Se na segunda-feira da semana passada, 09, o mundo observava com estupefacção os mercados a tombarem 30 por cento, tanto no Brent de Londres como no WTI de Nova Iorque, os dois mais importantes do mundo, para hoje existia uma tímida esperança de que a melhoria dos dados sobre a pandemia na China, onde tudo começou em Dezembro, pudesse inverter a queda.
Mas não foi isso que sucedeu, apesar de ser factual que os números na China sobre a pandemia de Covid-19 são agora muito menos preocupantes que há 15 dias, o problema começou a agudizar-se na Europa, onde é agora a Itália o país que concentra mais preocupações e o Brent de Londres, que é aquele que serve de referência para estabelecer o valor médio das exportações angolanas, estava, cerca das 09:40 a perder 6,38%, para os 33,18 USD.
As razões permanecem as mesmas que levaram à brutal queda da última segunda-feira, 09, com os gigantes do petróleo mundial, sauditas e russos, a manterem as suas posições.
Se o reino árabe já disse que já a partir de 01 de Abril vai inundar o mercado com petróleo barato, aumentando a sua produção para mais de 12 milhões de barris por dia (mbpd), Moscovo mostrou, e mostra, algum desdém pela ameaça que vem do Médio Oriente, informando que tem alicerces para aguentar esta guerra por 10 anos se for preciso.
Tudo começou, recorde-se, na sexta-feira, 06 deste mês, quando, na reunião dos países-membros da OPEP e os não-membros liderados pela Rússia, agregados na OPEP+, em Viena de Áustria, tinham em cima da mesa uma proposta para aumentar em 1,5 mbpd o programa de cortes que vigora desde Janeiro de 2019, que vai em 2,1 mbpd no conjunto de todas as medidas, multilaterais e unilaterais, de forma a esbater as perdas geradas na procura pelo efeito do Covid-19, responsável por uma pesada quebra na actividade económica global e, por arrasto, como sempre sucede, uma diminuição do consumo e da procura de crude.
Tendo chegado a acordo no seio da OPEP, os sauditas, que são quem, de facto, manda no "cartel", aguardavam a posição da Rússia, tendo chegado aquilo que não queriam ouvir, a recusa de Moscovo em alinhar em cortes tão extensos.
Visivelmente melindrados, os súbditos de Saud reagiram com severidade, retirando-se da mesa das negociações e avançando com a ameaça de tornar o crude tão vulgar como a água, inundando o mercado e prometendo vendas 10 USD abaixo do preço de mercado.
Com estrondo, na sessão seguinte, segunda-feira, 09, o barril deu um trambolhão de 30 %, atingindo a marca assustadora de 50% de perdas desde o início de Janeiro, por arrasto da pandemia, e batendo o recorde de perdas num só dia que vinha do longínquo ano de 1990, no arranque da I Guerra do Golfo.
Apesar de manter uma postura antipânico, o Governo angolano tem em cima da mesa, por estes dias, como estão a admitir a maioria dos economistas, a sua maior dor de cabeça desde que João Lourenço chegou ao poder.
Isto, porque os 33 USD que valem o barril hoje significam que as contas do Estado, plasmadas no seu OGE 2020, estão, pelo menos, a observar um défice de 22 dólares por barril, embora esse efeito mais agudo só vá ser palpável dentro de dois meses, que é o período de graça permitido pelo sistema de "futuros" que rege estes mercados.
Tendo em conta que o OGE 2020 foi elaborado com o barril a um valor de referência de 55 USD, se assim se mantiver vai exigir uma revisão do documento-mestre do deve e do haver do Estado em breve, embora não tenha sido estimada qualquer data.
Tudo, porque é no crude que o país tem a sua principal fonte de rendimentos, sendo este responsável por mais de 90% das suas exportações, com uma influência directa na capacidade de investimento do Estado, aprofundando, com os actuais valores, a crise que o país vive intensamente pelo menos desde meados de 2014, quando o barril começou a perder valor e desceu abaixo da fasquia dos 100 USD onde estava desde o início de 2008, existindo ainda a possibilidade de se ver obrigado a reestruturar a sua dívida.
Mas, apesar de algumas casas financeiras estarem a prever um cenário pouco optimista para o fim da guerra de preços entre russos e sauditas, as mais recentes declarações do ministro da Energia russo, Alexander Novak, citado pela Reuters, já veio dizer que tem mantido diversas conversas telefónicas com os parceiros OPEP e OPEP+, não fechando assim as portas a possíveis negociações que permitam romper com o actual status quo.
No entanto, Novak disse ainda que a atitude saudita "pode não ser a melhor opção", sublinhando que esse caminho é Riade a "promover os seus produtos nos mercados globais", acrescentando que Moscovo defende a manutenção dos actuais valores nos programas de cortes de produção, estendendo-os no tempo mas mantendo os volumes, que são, neste momento, e ainda em vigor, até ao fim deste mês, de 1,7 mbpd no seio da OPEP+ ao que acrescenta 400 mil barris por dia da Arábia Saudita de iniciativa própria, à margem dos acordos.
Existindo uma abertura russa, mesmo que ténue, no resto do mundo, devido ao impacto esmagador da pandemia na economia mundial, com quebras brutais nas bolsas de valores, os governos estão a avançar com pacotes de ajuda financeira de milhares de milhões de dólares e euros, bem como medidas tradicionais, como o corte nas taxas de juro, como fez a Reserva Federal dos EUA, que acaba de anunciar um corte de emergência nestas taxas para quase zero.
Porém, os especialistas temem que as denominadas "bazukas" monetárias já não sejam suficientes para resolver os problemas, mesmo que permitam uma ligeira melhoria, sendo o combate rápido e eficaz, através de uma vacina, por exemplo, à pandemia, e ainda a uma nova abordagem ao problema entre russos e sauditas, gerada pelo facto de ambos os países, tal como a maioria dos exportadores do "cartel", terem pela frente severas crises económicas que se agravam em tempo de petróleo barato, havendo mesmo aqueles que admitem uma ruptura grave nas contas públicas de Riade em breve se nada acontecer.