O que o líder ucraniano queria dos europeus, mais armas, aviões de guerra e foguetes de mais longo alcance, podem não chegar a tempo ou mesmo nunca chegar e entrar na União Europeia, apesar das promessas, dos risos e das emoções ao rubro entre os líderes europeus, é uma quimera que a burocracia europeia vai esmagar.
Para piorar o cenário, nos céus da Ucrânia voaram dezenas de misseis russos que voltaram a "apagar" o país e no Donbass, começa a ser mais nítido que a esperada ofensiva russa de Inverno já está em marcha, apanhando o líder do regime de Kiev fora do país, porque, antes de regressar a Kiev, Zelensky ainda foi à Polónia falar com o seu homólogo, Andrzej Duda, o mais aguerrido líder europeu na frente de batalha pela entrada da NATO no conflito ao lado dos ucranianos, mesmo sabendo-se que isso significaria uma guerra aberta com a Rússia, a antecâmara para o Armagedão nuclear.
Entretanto, o famoso líder checheno, Ramzan Kadirov, que "brilhou" no início da guerra com as suas forças, unidades de combate compostas por veteranos da guerra da Chechénia, com as suas características barbas compridas e armados até aos dentes, que, entretanto, saíram de cena, veio agora garantir que a guerra na Ucrânia termina até ao fim de 2023.
Citado pela TASS, a agência de notícias russa, Kadirov disse ainda que os países ocidentais que estão a prolongar artificialmente o conflito com a entrega de armas aos ucranianos, "vão-se arrepender e admitir que estavam errados", estando condenados a "cair sobre os seus joelhos" e aceitar que estão "condenados a cooperar com a Federação Russa".
A este tipo de fanfarronice, os líderes europeus com quem o Presidente ucraniano esteve neste seu périplo pela Europa ocidental, responderam com a promessa de mais armas para a Ucrânia, com alguns deles, que Zelensky preferiu não dizer quais, a confirmarem a sua disponibilidade para cederem aviões de guerra.
Também lhe foi dito pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyn, a mais comovida de todos os presentes, com a passagem de Volodymyr pelo Parlamento Europeu, que o apoio da União Europeia será "todo o que for preciso e pelo tempo que for preciso", mas há dúvidas sobre o que se passa efectivamente por detrás dos panos.
Com a guerra a prolongar-se já claramente além do que era inicialmente tido como "razoável" pelo ocidente, a crise económica a dar poucos ou nenhuns sinais de poder diluir-se de forma substantiva em breve, a Rússia a mostrar, muito além das melhores expectativas ocidentais, que tem capacidade de lidar melhor com as sanções europeias que a Europa com os efeitos de refluxo dessas mesmas sanções, e com o armamento mais pesado e sofisticado prometido a Kiev a ir ficando enterrado na burocracia ocidental, norte-americana e europeia, Zelensky pode estar a ficar sem tempo e este périplo europeu, pode, afinal, ter tido mais de azedume e cobrança que de agradecimento e comoção.
Quem come a carne, tem de roer os ossos
Isso mesmo defendeu o analista militar major-general Agostinho Costa, do EuroDefense Portugal, afirmando que, face a um cenário de perda relevante na frente de combate, com as forças ucranianas a sofrerem baixas que não conseguem substituir, tanto em militares como em equipamento, Volodymyr Zelensky foi à Europa ocidental "lembrar que a guerra só não acabou em Março de 2022, semanas depois de ter começado, porque os lideres ocidentais não deixarem seguir as negociações entre Kiev e Moscovo".
O analista militar da CNN Portugal e da RTP3, acrescentou que o que Zelensky foi fazer a Londres foi dizer ao Governo britânico que a entrega de armas a Kiev não é negociável, porque o então primeiro-ministro Boris Johnson foi o camartelo ocidental que foi a Kiev destruir o processo negocial entre Moscovo e a Ucrânia, prometendo apoio incondicional e inesgotável do ocidente ao seu esforço de guerra até conseguir uma vitória sobre os russos.
E em Paris, onde esteve com o Presidente Emmanuel Macron e com o chanceler alemão Olaf Scholz , antes de seguirem juntos para Bruxelas, Zelensky disse-lhes, admite o major general Agostinho Costa, que se a guerra não foi travada poucos dias depois de ter começado por intervenção directa das capitais ocidentais e, por isso, agora, apoiar até ao fim e de forma ilimitada o esforço de guerra ucraniano não é uma opção, é uma obrigação.
Isto, quando a Ucrânia começa a ceder na frente de batalha, com perdas substanciais em capacidade ofensiva, humana e material militar, e só a chegada volumosa de carros de combate pesados ocidentais, como os alemães Leopard-2 e norte-americanos M1 Abrams, ou os franceses Leclerc, e os aviões de guerra F-16, além dos misseis de longo alcance, podem permitir inverter este cenário de eventual colapso da capacidade de resistência ucraniana.
