Mas a realidade diz outra coisa. O que os factos nos dizem é que a China está este ano, e basta olhar para o mês de Outubro para o demonstrar, a importar mais crude que em 2022 e só no último mês esse crescimento superou os 13,5 por cento.
Ora, treze vírgula cinco por cento, quando se está a falar da segunda maior economia do mundo e, de longe, muito longe, o maior importador de crude planetário, 11,5 milhões de barris por dia (mbpd), em média, este ano, é muito.
O suficiente para dar outra cara aos mercados, não fora estes serem mais susceptíveis de serem influenciados por outro factor.
Um factor que, ao longo da história, foi muito mais importante que a vida economica e social do gigante asiático: o medo! Revisitar as crises petrolíferas do último quartel do século XX pode ensinar muito a quem se interessa pelo sector.
Medo esse que é resultado de uma soma de aparências explosivas mas que não são, pelo menos ainda, ou pior, foram e já não são, fontes sérias para as preocupações, como a inflação e a recessão que ensombra o ocidente.
Mas o conflito no Médio Oriente, que ameaça espalhar-se como uma tempestade de areia pela região de onde sai diariamente 40% do petróleo consumido no mundo, que ronda os 103 mbpd, pode mudar tudo.
Se ao fim de quase mês e meio de confrontos entre o Hamas e Israel, tivesse que alastrar, já teria alastrado, face à intensidade e proximidade da faísca ao barril de pólvora, mas como notam alguns actores deste sector, ninguém pode prever como vai evoluir uma guerra, porque todas têm o mesmo padrão: sabe-se como começam, ninguém sabe como vão terminar...
O outro problema, e fonte de receios, é a guerra na Ucrânia, que envolve a Rússia, o segundo maior exportador mundial e 3º maior produtor global, país sujeito a pesadas sanções ocidentais mas às quais tem escapado como uma enguia nas mãos de pescador inexperiente, o que permitiu manter os mercados equilibrados ao virar os seus oleodutos para a Ásia, especialmente China e Índia.
Todavia, como têm insistido os governantes europeus, as sanções são um "remédio" de lenta absorção e podem começar a fazer efeito sério a qualquer momento.
Meio problema é ainda a crise económica nos EUA e na União Europeia, fonte geradora de receios mas onde parece estar a crescer a confiança, como mostram os dados do consumo nos Estados Unidos, a maior economia planetária, e onde as elevadas taxas de juro directoras para controlar a inflação estão a deixar de amedrontar as famílias, que estão a voltar a consumir à... americana.
Já na Europa, com a Alemanha, o motor da "união", a "gripar", tudo parece menos claro, mas também ali o Banco Central europeu mostrou uma nova contenção com o manuseio das taxas de juro como ferramenta de controlo da inflação, o que não só atenua o medo como permite levar luz aos cantos mais sombrios deste ainda fundamental bloco económico.
Em síntese, e como alguns analistas, sublinham, os mercados estão a deixar-se levar, mais uma vez, pelo medo e não pela realidade.
E quando derem conta?
O que permite outra abordagem a este fenómeno. E quando derem conta que a realidade é mais luminosa que o escuro dos seus receios?
Bom, então aí, se se olhar para as perspectivas da agência Fitch Ratings, quando o medo esvanecer e a realidade se impuser, o barril de Brent, que é o que interessa para Angola, irá disparar para os 120 USD. Recorde-se que já a JP Morgan e a Goldman Sachs têm aproximações semelhantes a este assunto.
Num relatório divulgado recentemente, a Fitch aponta para a possibilidade mesmo de os altos preços do crude poderem ser um problema para as economias mundiais, curvando em baixa o crescimento global em cerca de 0,4%.
E o que muda tudo neste perspectiva é a guerra entre Israel e o Hamas, porque a agência teme constrangimentos no fornecimento que vão atirar o barril para a casa dos 120 USD em 2024 e 100 em 2025.
