A questão voltou, ironicamente, a ser levantada na Casa Branca, no momento em que Donald Trump recebia o secretário-geral da NATO, o holandês Mark Rutte, que ficou impávido e calado quando o Presidente norte-americano insistiu na anexação de parte de um país que também é membro daquela organização militar ocidental.

O silêncio de Mark Rutte é relevante porque, no limite, a reivindicação territorial dos norte-americanos sobre parte do território dinamarquês, mesmo que autónomo, pode evoluir para um conflito de mais sérias proporções entre dois países que integram a organização que gere entre as cimeiras de Chefes de Estado e de Governo.

A Gronelândia, recorde-se, é uma ilha gigantesca, a maior do mundo, situada no Ártico, onde existem reservas gigantes de petróleo, gás e minerais estratégicos, abrangendo a geografia da América do Norte e do extremo norte europeu, que faz parte da Dinamarca, embora com uma autonomia alargada, com um Parlamento de pendor fortemente autonomista ou mesmo independentista.

A justificação de Trump para pretender anexar a ilha (ver links em baixo) é que esta área é estrategicamente importante por ser um corredor de passagem de navios chineses e russos, embora os analistas notem que isso não tem suporte efectivo, visto que os EUA já ali possuem duas bases militares de grandes proporções.

O que parece estar claramente por detrás da pretensão de Donald Trump é que a Gronelândia permitiria, aproveitando um regresso a um tempo de conquistas territoriais, aumentar os direitos de acesso ao Ártico dos EUA de forma substantiva, passando de apenas pequena abertura a partir do Alasca para mais de 40%, o que faria dos EUA um gigante da região, apenas ultrapassado pela Federação Russa.

Só que, ao contrário dos momentos anteriores em que Trump disse que os EUA iriam anexar aquela ilha, na Dinamarca, desta feita, resolveram levar mesmo a sério a ameaça, até porque o Presidente norte-americano disse mesmo que "provavelmente a NATO terá de ser envolvida nesta disputa".

Na Gronelândia surgiu o primeiro clamor contra as declarações de Trump, com o primeiro-ministro daquela região autónoma, Mute Egede, a dizer que a situação está a ganhar contornos insuportáveis e que "Trump está a ir longe demais".

"Chegou o momento de criar uma frente política alargada para se opor à ideia do Presidente dos EUA", avisou, dias antes de deixar o cargo para o novo chefe de Governo regional, Jens Nielsen, que também se opõe firmemente a essa possibilidade.

Curiosamente esta situação está a levar a Gronelândia para uma situação de possível escolha de uma terceira via, porque algumas sondagens feitas na ilha, habitada por apenas 56 mil pessoas, apontam para a independência como a opção mais defendida.

O presidente do comité de Defesa do Parlamento dinamarquês, Rasmus Jarlov, disse mesmo que Trump foi longe demais e não apreciou o silêncio de Rutte, porque esta é uma situação que pode inclusive levar a uma guerra entre dois membros da NATO.

"Não podemos continuar a ser desrespeitados", avisou ainda o primeiro-ministro da Gronelândia.

Já mais tarde, o secretário-geral da NATO veio tentar remendar a falha afirmando não querer "arrastar a NATO para essa questão", embora tenha acrescentado que no que diz respeito ao Ártico e ao Extremo Norte, Donald Trump "tem toda a razão".

"Os chineses estão agora a utilizar estas rotas. Sabemos que os russos estão a rearmar-se (...) Por isso, é muito importante que os sete países do Ártico, tirando a Rússia, trabalhem em conjunto nesta questão, sob a égide dos Estados Unidos, para garantir a segurança desta região", sustentou o responsável máximo da Aliança Atlântica, citado pela Lusa.