As teses sobre o destino de Prigozhin dividiam-se, depois de ter ameaçado tomar Moscovo e demitir Putin através de um golpe sustentado por uma coluna militar fortemente armada com mais de 5 mil mercenários da sua empresa privada Grupo Wagner, se iria "cair de uma janela" ou voltar fortalecido ao campo de batalha.
Pelo meio algumas das mais arrojadas possibilidades foram caindo por insustentabilidade, como aquela que admita estar Prigozhin conluiado com o Kremlin para fazer sair da "toca" os inimigos do Presidente Putin.
Mas o anúncio do Presidente da Bielorrússia, Alexander Lukashenko, de que o antigo cozinheiro e vendedor de "cachorros quentes" metamorfoseado em "senhor da guerra" um pouco por todo o mundo, estaria no seu país, exilado após negociações para acabar com a condenada intentona e antes de um banho de sangue, fez com que muitos admitissem que algo tinha mesmo mudado no Kremlin e o temerário mercenário fora poupado, apesar de tudo.
Porém, hoje as coisas voltaram a ficar nebulosas sobre o destino de Prigozhin, que, ao longo destes dias, apesar de "exilado", não se calou e foi distribuindo vídeos com declarações arrojadas, pelo menos, para quem tem, segundo várias opiniões, a vida por um fio depois da sua coluna ter sido travada a apenas 200 kms da capital russa, há menos de duas semanas.
Primeiro foi o Presidente bielorrusso a dizer que, afinal, Yevgeny Prigozhin, apesar ter dito antes qe se exilaria em Minsk, podia agora estar em Moscovo, tendo já estado em São Petersburgo, onde falou com ele por telefone na quarta-feira, a sua cidade natal, que partilha essa condição com Putin, daí a sua longa e efusiva amizade de décadas, o que estimulou a produção de novas teses arrojadas, como a que apontava para uma passagem para o lado do inimigo, ou seja, os ucranianos.
Mas eis que as coisas ficam claras com a divulgação em vários media russos de notícias relacionadas com as buscas que as forças especiais russas fizeram às suas luxuosas casas, denominadas como "palácios", em São Petersburgo, onde foram encontradas, comprovadas com fotografias, fortunas em dólares norte-americanos, pilhas de notas, muitas armas e munições, embora de pequeno calibre, e ainda as partes luxuosas, como heliporto, helicóptero, barras de ouro, clínica e sauna interna, piscina, etc.
A mais curiosa fotografia é, porém, uma onde Prigozhin aparece (ver foto) com várias perucas, barbas postiças e óculos falsos, com que, aparentemente, procurou testar um disfarce que lhe permitisse deslocar-se sem ser reconhecido.
E o que o histórico da Rússia nos diz é que os oligarcas que caíram em desgraça nos corredores do Kremlin, antes de caírem de janelas ou terem ataques cardíacos fulminantes, viam as suas vidas desmontadas em público, sublinhadas as suas imensas fortunas e as fracas origens das mesmas.
Por exemplo, no site da Russia Today, o canal e site em múltiplas línguas com que a Rússia comunica com o exterior, divulga uma peça noticiosa a partir das imagens do Canal 1 da TV pública russa, que mostra fotos feitas no "raide" feito às casas de Prigozhin a 24 de Junho, com claro destaque para os excessos acumulados nestas.
Com esta caída em desgraça, aparentemente, de forma definitiva, de Prigozhin, fica por saber o que será feito dos seus antigos homens do Grupo Wagner, perto de 25 mil, que foram para a Bielorrússia, onde estão colocados em campos militares transitórios. Por precaução, a Ucrânia reforçou as suas unidades na fronteira norte, com a Bielorrússia.
