Os estudos de opinião apontam claramente para um perda da maioria que os Democratas de Joe Biden possuem nas duas câmaras do Congresso dos EUA, seja no Senado, seja nos Representantes, e se assim suceder, o Presidente norte-americano já sabe com o que conta, um bloqueio até ao limite do legalmente possível à continuação do esforço gigantesco que Washington está a fazer, em equipamento militar ou em ajuda financeira directa, ao regime de Volodymyr Zelensky, em Kiev, para manter acesa a guerra contra os invasores russos.
Segundo noticiou o Politico, um dos mais influentes media com foco na política norte-americana, e a Axios, outro não menos proeminente media de matriz política, uma viragem no Congresso trará seguramente um novo alinhamento dos EUA face ao conflito na Ucrânia, forçando uma redução do apoio de Washington a Kiev e um aumento que pode ser "rude" sobre a União Europeia para aumentar o apoio aos ucranianos, que pode criar forte turbulência entre os já escassamente unidos europeus ocidentais.
Sendo, de longe, a fonte do maior apoio, financeiro e militar, a Kiev, os EUA podem estar a viver os últimos dias de livre fluxo de armamento e dinheiro para alimentar a máquina de guerra de Zelensky e garantir a continuidade do Estado ucraniano, que, ao fim de oito meses de invasão russa e mais de oito anos de guerra contra as forças independentistas pró-russas no Donbass, Donetsk e Lugansk, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), enfrenta este ano um crescimento negativo do seu PIB que chega a uns inacreditáveis 35% e em 2023 tendencialmente poderá ser ainda pior.
Isto, porque os Democratas estão claramente contra este apoio incondicional de Washington a Kiev, que Joe Biden já anunciou estar contabilizado em mais de 50 mil milhões USD mas que alguns analistas norte-americanos apontam para um valor superior a 66 mil milhões USD, porque, justificam os homens de Trump, os EUA vivem um dos mais difíceis períodos de crise económica de que há memória, com uma inflação recorde de mais de quatro décadas, superior a 10 por cento, e uma recessão ao virar da esquina, com uma população crescentemente descontente e, segundo vários estudos de opinião, nada interessada no que se passa no leste europeu, estando sim focados nas suas cada vez mais abrasivas condições de vida...
Citado pelos media norte-americanos, o líder dos Republicanos na Câmara dos Representantes, Kevin McCarthy, disse ser seu convencimento de que "as pessoas vão estar a lidar com uma recessão e não vão querer assinar um cheque em branco para a Ucrânia", acrescentando: "Isso jamais acontecerá".
Ou seja, os Republicanos, que já levaram o regime de Kiev a reagir com fúria, através dos conselheiros de Zelensky, não estão a dizer abertamente para que Kiev seja abandonada, estão, isso sim, a exigir que Washington trespasse as despesas da guerra no leste europeu para os países da Europa ocidental, havendo mesmo quem aponte mais responsabilidades a alemães, franceses e italianos, e à União Europeia, de forma genérica.
O que os analistas admitem igualmente é que o fim da "generosidade" norte-americana vai afectar claramente o ténue equilíbrio europeu no apoio a Kiev, porque se esse apoio tiver de ser traduzido por um acrescento muito substancial de gastos, sejam financeiros sejam em apoio militar, por exemplo, através da compra de armas aos EUA para entregar aos ucranianos, as coisas deverão aquecer entre europeus e isso, no mínimo, levará a novas concertações e negociações que poderá deixar o esforço de guerra ucraniano... pendurado.
E, mesmo que tal não venha a suceder, que os EUA mantenham a maioria no Congresso, as consequências da guerra nas economias europeias está a ser de tal modo devastadoras que muitos analistas apontam para uma redução do empenho belicista europeu, com o Inverno a ser a linha separadora entre dois momentos, o de uma Europa ocidental claramente pró-ucraniana, motorizada pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, claramente alinhada aos americanos, e uma europa mais renitente em manter esse empenho, procrastinando em várias frentes e formas na prática desse apoio.
Desviar o "fogo" para o Médio Oriente
Como se esta informação estivesse toda a ser tida em conta na definição de estratégias, o regime de Kiev tem insistido nos últimos dias na acusação ao Irão de estar a enviar drones mortíferos para apoiar a Rússia, o que representa uma nova faceta desta guerra, porque, ao mesmo tempo, Zelensky tem acusado Israel de nada fazer para apoiar a Ucrânia face ao empenho do seu arqui-inimigo Irão ao lado da Federação Russa.