E foi isso que Agostinho Costa admite que Volodymyr Zelensky foi dizer aos lideres europeus, que procuraram diluir o azedume do líder ucraniano com a sua recepção efusiva e festiva em Bruxelas, onde foram repetidas promessas já conhecidas mas que, na verdade, quando faltam duas semanas para que se "comemore" um ano desde o início da guerra, a 24 de Fevereiro próximo, não trouxeram a público nada de novo nem de diferenciador.
O que se sabe de facto é que a Rússia está a concentrar um número cada vez maior de militares no leste da Ucrânia, que serão já mais de 350 mil, graças à mobilização forçada de Setembro de 2022, centenas de novos carros de combate, especialmente os seus novos T-90 requalificados, milhares de peças de artilharia pesada e sistemas de misseis anticarro sofisticados, sendo que algumas destas armas estão agora, pela primeira vez, a chegar a uma zona de combate real.
Estes dados estão não só a ser confirmados pelos media ocidentais como também pelos serviços secretos ucranianos, e alguns jornalistas ocidentais que estão nos territórios pró-russos, do Donetsk e Lugansk, confirmam que nas últimas semanas há um crescimento evidente dos meios militares, em equipamento e homens, no terreno.
O sinal do Congresso dos EUA que a Europa temia
Um dos problemas com que se debatem os lideres europeus é que existe hoje a possibilidade, e, talvez, por isso, também o líder checheno Kadirov tenha dito o que disse, de se verem com o "bebé nas mãos" porque em Washington, apesar da Administração Biden, democrata, ser totalmente a favor do apoio militar e financeiro a Kiev, "pelo tempo que for preciso", os republicanos, oposição, com a maioria na Câmara dos Representantes, estão agora a dar sinais de que se ganharem as eleições do ano que vem, tudo mudará na frente leste europeia.
Isso mesmo parece demonstrar a resolução que os republicanos fizeram chegar ao Congresso que prevê um brusco arrefecimento do apoio militar dos EUA à Ucrânia, por causa do insustentável custo para os cofres do Estado, por causa do risco de uma escalada com os russos e porque os impostos dos norte-americanos já suportarem mais de 30 mil milhões USD em equipamento militar enviado para a guerra.
Esta resolução, que já foi baptizada de "a resolução do cansaço dos ucranianos", impõe que Washington ponha fim ao apoio militar e financeiro a Kiev e exige esforços para que seja conseguido um acordo de paz negociado.
Ao apresentar esta resolução, que se for aprovada pode mudar o curso da guerra, o congressista da Florida Matt Gaetz lembrou que o próprio Presidente Joe Biden tinha dito em 2022 que aumentar o apoio militar a Kiev era o mesmo que lançar o mundo na III Guerra Mundial e que isso seria o mesmo que dar início a uma catástrofe nuclear global.
Ora, se os EUA, embora isso não seja claro que venha a suceder, deixarem ou diminuírem substancialmente o apoio à Ucrânia, terão de ser os países da Europa ocidental, especialmente o Reino Unido, a França, a Alemanha e a Polónia, bem como a Comissão Europeia, a suportarem os custos do apoio a Kiev, uma tarefa que seria uma tragédia económica para a Europa ocidental sem o apoio dos Estados Unidos.
Contexto da guerra na Ucrânia
A 24 de Fevereiro de 2022 as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação militar especial", sublinhando que o objectivo não era (é) a ocupação do país vizinho, condição que evoluiu depois para a anexação de territórios no Donbass mas também as regiões de Kherson e Zaporijia, mas sim a sua desmilitarização e desnazificação e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional.
O Kremlin critica há vários anos fortemente o avanço da NATO para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS, em 1991.
Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de Kiev da soberania russa da Península da Crimeia, invadida e integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro, tendo acrescido a esta reivindicação as províncias de Kherson e Zaporijia, depois da realização de referendos que a comunidade internacional, quase em uníssono, não reconhece.
Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1991, com o colapso da União Soviética.
Kiev insiste que a Ucrânia é una e indivisível e que não haverá cedências territoriais como forma de acordar a paz com Moscovo, sendo, para o Presidente Volodymyr Zelensky, essencial o continuado apoio militar da NATO para expulsar as forças invasoras.
A organização militar da Aliança Atlântica está a ser, entretanto, acusada por Moscovo de estar a desenrolar uma guerra com a Rússia por procuração passada ao Exército ucraniano, o que eleva, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, o risco de se avançar para a III Guerra Mundial, com um confronto directo entre a Federação Russa e a NATO, que tanto o Presidente dos EUA, Joe Biden, como o Presidente Vladimir Putin, da Rússia, já admitiram que se isso acontecer é inevitável o recurso ao devastador arsenal nuclear dos dois lados desta barricada que levaria ao colapso da humanidade tal como a conhecemos.
Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país, mas que agora está concentrada no leste e sudeste da Ucrânia.
Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%, embora já tenha, entretanto, recuperado.
Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, a mais simbólica, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios, a banca e grande parte das suas exportações, ficando apenas de fora o sector energético, do gás natural e em pate do petróleo..
Milhares de mortos e feridos e mais de 5,5 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.
O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.