Só que a Fitch Ratings não faz esta análise para ser simpática para os países produtores, mesmo que o efeito seja esse, em causa está antes o impacto negativo da alta da matéria-prima no crescimento da economia mundial em 2024, criando dificuldades adicionais à maior parte das economias, destacando as da África do Sul e da Turquia, embora estime que esse efeito se venha a dissipar completamente no ano seguinte.
Mas os produtores de crude vão sentir um efeito positivo, embora a agência destaque apenas a Rússia e o Brasil no lote dos beneficiados, admitindo, porém, que também outros exportadores terão benefícios.
A OPEC não dorme, apenas descansa
A Organização dos Países Exportadores (OPEP) e a OPEP+, que agrega aos 13 membros mais nove encimados pela Rússia, desde 2017, também está sem paciência para o pessimismo, na visão dos seus membros, e garante que não há nada para recear no que diz respeito à manutenção dos preços em valores... adequados.
O sentimento negativo verificado recentemente nos mercados não faz sentido, diz o "cartel", que mantém como perspectiva para este ano um aumento médio na procura de 2,5 mbpd, sublinhando que esse crescendo é resultado das boas marcas vindas da China.
Mais: a OPEP diz mesmo que as importações de crude da China vão atingir este ano um novo recorde em 2023, dando uma machada dura no pessimismo inserido nos mercados.
Em documento divulgado esta semana, a OPEP garante que os dados globais apontam para uma saúde invejável do sector, com uma estimativa nada exagerada de uma procura robusta e crescente, que só está, como aponta o ministro saudita da Energia, a parecer frágil devido à actuação premeditada de especuladores.
A verdade é que nas últimas duas semanas, o barril de Brent tem vindo a cair e já lá vão longe os 95 UD do mês passado, estando agora, como o demonstra o valor desta manhã, terça-feira, 14, perto das 11:50, hora de Luanda, nos 82 USD, com uma subida ligeira de 0,2 % face ao fecho de segunda-feira.
Para Angola, as contas são estas...
Para Angola, que é um dos produtores e exportadores que mais dependem da matéria-prima em todo o mundo, devido à escassa diversificação económica, ter o Brent nos 80 USD não permite diluir os efeitos devastadores da crise cambial e inflacionista, até porque o país enfrenta também o problema da persistente redução da produção diária.
O Presidente da República, João Lourenço, deposita esperança, no curto e médio prazo, de conseguir o objectivo de manter a produção nacional acima de 1,1 mbpd com os campos "Ndola Sul", "Agogo Fuel ou os projectos "Begónia", "Cameia" e "Golfinho", gerando mais receita no sector de forma a, como, por exemplo, está a ser feito há anos em países como a Arábia Saudita ou os EAU, usar o dinheiro do petróleo para libertar a economia nacional da dependência do... petróleo.
O aumento da produção nacional não está a ser travada por falta de potencial, porque as reservas estimadas são de nove mil milhões de barris e já foi superior a 1,8 mbpd há pouco mais de uma década, o problema é claramente o desinvestimento das majors a operar no país.
Aliás, o Governo de João Lourenço tem ainda como motivo de preocupação uma continuada e prevista redução da produção de petróleo, que se estima que seja na ordem dos 20% na próxima década, estando actualmente pouco acima dos 1,1 milhões de barris por dia (mbpd), muito longe do seu máximo histórico de 1,8 mbpd em 2008.
Por detrás desta quebra, entre outros factores, o desinvestimento em toda a extensão do sector, deste a pesquisa à manutenção, quando se sabe que o offshore nacional, com os campos a funcionar, está em declínio há vários anos devido ao seu envelhecimento, ou seja, devido à sua perda de crude para extrair e as multinacionais não estão a demonstrar o interesse das últimas décadas em apostar no país.
A questão da urgente transição energética, devido às alterações climáticas, com os combustíveis fosseis a serem os maus da fita, é outro factor que está a esfumar a importância do sector petrolífero em Angola.