Manuel Nunes Júnior, em resposta a um conjunto de questões da Bloomberg, explicou que a venda deste banco, o 13º maior de angola em activos, tem ainda como objectivo aferir do interesse dos grandes investidores internacionais pelo que Angola tem para oferecer neste capítulo, que, como se sabe, são, ainda, mais de 150 empresas inseridas na lista inicial de 195.

O "navio-almirante" desta lista é, seguramente, a petrolífera nacional, a Sonangol, mas a aposta do Executivo, como, de resto, Manuel Nunes Júnior deixou claro, é procurar uma forte revitalização da economia nacional a partir destas privatizações, no seu conjunto, e não apenas num ou noutro activo.

Nos últimos três anos, processo que foi interrompido pela pandemia da Covid-19, o Governo tem-se multiplicado em iniciativas no exterior para divulgar a oferta no que Angola tem para oferecer, seja em matéria de privatizações, seja no que diz respeito ao investimento nos recursos dados a conhecer pelo Planageo, o plano geológico nacional que, apesar de ainda por acabar, já deixou em evidência um grande potencial mineiro para ser explorado nas próximas décadas.

Recorde-se que o plano do Governo para as privatizações aponta 2022 como o ano em que os "porta-aviões" das empresas estatais, como a Sonangol, a Endiama ou a TAAG, na forma total ou parcial, deverão passar para mãos privadas, embora os pormenores ainda estejam longe de serem conhecidos.

Este esforço de Nunes Júnior para conseguir levar a cabo com sucesso o programa de privatizações coincide com um dos momentos mais complexos da economia nacional, onde o petróleo, que ainda é o seu principal "combustível", tem dado sinais de forte desvitalização devido à quebra na produção e ao efeito poderoso da transição energética para as energias limpas que está em curso em todo o mundo e do qual as grandes multinacionais do sector não querem nem podem escapar.

E essa quebra no poder do petróleo enquanto motor da economia nacional tem, aliado ao factor pandemia da Covid-19, tem efeitos bem claros, como hoje ficou, de novo, claro depois de o INE ter revelado uma quebra negativa de 5,2% em 2020, o pior resultado nos últimos 5 anos.

Pano de fundo

Sem o petróleo a "dar gás" à economia nacional, as privatizações estão a ser encaradas pelo Executivo como um balão de oxigénio para os próximos anos, o que se justifica porque o sector dos hidrocarbonetos tendem a manter os ânimos em baixo.

O País produziu em Março, diariamente, 1,163 milhões de barris, mais cerca de 40 mil que no mês anterior, que, no entanto, não afasta o fantasma do declínio da extracção angolana nos últimos anos, tendo mesmo atingido e ultrapassado o cenário pessimista desenhado pela Agência Internacional de Energia (AIE) em 2018, quando previa que Angola estivesse a produzir 1,29 mbpd em... 2023.

Com estes valores, Angola foi ultrapassada pela Líbia, que passa a ser o segundo maior produtor africano, apenas atrás da Nigéria, beneficiando claramente da progressiva estabilidade político-militar, depois de anos a fio de guerra civil, que começou em 2011 com o assassinato de Muammar Khadaffi.

A Nigéria produz actualmente 1,481 milhões de barris diários e a Líbia está nos 1,196 milhões de barris por dia, amos referentes ao mês de Março.

Ainda assim...

A produção nacional média em 2020 foi de 1,22 mbpd, evidenciando o constante declínio devido ao desinvestimento das "majors" a operar no offshore nacional, especialmente a partir de 2014, quando se verificou uma quebra abrupta do valor do barril, que passou de mais de 120 USD para menos de 30 dois anos depois, em 2016.

As exportações de petróleo e gás de Angola caíram 7,26% no ano passado, para 18,2 mil milhões de dólares, resultantes das vendas de 446 milhões de barris de petróleo e gás equivalente.

Estes valores condizem com a exportação de 446 milhões de barris de petróleo e gás, avaliados num preço médio de 41,8 dólares por barril, segundo números fornecidos pelo director do Gabinete de Estudo Planeamento e Estatística do Ministério dos Recursos Naturais e Petróleo, Alexandre Garrett, citado na página oficial do MIREMPET.

Isto compreende ainda a exportação média de 1,22 milhões de barris por dia, consubstanciando uma diminuição de 7,2% em relação a 2019, mostrando uma continuada perda anual da produção nacional.

Apesar das mudanças substanciais na legislação referente ao sector e às alterações profundas nesta indústria decisiva para o País, a produção afasta-se cada vez mais dos patamares que se viram no passado.

Para já, com o barril na casa dos 66 USD, o Executivo de João Lourenço conta com uma folga de cerca de 27 USD em cima dos 39 USD que foi o valor usado como referência para a elaboração do OGE 2021, o que permite encarar com maior optimismo esta saída esperada da crise mundial, apesar dos fortes constrangimentos que a economia nacional enfrenta.

O crude é ainda responsável por mais de 94% das exportações angolanas, mais de 50% do PIB e representa 60% das receitas do Executivo para poder gerir as necessidades da governação, o que, face a uma lenta e demorada diversificação da economia nacional, se traduz numa mais optimista entrada no novo ano e nova década do século XXI.

E no que respeita ao futuro breve, o sector exige reflexão e claramente uma forte aposta na diversificação da economia, porque, como é hoje já consensual, o petróleo não tem muito mais tempo como principal combustível da economia mundial.

O alerta da Carbon Tracker

Alias, um estudo internacional recente, elaborado pela iniciativa Carbon Tracker aponta Angola como um dos países mais vulneráveis ao processo global de descarbonização da economia por razões de protecção climáticas que se traduz mesmo no desinvestimento das petrolíferas no sector para investirem nas denominadas energias limpas.

Este estudo denominado "Beyond Petrostates" nota que Angola enfrenta, até 2040, um défice de receitas na casa dos 76%, o que coloca o País na linha da frente das maiores vítimas deste processo planetário de substituição do petróleo como grande fonte energética mundial, o que exige de Angola um redobrado empenho na diversificação da sua economia.

O estudo diz isso mesmo, que os países nestas condições estão obrigados a definir políticas fortes de substituição de fontes de rendimento sob risco de enfrentarem dificuldades devastadoras para o seu futuro.

Para exemplificar esse abismo que têm pela frente, o estudo revela que as quedas das receitas nos próximos anos vão ser superiores a 13 mil milhões de dólares.

A Carbon Tracker é um think tank financeiro independente que desenvolve análises detalhadas e aprofundadas sobre o impacto da transição energética nos mercados de capitais e no potencial investimento em combustíveis fósseis.