Francisco declarou, esta quinta-feira, no final de uma viagem de três dias ao Cazaquistão, que a decisão não deixa de ser política, mas acrescentou que pode ser moralmente legítima se o objectivo for a auto-defesa contra uma nação agressora, avança a agência Reuters.
"A auto-defesa não é apenas lícita, mas também uma expressão de amor pela pátria. Alguém que não se defende a si próprio, que não defende algo, não o ama. Quem defende (algo) ama-o", declarou.
Mas o sumo pontífice lembrou igualmente que o envio de armamento é "imoral se a intenção é provocar mais guerra", vender armas ou enviá-las para um país que não precisa.
"Pode ser imoral se a intenção for provocar mais guerra, ou vender armas ou despejar armas de que (um país) já não precisa. A motivação é o que em grande parte qualifica a moralidade dessa acção", disse.
O Papa defendeu que a Ucrânia não deve excluir o diálogo com a Rússia, mesmo que prefira não o fazer.
"Por vezes, eles não aceitam o diálogo. Que pena. Mas o diálogo deve ser sempre levado a cabo, ou pelo menos oferecido. E isto faz bem àqueles que o oferecem", afirmou, citado pela Reuters.
Descartar o diálogo com o país agressor seria fechar "a única porta razoável para a paz", defendeu.
"Sempre um passo à frente, mão estendida, sempre. Estamos numa guerra mundial", declarou o Papa, lembrando ainda os numerosos conflitos em curso, como na Síria, Moçambique, Eritreia ou Etiópia.
Questionado sobre suas próximas viagens, o Papa, de 85 anos, disse que o seu joelho "ainda não está curado", mas adiantou que está a ser ponderada uma visita ao Bahrein em Novembro.
O Papa Francisco também apontou Fevereiro de 2023 como uma possível data para uma visita à República Democrática do Congo e ao Sudão do Sul, agendada para Julho, mas adiada devido aos seus problemas no joelho.
Contexto da guerra na Ucrânia
A 24 de Fevereiro as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação militar especial", sublinhando que o objectivo não é a ocupação do país vizinho mas sim a sua desmilitarização e desnazificação e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional.
O Kremlin critica há vários anos fortemente o avanço da NATO para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS, em 1991.
Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de Kiev da soberania russa da Península da Crimeia, invadida e integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro.
Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1991, com o colapso da União Soviética.
Kiev insiste que a Ucrânia é una e indivisível e que não haverá cedências territoriais como forma de acordar a paz com Moscovo, sendo, para o Presidente Volodymyr Zelensky, essencial o continuado apoio militar da NATO para expulsar as forças invasoras.
A organização militar da Aliança Atlântica está a ser, entretanto, acusada por Moscovo de estar a desenrolar uma guerra com a Rússia por procuração passada ao Exército ucraniano, o que eleva, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, o risco de se avançar para a III Guerra Mundial, com um confronto directo entre a Federação Russa e a NATO, que tanto o Presidente dos EUA, Joe Biden, como o Presidente Vladimir Putin, da Rússia, já admitiram que se isso acontecer é inevitável o recurso ao devastador arsenal nuclear dos dois lados desta barricada que levaria ao colapso da humanidade tal como a conhecemos.
Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país, mas que agora está concentrada no leste e sudeste da Ucrânia.
Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%, embora já tenha, entretanto, recuperado.
Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, a mais simbólica, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios, a banca e grande parte das suas exportações, ficando apenas de fora o sector energético, do gás natural e em pate do petróleo...
Milhares de mortos e feridos e mais de 5,5 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.
O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.