Algumas ONG"s que se dedicam ao salvamento de pessoas em risco durante a travessia do Mar Mediterrâneo, maioritariamente a partir da costa norte de África, admitem que se pode estar perante um dos maiores naufrágios de sempre envolvendo migrantes ilegais.
O Secretário-Geral da ONU, António Guterres fez já saber, através do seu porta-voz, Stéphane Dujarric, que está horrorizado com o que aconteceu, defendendo, mais uma vez, a urgência de consenso entre os países europeus para criarem "formas ordenadas e ágeis para salvar vidas no mar e reduzir as partidas deste tipo de embarcações".
Guterres fez ainda saber o mundo que a sua posição, que é a mesma desde que assumiu o cargo, é que todos aqueles que buscam uma ida melhor, colocando, para esse objectivo, as suas vidas em risco, "merecem e têm direito à dignidade e segurança" que deve ser proporcionada por quem tem poder, e o dever, de o fazer, num claro recado à União Europeia.
Os principais pontos de partida rumo à Europa deste tipo de embarcações, que podem levar de escassas dezenas de pessoas a largas centenas, são as costas da Líbia, normalmente rumo à Grécia ou a Itália, da Turquia, quase sempre para a Grécia, da Mauritânia, sempre para Espanha e, menos comum, de Marrocos, com destino a Espanha e também a Portugal, embora este último país europeu seja destino recente e menos usado pelos migrantes ilegais.
Mas o que está a fazer deste naufrágio um foco mais intenso para os media internacionais é que se pode estar efectivamente face ao mais dramático "enterro" de pessoas no "cemitério" em que se transforou o Mediterrâneo nas últimas duas décadas.
Por exemplo, a par dos confirmados, até perto das 10:00 de hoje, 79 mortos, e 104 resgatados com vida, não foi ainda elaborada uma estimativa oficial para quantas pessoas seguiam a bordo antes do barco de pesca se ter afundado, num ápice, sendo que enquanto a ONU refere que deveriam ser perto de 400, um oficial da marinha grega, citado pelos media internacionais, aponta para 600, mas um elemento de um ONG europeia, citado pelo Guardian, diz que eram cerca de 750 pessoas a bordo.
A dúvida sobre o número preciso de pessoas a bordo pode nunca ser desvendada porque dificilmente haveria um registo que possa vir a ser consultado, porque as organizações mafiosas e criminosas que se dedicam ao negócio do transporte de ilegais, alguns a pagarem mais de 5 mil euros, não só os evitam como os destroem quando estes acidentes ocorrem.
Como se não bastasse, o barco afundou de forma súbita e rapidamente, segundo apontam algumas fontes ligadas às operações e sobreviventes citados pelos media gregos, logo após ter sido lançado um SOS, impedindo que mais pessoas fossem salvas, apesar da rápida chegada de embarcações civis que passavam perto, alertadas pelas autoridades navais gregas.
O que dizem os registos sobre este tipo de naufrágio é que, à medida que o tempo passa, excepto os corpos que ficam presos na embarcação, vão sendo encontradas mais vítimas tanto no mar como, mais tarde, nas costas vizinhas.
Entre os sobreviventes estão pessoas de várias nacionalidades mas a maioria, segundo as agência de notícias, são paquistaneses e afegãos.
Face à dimensão desta tragédia, cujos contornos definitivos estão longe de estar apurados integralmente, o Governo da Grécia decretou três dias de luto nacional
As águas ao largo da Grécia têm sido cenário de muitos naufrágios de embarcações de migrantes, muitas vezes em mau estado e sobrelotadas, mas este foi, até agora, o maior balanço de vítimas humanas desde que, a 03 de junho de 2016, pelo menos 320 pessoas morreram ou desapareceram quando o barco em que seguiam se afundou no mar.
No local estão agora, nesta quinta-feira, 15, dezenas de embarcações que integram uma vasta operação de socorro, incluindo navios da marinha grega.
Recorde-se que a travessia do Mediterrâneo por pessoas que buscam uma vida melhor, deixando para trás países tanto asiáticos como africanos tem vindo a ser mais concorrida a cada ano que passa, e mais mortífera, apesar dos esforços dos países do sul da Europa para travar este êxodo.
Todos os anos, milhares de pessoas morrem a tentar chegar ao "el dorado" europeu seja em pequenas pirogas ou em velhos barcos de pesca que podem carregar até mil pessoas, muitos destes para serem os "escravos dos tempos modernos" nas fábricas e fazendas nos países europeus.
Por detrás desta massiva procura das costas europeias, além da miséria, dos conflitos, da fome... de que fogem quem tenta atravessar o Mar Mediterrâneo, estão muitas organizações criminosas, criadas no norte de África, algumas das quais integradas por europeus incluindo as máfias italiana, grega e maltesa, que cobram fortunas pela travessia.
Os valores em causa vão das escassas centenas de euros a milhares, mais de 5 mil, dependendo de onde saíram originalmente e o destino que se propõem alcançar.
Os estudos económicos e sociológicos que existem sobre este fenómeno alerta para o facto de os africanos que partem em busca do "el dorado" serem, maioritariamente, das classes menos empobrecidas, porque os mais pobres, que poderiam surgir como os candidatos naturais à migração ilegal, não conseguem juntar o dinheiro suficiente para a viagem.
Os países em África que mais contribuem para este êxodo são, entre outros, o Chade, a Etiópia, a Somália, o Níger, o Senegal, o Mali... enquanto da Ásia, a maioria é proveniente do Paquistão, do Afeganistão, Iraque e do Iémen.
Segundo dados da ONU, só em 2023 mais de 70 mil pessoas chegaram às costas europeias por este método - milhares terão morrido, mas é impossível ter dados concretos, embora estejam registados mais de 400 -, sendo que os países mais salientes neste mapa do desejo dos pobres são a Itália, a Grécia e a Espanha, por causa das suas localizações geográficas face à costa do norte de África.
Uma das formas de actuar para alterar esta fuga permanente seria, como já o disseram vários especialistas e relatórios de organizações internacionais o demonstram, é investir na origem de forma a criar esperança no futuro para todos aqueles que se debatem com a miséria, especialmente a gerada pela falta de trabalho.
Vários projectos envolvendo milhares de milhões de euros foram já aprovados pela União Europeia para apoiar o desenvolvimento e a criação de emprego nos países de origem destas migrações em massa, mas, até agora, os resultados são escassos...