O primeiro-ministro britânico está a atravessar um dos piores momentos da sua vida política interna, depois de se ter conhecido o acordo com o Governo de Paul Kagame, do Ruanda, para que este país passe a receber todos os migrantes africanos, e de outras origens, que pedem asilo político a Londres, sendo enviados à força para Kigali, num claro atropelo aos mais básicos princípios humanitários e até à lei internacional.
Boris Jonhson, que já estava na corda bamba por causa das festas que deu, durante o confinamento devido à pandemia da Covid-19, na residência oficial do chefe de Governo, o nº 10 de Downing Street, em Londres, acabando por ser multado agora pela justiça inglesa, e com vários pedidos de demissão do cargo, está agora a viver outro momento periclitante, com cada vez menos espaço de manobra para se manter no poder face a esta decisão de "despachar" africanos ilegais, independentemente do seu país de origem, para o Ruanda.
A mais esta acusação de desrespeito pelos Direitos Humanos, Boris Johnson respondeu, numa procura de explicar a decisão, que a compaixão britânica "é infinita" mas a "capacidade britânica de acolher pessoas" tem limites.
Este é um problema que envolve decisões legalmente duvidosas e claramente atentatórias aos Direitos Humanos mais básicos pelos dois Governos, o de Londres e o de Kigali, mas o líder britânico argumenta que o fluxo imparável de migrantes para o seu país, através do Canal da Mancha, que separa o Reino Unido de França (Europa continental), e que já gerou fricções diplomáticas entre Paris e Londres, não pode continuar porque está esgotada a capacidade de acolhimento.
Isto, quando ficou claro e foi profusamente divulgado nos media europeus, que o Reino Unido tem falta de milhares de migrantes para ocupar milhares de postos de trabalho que ficaram vagos após o Brexit (processo de saída do Reino Unido da União Europeia), levando Londres a abrir excepções para receberem imigrantes europeus, especialmente do leste europeu, como camionistas, trabalhadores fabris, na construção civil ou na restauração, o que tira solidez ao argumento de Johnson de que o país não tem capacidade para acolher mais mão de obra estrangeira.
Mas a oposição trabalhista - Johnson é conservador, de direita -, acusa o primeiro-ministro de estar a criar manobras de distracção para baixar a pressão política para se demitir que está a sofrer e este acordo com Paul Kagame, cujo registo ao nível do respeito pelos Direitos Humanos no Ruanda não é à prova de bala, pelo contrário, encaixa nessa estratégia devido ao problema, no âmbito da política interna, relacionado com as festas da Covid-19.
Outra acusação que é feita a Jonhson é que ele está a usar a questão da guerra na Ucrânia, onde é um dos maiores instigadores do conflito, exercendo forte pressão nesse sentido junto do Presidente Volodymyr Zelensky, além de o Reino Unido ser dos maiores fornecedores de apoio em material militar à Ucrânia, de forma a criar outros focos de atenção mediática para aliviar a pressão que sobre ele os media estão a exercer há largos meses.
Mas, sobre este assunto, o acordo com o Ruanda, pode, em breve, ultrapassar em realce político interno, a questão das festas da Covid em Downing Street, porque se acumulam acusações de dezenas de organizações da sociedade civil e de defesa dos Direitos Humanos, e de ouras tantas figuras públicas ligadas, desde o cinema à literatura, de que se tratou de uma decisão "inumana e cruel" e até "neo-colonial", como o sublinhou, cutado pelas agências de notícias, Steve Valdez-Symonds, responsável pela questão migratória da Amnistia Internacional.
Segundo este plano, refere a Al Jazeera, o Governo britânico identifica os migrantes que buscam asilo no Reino Unido e enviam a informação pessoal para o Ruanda antes de serem transportados para Kigali, onde passa a decorrer o processo de pedido de asilo, que, se for conduzido com sucesso, poderão ficar naquele país africano, se não for assim, são enviados para os seus países, independentemente do que lhes possa suceder.
O que as organizações de defesa do Direitos Humanos se questionam é que garantias tem Londres de que o Governo ruandês vai respeitar os direitos destes indivíduos, sejam eles africanos ou com proveniência em países como o Afeganistão, Iémen ou outros, e que estes não serão simplesmente abandonados à sua sorte no regresso aos seus países ou outros que possam aceitar recebê-los.
Este acordo admite que os que procuram asilo no Reino Unido que, provadamente, sejam originários de países em guerra civil ou que ali se verifique risco de tortura o de morte ou ainda de prisão perpétua por questões de natureza política, não possam ser incluídos neste plano, mas isso só se aplica se os pedidos de asilo dêem entrada com estas pessoas presentes em território britânico.
De acordo com a informação disponível, lendo os media britânicos, Londres deverá pagar ao Ruanda o equivalente a perto de 150 milhões de dólares, à cabeça, por 5 anos, e ainda o equivalente a 20 mil a 30 mil por cada migrante que seja enviado para Kigali.