O escritor José Luís Mendonça defende que o preço ideal do livro literário tinha de oscilar entre os 3000 e 5000 kwanzas, contando com uma subvenção do Estado. O também jornalista refere que o principal problema para o encarecimento do livro está na baixa quantidade de tiragem na impressão, que varia de 400 a 1000 exemplares. Tal como é factor característico na economia de escala, na gráfica quanto menos tiragem, mais caro fica o livro. "O mínimo de tiragem tinha de ser de 10 mil exemplares", avança JLM, acrescentando que, com essa quantidade estimada, já se poderia vender, à vontade, o livro a três mil kwanzas.

Outro problema que contribui para a enfermidade na promoção da literatura em Angola, aponta, é a falta de distribuidoras. "Tu vês camiões transportarem cerveja para o interior, mas não vês carrinha transportar livros", critica.

O académico reprova a prática de certos autores e editoras que, mesmo tendo patrocínios para os livros, continuam a elevar os preços. "Há editoras a que o autor paga pelo livro todo,

mas, ao invés de vender a dois mil, vende a oito mil kwanzas, por isso é que ninguém compra", lamenta.

JLM coloca a questão, portanto, sob perspectiva da produção, que é baixa, e sugere que o Estado devia garantir a compra de determinadas quantidades de livros para as escolas, o que estimularia o aumento da produção e, por conseguinte, desbarataria o livro. E, para assegurar a qualidade do livro, o escritor propõe a criação de uma mesa de leitura constituída por entidades dos Ministérios da Educação e da Cultura, para avaliar as obras que vão para as bibliotecas. Esse, aliás, é um dos elementos contidos no Plano Nacional do Livro e da Promoção da Leitura, apresentado há dois anos por JLM ao Ministério da Cultura e Turismo, mas, lamenta, não é tido nem achado.

O autor até chegou a ser recebido pelo então ministro Jomo Fortunato. "Não demorou, saiu, nunca mais me chamaram", confessa JLM.

Os custos editoriais variam em função do número de páginas de um livro e da quantidade de exemplares a produzir. Isso é apenas no âmbito da impressão, explicou ao Novo Jornal o editor literário Arlindo Isabel. De acordo com o também fundador da Mayamba Editora, o processo literário começa com a recepção à leitura de um texto proposto por um autor para um parecer sobre o conteúdo, esse, por via de regra, cobra 1000 a 1500 por página, embora haja também a modalidade de cobrança global. Segue-se o custo de revisão, também baseado no número de páginas, vai de 2000 a 3000 Kz. A paginação é outro dos custos, que, para além de se fundamentar no número de páginas, tem em conta a complexidade do texto (uso de fotografias, gráficos, etc.). Depois vem o custo de impressão. Esses custos todos, somados e divididos pelo número de exemplares.

A editora assume, ainda com base numa obra, o Imposto sobre Rendimento de Trabalho (IRT).

Arlindo Isabel também coloca o problema na perspectiva de produção, nomeadamente da escassez da matéria-prima, que é importada. O País não fabrica papel, e a aquisição em grandes quantidades implica custos, devido à conservação. A tinta também vem de fora, esclarece, juntamente as chapas para a impressão. Os técnicos para a superação de avarias vêm de fora. "Ao longo destes anos, não conseguimos formar técnicos para a indústria gráfica", lamenta.

O editor refere que a margem de lucros na venda de livros é bastante reduzida, diferente de outro tipo de comércio. Oscila entre 10 e 20%, quando a lei autoriza até 35%. "Se nós aplicarmos a percentagem de lucro conforme a lei, o livro chega ao mercado a um preço muito alto", observa o editor.

Livro na cesta básica

O Plano Nacional do Livro e da Promoção da Leitura tem várias estratégias, com destaque para a leitura na escola e fora dela, que seriam realizadas através da oratura (literatura oral - tradicional), que consiste em os meninos fazerem leituras de contos em voz alta.

O objectivo central do plano, segundo o documento a que tivemos acesso, é promover a leitura como factor de desenvolvimento do homem angolano e do progresso científico, económico e social de Angola, até se atingir um índice mínimo de leitores, cifrado nos 20 % da população (sete milhões de leitores), nos próximos cinco anos.

O "grande fio condutor" do Plano Nacional do Livro e da Promoção da Leitura consiste em fazer do livro um alimento verbal da Cesta Básica Familiar (oferta de proximidade do consumidor).

O autor destaca que o contexto cultural de escassez de políticas disseminadoras e promotoras do livro e da leitura é agravado pelo contexto global dominado pela hipermídia digital e pelo seu fruto civilizacional, o Homo Zappiens.

Todo esse conjunto de condicionalismos histórico-culturais e económicos, de acordo com o documento, situa o público leitor angolano num cálculo a priori, baseado na tiragem média actual de uma obra literária de um autor consagrado, à volta dos 0,0013 % da população (ou seja, apenas 400 cidadãos activamente viciados em leitura).

Política do Livro em "águas de bacalhau"

O Estado é chamado a concretizar as suas atribuições de promoção da leitura. "É a atribuição do Estado a promoção da leitura", reforça Arlindo Isabel. O que é facto é que o Governo aprovou, em 2011, através do Decreto Presidencial n.º 105/11, de 24 de Maio, a Política Nacional do Livro e da Promoção da Leitura (PNLPL), que prevê, dentre outras medidas, a redução de taxas e impostos sobre as actividades livreira, editorial e gráfica. Entretanto, o diploma ainda não está regulamentado.

A estratégia de implementação prevê a constituição de um Fundo Livreiro e de uma Comissão Multissectorial para acompanhar o processo. Essa comissão foi criada em 2018. No ano passado, o ministro Filipe Zau foi questionado sobre o processo, respondeu apenas que estava "em andamento".

A comissão, que deve submeter, anualmente, um relatório de actividades ao Titular do Poder Executivo, é coordenada pelo ministro da Cultura, Turismo e Ambiente e integra os ministros do Comércio, Ensino Superior, Ciência, Tecnologia e Inovação, Telecomunicações, Tecnologias de Informação e Comunicação Social, Educação e Acção Social, Família e Promoção da Mulher.

A estratégia, cuja concepção participou o editor Arlindo Isabel, determina que o Governo deve atribuir tarifas especiais para a transportação do livro. Estabelece também a aquisição, pelo Estado, de pelo menos 20% da primeira edição de cada livro angolano, que se considere de interesse para o enriquecimento das unidades de informação que integram os sistemas de bibliotecas públicas, universitárias e escolares, sob responsabilidade do Executivo.