"Não está fora da equação. Temos o quadro operacional estabilizado, que foi preparado com apoio de consultoria especializada, alinhado com as melhores práticas do 'International Capital Market Association', de modo que estamos seguros de que temos um bom quadro operacional para organizar uma emissão de dívida sustentável", afirmou a ministra em Washington, à margem das Reuniões de Primavera 2024 do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial.
Vera Daves indicou ter já uma lista de projetos potencialmente elegíveis como parte do processo para "fazer uma emissão, seja de (divida) 'blue' ou seja 'green'", mas lamentou que o prémio pela emissão deste tipo de divida não seja mais favorável.
"Entendemos que o prémio poderia ser melhor. A taxa de juro podia ser mais baixa. (...) Estamos, mais uma vez, a dialogar com diferentes parceiros para que a todo momento possamos estar prontos para avançar. O trabalho de casa está a acontecer e agora é só uma questão de 'timings'", disse à Lusa.
A dívida verde ou azul são títulos de dívida que cumprem os critérios de melhoria ambiental, social e de governação (ESG, na sigla em inglês), e têm sido cada vez mais frequentes no contexto do combate às alterações climáticas, o que faz com que tenham uma taxa de juro mais baixa que a comercial e abarquem uma nova classe de investidores que procura a para do lucro um financiamento socialmente responsável.
Em relação à troca da dívida a Portugal por investimentos verdes, à semelhança do que está a ser preparado entre Portugal e Cabo Verde e São Tomé e Príncipe, Vera Daves confessou que a análise dessa possibilidade está ainda "num estágio muito embrionário".
"Temos estado a estudar essa possibilidade", mas para Angola seria fundamental assegurar poupanças em função daquela que fosse a troca e que os projectos seleccionados tivessem impacto social e económico, explicou a ministra.
Durante as Reuniões de Primavera do FMI e do Banco Mundial, o diretor da unidade de gestão de dívida de Angola terá precisamente reuniões sobre essa temática, na expectativa de que o país africano comece "a construir capacidade interna, experiência e conhecimento para quando avançar, avançar com segurança", acrescentou Vera Daves.
Sobre a emissão de dívida nos mercados internacionais no seguimento da recente auscultação do mercado, a ministra disse que "a percepção do risco (...) ainda não permite" a Angola faze-lo às taxas que considera aceitáveis, "sempre de um digito (...) e abaixo de 9%, 8%".
Admitiu, porém, alguma "flexibilidade" em relação aos termos financeiros que estão disponíveis em aceitar.
Em relação a montantes, o plano anual de endividamento sinaliza 300 milhões de dólares, mas é "um referencial" que pode ser "remanejado entre as diferentes categorias de endividamento externo", pelo "que ainda está tudo em aberto", admitiu.
A governante anunciou que, durante as Reuniões de Primavera, Angola vai organizar um fórum com investidores internacionais, onde partilhará "os desenvolvimentos recentes e perceberá que questões é que eles têm".
A passagem da ministra por Angola acontece também num momento em que o 'think tank' norte-americano 'Center for Economic and Policy Research' estima que Angola tenha de pagar 160 milhões de dólares (150,5 milhões de euros) em sobretaxas ao FMI pelo perfil dos empréstimos.
Desde 1997, o FMI impôs, além dos pagamentos regulares, taxas adicionais, chamadas 'surcharges' ou sobretaxas, sobre empréstimos a muitos dos seus mutuários mais endividados.
Questionada pela Lusa, a ministra assegurou que Angola "vai, naturalmente, continuar a honrar os seus compromissos, ainda que sejam dolorosos".
"Angola preocupa-se em honrar os seus compromissos e procura ser certinha para poder continuar a contar com a confiança daqueles que são os seus credores", disse.
Contudo, não deixou de advogar uma maior flexibilidade por parte das instituições internacionais, especialmente para países de médios e baixos rendimentos.
Vera Daves disse ainda que Angola continuará a advogar "nos fóruns (...) adequados para debater a reforma das instituições de Bretton Woods", que se encontre um equilíbrio entre a necessidade dessas instituições serem financeiramente sustentáveis e poderem manter toda uma estrutura a funcionar, mas sem tornar "ainda mais difícil a situação de países que já estão sob stress".
A responsável pela pasta das Finanças frisou que há países que sofrem de 'stress' relacionado com dívidas - "em alguns casos asfixiantes" -, mas também face à grande lacuna em termos de infra-estruturas, 'stress' de indicadores sociais que requerem atenção, stress de pobreza ou de gestão de alterações climáticas, incluindo inundações e seca.
"De modo que já é tanto a acontecer e tantos desafios por gerir, que termos o apoio e a flexibilidade de instituições como o FMI, diminuindo tanto quanto possível a cobrança de comissões e taxas para o caso de países que estejam debaixo de stress, sem dúvida que seria bem-vindo", apelou.