"Os nossos colegas dos Estados Unidos e do Reino Unido, com o apoio dos alemães, polacos e dos Países Bálticos, querem muito levar este conflito para uma guerra a sério, uma verdadeira guerra de larga escala, colocando a Rússia em confronto directo com países europeus", atirou Lavrov, deixando no ar a ideia de que Washington e Londres querem ver uma guerra na Europa mantendo-se fora do campo de batalha, apresentando-se apenas como fornecedores de equipamento militar e apoio político, embora isso possa parecer inezequível porque os estatutos da NATO, o famoso Artº 5, obrigariam à sua intervenção em caso de guerra com membros desta Aliança militar.
Em entrevista à Russia Today, a televisão estatal russa em inglês, e o site Sputnik, igualmente estatal, Sergei Lavrov acrescentou que os governos ocidentais estão, "literalmente, a afastar a Ucrânia de qualquer passo em direcção a uma solução negociada" que permita almejar um acordo de paz.
"Não estão (os países ocidentais) apenas a inundar a Ucrânia de armamento sofisticado, estão a obrigar os ucranianos a usá-lo de forma mais agressiva e abrasiva", disse ainda o velho leão da diplomacia internacional, conhecido por ser um homem moderado e que reflecte em tudo o que diz.
Ainda nesta entrevista aos media estatais russos, RT e Sputnik, que a União Europeia, por iniciativa da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, um dos mais fervorosos falcões de guerra europeus, proibiu na Europa ocidental, recuperando dos idos anos do fascismo na Europa uma censura claramente antidemocrática, Lavrov acusou EUA e Reino Unido de estarem a "beneficiar deste conflito" porque as economias da União Europeia (O Reino Unido deixou a UE em 2020) estão a ser quem mais sofre com as sanções aplicadas à Rússia".
"Os Estados Unidos da América estão a agir de forma irresponsável ao alimentar uma crescente tensão entre os países da Europa ocidental e a Rússia" estando a joar jogos "muito perigosos sem se darem conta", admitindo, todavia, que alguns europeus começam a dar-se conta da total vastidão das consequências possíveis deste tipo de atitudes.
Estas palavras de Lavrov, que são um elevar do patamar da disputa retórica entre os dois lados, confrontam-se com as acusações ocidentais, e da NATO, de que a invasão russa da Ucrânia é uma atitude "ilegal e injustificada" de acordo com a lei internacional.
Os países ocidentais acusam ainda Moscovo de cometer, através das suas forças militares no campo de batalha, centenas de crimes de guerra, exigindo, por isso, desde os lideres dos EUA aos países europeus, que a Rússia seja castigada no campo de batalha, com um apoio que não se via a um país em guerra desde a II Guerra Mundial, em material militar e financeiro.
Ursula von der Leyen e o Secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, já defenderam publicamente que esta guerra pode ter apenas um desfecho, que é uma derrota clara e inequívoca da Rússia no campo de batalha de forma a fragilizar Moscovo a ponto de deixar de ser uma ameaça para o Ocidente durante muitos anos no futuro.
A União Europeia e os EUA, a par da NATO, exigem a retirada total das forças russas da Ucrânia, e acusam Moscovo de estar a tentar reconquistar o antigo império soviético, procurando com esta invasão do país vizinho alargar as fronteiras desse antigo império, a URSS, que colapsou em 1991 em prejuizo de um Estado democrático que optou por uma aproximação estratégica ao Ocidente e aos seus valores, versão que o Kremlin nega de forma igualmente contundente.
Novos objectivos
Lavrov disse ainda que os objectivos de Moscovo nesta guerra vão além das repúblicas do Donbass, apontando, além de outros não especificados, as zonas de Kherson e de Zaporizhia, que, efectivamente, em parte já estão sob domínio das forças russas.
O governante russo explicou esta mudança de abrangência das intenções de Moscovo no mapa ucraniano com, em parte, o fornecimento, "por raiva gerada na impotência", de armas de maior alcance, como os HIMARS ou os Howitzers M777, ao lado ucraniano, o que obriga a mudanças estratégicas na condução dos combates.
Lavrov disse ser impossível às chefias militares russas deixar sob controlo ucraniano territórios com armas que podem alcançar directamente os territórios russos ou das repúblicas de Donetsk e Lugansk.
Contexto da guerra na Ucrânia
A 24 de Fevereiro as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação militar especial", sublinhando que o objectivo não é a ocupação do país vizinho mas sim a sua desmilitarização e desnazificação e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional.
O Kremlin critica há vários anos fortemente o avanço da NATO para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS, em 1991.
Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de Kiev da soberania russa da Península da Crimeia, invadida e integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro.
Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1991, com o colapso da União Soviética.
Kiev insiste que a Ucrânia é una e indivisível e que não haverá cedências territoriais como forma de acordar a paz com Moscovo, sendo, para o Presidente Volodymyr Zelensky, essencial o continuado apoio militar da NATO para expulsar as forças invasoras.
A organização militar da Aliança Atlântica está a ser, entretanto, acusada por Moscovo de estar a desenrolar uma guerra com a Rússia por procuração passada ao Exército ucraniano, o que eleva, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, o risco de se avançar para a III Guerra Mundial, com um confronto directo entre a Federação Russa e a NATO, que tanto o Presidente dos EUA, Joe Biden, como o Presidente Vladimir Putin, da Rússia, já admitiram que se isso acontecer é inevitável o recurso ao devastador arsenal nuclear dos dois lados desta barricada que levaria ao colapso da humanidade tal como a conhecemos.
Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país, mas que agora está concentrada no leste e sudeste da Ucrânia.
Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%, embora já tenha, entretanto, recuperado.
Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, a mais simbólica, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios, a banca e grande parte das suas exportações, ficando apenas de fora o sector energético, do gás natural e em pate do petróleo...
Milhares de mortos e feridos e mais de 5,5 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.
O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.