a situação no Kasai pode estar no aproximar da data das eleições, Dezembro próximo, acordada no acordo de 31 de Dezembro de 2016, que permitiu acalmar a situação em Kinshasa, depois de confrontos que fizeram centenas de mortos.

Os conflitos em curso em várias províncias congolesas, como é o caso dos Kasai, mas também noutras regiões, como os Kivu, Norte e Sul, podem servir para, mais uma vez, protelar as eleições porque a violência não permite uma votação normal nem a conclusão do registo eleitoral, essencial para poderem ter lugar as eleições.

O actual Presidente, Joseph Kabila já devia ter saído do poder em Dezembro do ano passado mas, alegando a impossibilidade de realizar eleições em Novembro devido ao atraso no registo eleitoral, conseguiu prolongar a sua presidência por mais um ano, estando, no entanto, constitucionalmente impedido de se recandidatar a um terceiro mandato.