As autoridades governamentais garantem ter um plano para solucionar o problema. O assunto levou à rua a reportagem do Novo Jornal.
Vários 'workshops', debates e encontros têm sido promovidos, de algum tempo a esta parte, ao nível do país para reflectir sobre os obstáculos que "minam" o desenvolvimento do desporto angolano. Nestes encontros é frequente concluir-se que o desaparecimento de campos e locais de lazer, sobretudo nos bairros, tem um peso considerável no quadro crítico em que se encontram algumas modalidades desportivas, com maior visibilidade para o futebol.
Constantemente vários agentes desportivos dirigem críticas às instituições do Estado, particularmente aos Governos provinciais e o Ministério da Juventude e Desportos, alegando que estas não têm dado resposta "à invasão" de construções, sobretudo imobiliárias, nos locais onde anteriormente existiam espaços desportivos e de lazer. Numa ronda feita pelos bairros de Luanda, o Novo Jornal visitou vários locais onde outrora estavam 'ancorados' espaços destinados a jogos, como futebol, basquetebol e andebol, praticados, em especial, entre os jovens.
Em muitos bairros há situações em que os jovens "fecham" as vias públicas na ânsia de encontrarem locais para a prática do desporto, sobretudo futebol de salão e basquetebol. Dados apurados pelo NJ apontam que o desaparecimento de campos nos bairros de Luanda começou no final da década de 90. Com mais intensidade, a invasão do "betão" deu-se depois da conquista da paz, em 2002, quando o país começou a ser foco de muito investimento, sobretudo no segmento imobiliário. Uma das paragens da nossa reportagem foi o campo da Refrinor, no Hoji-Ya-Henda, município do Cazenga, que era, sobretudo na década de 90, palco de grandes "trumunus" entre muitas equipas formadas por jovens.
Pela Refrinor, cujo terreno está vedado e entregue a uma empresa de produção de plásticos, passaram várias referências do futebol nacional, como Love Kabungula, Avex e Mabiná. Ligado historicamente ao campo da Refrinor está também o actual treinador campeão nacional, pelo Recreativo do Libolo, Miller Gomes, quando trabalhava nos escalões de formação da Rangol, actual Benfica de Luanda. "Tentámos travar mas não aguentámos. Vedaram mesmo o campo, dando lugar a uma indústria que, inclusive, funciona perto de zonas habitadas. Ficámos sem local para jogarmos à bola. Até basquetebol se praticava aqui. Assim não se pode esperar um futuro risonho para o nosso desporto", realçou Quim das Botas, morador do bairro do Hoji-ya-Henda.
Ainda no município do Cazenga, nos arredores do mercado do Asa Branca, existiu o campo da Socifex, o qual, à semelhança da Refrinor, deu lugar a uma unidade fabril, vocacionada para a produção de blocos. Também desapareceu naquele populoso município de Luanda o campo 4 de Fevereiro, que viu nascer vários desportistas, como Mendonça e Alvarito.
Actualmente o local alberga as instalações do Marco Histórico, onde funcionam várias organizações alheias à prática desportiva. João Augusto Kapunda, morador do bairro Maculusso, ainda tem memórias do campo do Nzinga, no 1.º de Maio, espaço que deu lugar à construção das Torres Dipanda. "É preocupante. Tudo quanto é areia está a ser substituído por betão. O campo do Nzinga era um lugar estratégico para a prática do desporto, porque está localizado à volta de várias instituições escolares. Muitos garotos descobriam aqui o talento para o desporto. Como é que se destrói um lugar assim, sem se encontrar alternativa", indagou Kapunda.
No Rangel há muitos anos que o campo dos CTT deixou de receber partidas de futebol, para acolher o estaleiro da empresa de construção civil Namkwang.Vários recintos desportivos deixaram de existir na malha urbana da cidade de Luanda. É o caso do campo adjacente à Rádio Nacional, também este que foi substituído por um estaleiro de uma outra empresa chinesa.
"Os fins-de-semana eram vividos com muita intensidade. Havia condições para prática desportiva e lazer. Vários clubes profissionais enviavam para aqui os seus olheiros, que levaram muitos talentos. Hoje virou estaleiro", referiu Armando Gunza, morador nas imediações do antigo edifício da Angola Telecom. Na zona 10 do Golfe foi destruído um campo onde nasceram outros talentos como Loló e Elísio, dois futebolistas que estiveram em destaque na defesa das cores do 1.º de Agosto.
A interdição para a prática desportiva como futebol e atletismo naquele recinto foi feita pela administração do Golfe, com o argumento de que se iria construir no local um hospital público. Segundo constatou a reportagem do NJ, testemunhado por populares, o campo da zona 10 é usado actualmente como parque de estacionamento e lugar de venda de bebidas alcoólicas.
A reportagem do NJ visitou ainda outros locais que deixaram de ser palco da prática de actividades desportivas ma capital, dando lugar a outros projectos, como são os casos do Campismo e Lada, no distrito do Sambizanga.
Entre os dados recolhidos salta ainda à vista o desaparecimento do espaço para o desporto no Clube Nocal, no Cazenga, agremiação que formou vários atletas, com destaque para o basquetebolista Miguel Lutonda, eleito por duas vezes MVP nos Afrobasket.