Esta incursão das ADF, organização terrorista que desde a década a de 1990 tem assumido um papel de primeira linha na desestabilização do Leste do Congo-Democrático, veio relançar a questão da falta de segurança naquela província e surge num momento em que o país e a comunidade internacional procuram criar condições para realizar eleições a 23 de Dezembro, que vão ficar marcadas pela transição de poder com a saída de cena do Presidente Joseph Kabila.

Para além dos mortos, incluindo pelo menos seis militares que morerram a combater os rebeldes, ficaram ainda feridas mais de uma dezena de pessoas.

Os combates começaram com uma incursão da guerrilha contra um posto militar das Forças Armadas da RDC (FARDC), em Kasinga, zona limítrofe da cidade de Beni, capital do Kivu Norte.

As forças militares da RDC conseguiram, segundo a imprensa congolesa, repelir o ataque dos guerrilheiros, mas, pelo caminho, para além dos mortos e feridos, ficou também o receio de que este ataque signifique o regresso do terror que durante anos, desde meados da década de 1990, as ADF espalharam na RDC a partir de território ugandês.

As ADF foram uma das principais forças desestabilizadoras no Leste da RDC nos anos de 1990, e, como outros grupos de guerrilheiros, entre estes a FDLR (Frente Democrática de Libertação do Ruanda), surgiu a partir das convulsões regionais provocadas pelo genocídio ruandês de 1994, onde morreram mais de 800 mil tutsis às mãos de Hutus.

Com este ataque, alguns observadores admitem que esteja a caminho uma nova fase de violência dirigida e com o objectivo de desestabilizar a RDC quando este país se prepara para realizar uma das mais importantes eleições da sua história enquanto país independente, porque o mundo quer que sejam as primeiras desde 1960 sem violência quando está em causa uma transição de poder.

Para já, segundo a Okapi, a rádio das Nações Unidas na RDC, o porta-voz operacional das FARDC na região, capitão Mak Hazukay, a confirmação da acção guerrilheira vai exigir o esforço do país para combater este tipo de terrorismo, aproveitando para apelar ao "despertar de todos" para lhe fazer frente.

Isto, porque, como é admitido por todos os organismos africanos e da ONU, a estabilidade do Congo nesta fase pré-eleitoral é essencial para salvaguardar a estabilidade do próprio continente, com destaque para os países vizinhos e de toda a região dos Grandes Lagos, da qual Angola faz parte no âmbito da Conferência Internacional da Região dos Grandes Lagos (CIRGL).

Este responsável das FARDC sublinhou, em tom de acusação, que as ADF voltaram às suas práticas terroristas na RDC sob comando de ugandeses, informando que os guerrilheiros se estão a infiltrar junto das populações locais como forma de evitarem as forças militares congolesas que estão no seu encalço.

"Estes ataques exigem que procuremos saber exactamente o que se passa, porque é preciso encontrar uma explicação para isto", disse Mak Hazukay, adiantando que esse trabalho de investigação e combate às ADF está a ser feito com o apoio armado da MONUSCO, a missão das Nações Unidas na RDC.

Guerrilha e vírus do Ébola, uma mistura explosiva

Estes ataques ocorreram numa região que vive desde o início de Agosto uma grave epidemia de Ébola, que já provocou mais de 90 mortos.

A epidemia de Ébola que a RDC enfrenta desde 01 de Agosto está às portas do Uganda, o que levou o Governo de Kampala a lançar um alerta geral para garantir que a epidemia não atravessa a fronteira, apesar de a área que agora está a ser afectada, Butembo, no Kivu Norte, ser altamente povoada e, por isso, mais difícil de conter a sua dispersão.

Esta é a 10ª epidemia de Ébola que a RDC vive desde que o vírus que provoca esta grave e de elevada mortalidade febre hemorrágica foi descoberto pela primeira vez em humanos, decorria o ano de 1979, na província do Equador, junto à fronteira entre o Congo-Democrático e o Congo-Brazzaville, nas proximidades do Rio Congo.

Desde 01 de Agosto, as unidades médicas e as equipas das agências da ONU - Organização Mundial de Saúde (OMS) e UNICEF, mas também os Médicos Sem Fronteiras (MSF) - que combatem a epidemia no terreno já registaram 92 mortos e quase uma centena e meia de diagnosticados com a febre hemorrágica, sendo já uma das mais graves desde que em 2013, na África Ocidental - Libéria e Serra Leoa - morreram mais de 11 mil pessoas com esta mesma doença.

Para piorar o cenário, o vírus está agora implantado numa área de intensa actividade militar e de guerrilhas/milícias, com milhares de deslocados e refugiados, nas proximidades do Parque Nacional de Virunga, no Kivu Norte, que atravessa a linha de fronteira com o Uganda, o que dificulta sobremaneira o trabalho das equipas que procuram conter esta mortífera patologia.

A par desta realidade, a cidade de Butembo, habitada por mais de 1 milhão de pessoas e onde foram descobertos os últimos casos mortais de Ébola, é um afamado centro comercial que recebe milhares de pessoas diariamente oriundas de países vizinhos, como o Uganda, Ruanda, Quénia e nacionais congoleses.

Milhares de pessoas abastecem-se diariamente de mercadorias em grossistas instalados em Butembo, o que, como sublinha a OMS, porque a proximidade entre indivíduos é essencial à contaminação, é um dos factores mais sensíveis para a definição de estratégias de contenção deste tipo de doenças.