A cartada de Lukashenko
Entretanto, Alexander Lukashenko defendeu publicamente que é chegado o tempo de Moscovo negociar a paz com Kiev sem "pré-condições", o que, sabendo-se das relações estreitas com Putin, de quem é o principal aliado, um anúncio deste calibre dificilmente poderá ser lido de outra forma que não seja, existirem condições em que o Kremlin poderá negociar sem exigências até aqui tidas como inamovíveis, desde logo a questão da posse da Crimeia.
"Hoje, temos de voltar a pensar. Há um pacote de negociações sobre a mesa. Um pacote de temas que podem ser objecto de um acordo. Amanhã vai ser impossível", disse o chefe de Estado bielorrusso numa conferência de imprensa com jornalistas estrangeiros e da Bielorrússia, citado pela Lusa.
"Hoje temos de falar com a Ucrânia e alcançar algum tipo de acordo de paz", disse, sem especificar datas e propostas concretas.
Lukashenko, que organizou três rondas negociais em território bielorrusso em finais de fevereiro e março de 2022 disse que o chefe de Estado ucraniano, Volodymyr Zelensky, "finalmente, já se apercebeu que não vai ganhar" a guerra e que a "contra ofensiva não vai conseguir outro resultado" a não ser a morte de "milhares e milhares de pessoas".
O chefe de Estado aliado da Rússia considerou que os combates vão intensificar-se na Ucrânia porque o país ainda tem reservas estratégicas consideráveis, além de querer "demonstrar qualquer coisa" no dia 11 de julho, a data do início da Cimeira da NATO em Vilnius.
"Temos de parar. Já fizemos muitas coisas más. Mas podia ser pior. Por isso, temos de parar agora e sentar-nos à mesa das negociações. Sem condições prévias. Temos de decidir tudo à mesa das negociações", frisou.
Kiev não encara a Bielorrússia como país mediador porque Lukashenko é um estreito aliado do Presidente russo, Vladimir Putin, tendo oferecido o território no início da última invasão para que as tropas russas pudessem penetrar no norte da Ucrânia.
Lukashenko disse hoje que a futura presença dos mercenários do Grupo Wagner na Bielorrússia não vai ser aproveitada para projetar um novo ataque contra a Ucrânia.
"Nunca atacamos ninguém. Já o afirmei mais do que uma vez e não vamos atacar. Ninguém vai atacar ninguém a partir do nosso território. O Grupo Wagner, tal como o Exército da Bielorrússia vão proteger os nossos interesses", disse Lukashenko.
Na mesma conferência de imprensa, Lukashenko referiu-se directamente ao Grupo Wagner, empresa de mercenários que esteve envolvida na campanha de Moscovo na Ucrânia, além de manter combatentes contratados em vários pontos do mundo, como na Síria e na República Centro-Africana.
Segundo Lukashenko, o Presidente russo, Vladimir Putin, não vai "esmagar" o líder da empresa, o oligarca Yevgueny Prigozhyn, apesar de ter sido considerado "traidor" no passado dia 24 de junho na sequência da rebelião contra o Kremlin mediada pela Bielorrússia.
"É preciso perceber que Putin conhece Prigozhin muito melhor que eu. Eu só o vi em alguns eventos enquanto que o Putin o conhece desde os tempos em que ambos viviam e trabalhavam juntos em São Petersburgo", disse o Lukashenko acrescentando que "tinham uma relação muito boa".
Lukashenko disse que o líder do Grupo Wagner está neste momento em São Petersburgo, na Rússia, e que na quarta-feira à tarde contactou com Prigozhin pelo telefone.
"Ontem à tarde (quarta-feira) falamos ao telefone e debatemos alguns assuntos relacionais com as próximas acções da Wagner", revelou sem concretizar.
Segundo Lukashenko, o oligarca que organizou um motim armado na Rússia no dia 24 de junho "vai continuar a trabalhar para o bem da Rússia".
"O que vai acontecer com ele (Progozhin) depois? Na vida pode acontecer qualquer coisa. Mas se pensam que Putin é tão malvado e vingativo que o vai "esmagar"...Não, isso não vai acontecer", anteviu.