Este nosso patamar, que os EUA estão a alimentar também, através da divulgação de resultados da "intelligentsia" sobre a entrada em cena do Irão neste conflito, apesar de Moscovo e Teerão já terem vindo, repetidamente, garantir que não há armamento iraniano ao serviço do esforço de guerra russo, pode ter como objectivo, segundo alguns analistas, dois objectivos, que passam por dar um novo élan a este conflito.
Um desses objectivos é levar Tel Aviv a ceder a sua poderosa "Iron Dome", o sistema de defesa anti-aéreo que protege Israel dos roquetes lançados pelos radicais palestinianos, fazendo os israelitas entrar numa guerra da qual querem toda a distância possível devido à complexidade do xadrez regional no Médio Oriente, e também porque o risco é sério de o seu sistema cair nas mãos do "inimigo" que assim poderia estudar eventuais fragilidades explorando-as a segir nos ataques a Israel.
O segundo motivo e objectivo seria levar os Republicanos a repensar a sua posição, caso conquistem as maiorais no Congresso, Senado e nos Representantes, através da entrada do Irão no conflito ucraniano ao lado dos russos, sabendo-se que os partidários de Donald Trump têm Teerão como inimigo de estimação, como se viu quando em 2017 anunciou, era então Presidente dos EUA, a denúncia do acordo nuclear com o Irão, assinado em 2015 pelo seu antecessor, Barack Obama.
Todas as jogadas de xadrez, umas, de póquer, outras, vão ter resultados no terreno, só ainda não se pode saber quais, porque ainda faltam pouco mais de duas semanas para as eleições intercalares de 08 de Novembro, nos Estados Unidos da América.
Mas uma coisa é certa: com as declarações do porta-voz do Conselho Nacional de Segurança dos EUA, John Kirby, onde este diz claramente que o Irão vendeu drones "kamikazes" aos russos e enviou técnicos para os apoiar no seu manuseio, "envolvendo-se directamente no terreno", este conflito ganha mais um patamar, que se fosse um jogo de guerra online, estaria marcado pela mudança de cor, para um vermelho carregado, visto que tem potencial de alastramento da crise para outras latitudes, desde logo o flamejante Médio Oriente.
No rasto desta evolução no conflito, surge no horizonte como razão para preocupação, como sublinhou hoje o especialista militar, coronel Mendes Dias, na CNN Portugal, uma ordem emanada de Teerão para que os cidadãos iranianos deixem o mais rápido possível a Ucrânia, tal como já o tinha feito a China...
Porque, segundo este especialista, esta informação deve ser vista como uma possibilidade séria de algo de maior envergadura estar prestes a suceder, mesmo não se sabendo exactamente o quê.
Entretanto, nas diversas linhas da frente, prosseguem os combates, especialmente em Kherson, a sul, onde os ucranianos estão claramente na ofensiva para recuperar território e as forças russas, apesar de esta ser uma das províncias anexadas, estão fortemente pressionadas.
Contexto da guerra na Ucrânia
A 24 de Fevereiro as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação militar especial", sublinhando que o objectivo não é a ocupação do país vizinho, condição que evoluiu depois para a anexação de territórios no Donbass mas também as regiões de Kherson e Zaporijia, mas sim a sua desmilitarização e desnazificação e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional.
O Kremlin critica há vários anos fortemente o avanço da NATO para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS, em 1991.
Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de Kiev da soberania russa da Península da Crimeia, invadida e integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro, tendo acrescido a esta reivindicação as províncias de Kherson e Zaporijia, depois da realização de referendos que a comunidade internacional, quase em uníssono, não reconhece.
Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1991, com o colapso da União Soviética.
Kiev insiste que a Ucrânia é una e indivisível e que não haverá cedências territoriais como forma de acordar a paz com Moscovo, sendo, para o Presidente Volodymyr Zelensky, essencial o continuado apoio militar da NATO para expulsar as forças invasoras.
A organização militar da Aliança Atlântica está a ser, entretanto, acusada por Moscovo de estar a desenrolar uma guerra com a Rússia por procuração passada ao Exército ucraniano, o que eleva, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, o risco de se avançar para a III Guerra Mundial, com um confronto directo entre a Federação Russa e a NATO, que tanto o Presidente dos EUA, Joe Biden, como o Presidente Vladimir Putin, da Rússia, já admitiram que se isso acontecer é inevitável o recurso ao devastador arsenal nuclear dos dois lados desta barricada que levaria ao colapso da humanidade tal como a conhecemos.
Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país, mas que agora está concentrada no leste e sudeste da Ucrânia.
Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%, embora já tenha, entretanto, recuperado.
Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, a mais simbólica, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios, a banca e grande parte das suas exportações, ficando apenas de fora o sector energético, do gás natural e em pate do petróleo...
Milhares de mortos e feridos e mais de 5,5 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.
O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.