A Polónia, o mais acérrimo aliado de Kiev neste conflito no leste europeu, avisou o regime ucraniano para não glorificar os seus heróis fascistas, depois de o Parlamento ucraniano ter feito, no dia 01 de Janeiro, uma homenagem oficial ao histórico líder dos nacionalistas-nazis ucranianos e aliado de Adolf Hitler e das forças alemãs que na II Guerra Mundial invadiram a então União Soviética, Stepan Bandera (1909-1959), pelo seu 114º aniversário.

Depois de ter sido conhecida a publicação, pelo Parlamento ucraniano, nas redes sociais, de uma celebração do antigo colaborador nazi e referência histórica do nacionalismo ucraniano que em 2014 protagonizou o golpe de Estado que levou ao poder Petro Poroshenko depois de Viktor Yanukovych, o Presidente pró-russo eleito em 2010, ter sido deposto, rapidamente esta foi apagada devido às críticas de Israel, dos EUA e da Polónia.

No entanto, a publicação de glorificação de Bandera, com uma alegada citação sua da década de 1940, onde afirma que a vitória do nacionalismo ucraniano só será possível com a extinção do império russo, foi usada pelos media próximos do Kremlin para sublinhar a "razão" do Presidente Vladimir Putin quando justificou a sua "operação militar especial" para desnazificar a Ucrânia liderada pelos nacionalistas de Zelensky.

A este propósito, o primeiro-ministro polaco, Mateusz Morawiecki, o mais acérrimo aliado de Kiev na sua acção militar de oposição à Rússia, e maior fornecedor de apoio logístico e material militar, logo a seguir aos EUA, e ponta de lança de Kiev no seio da União Europeia, citado pela RT, advertiu Zelensky de que "não podem haver nuances" quando se trata da glorificação de colaboradores nazis como Stepan Bandera.

Numa conferência de imprensa, Mateusz Morawiecki avisou Kiev que que não terá qualquer tipo de contemplação para com todos aqueles que mostrarem qualquer resistência em condenar e reconhecer os "crimes monstruosos" perpetrados pelos nacionalistas ucranianos durante a II GM contra largos milhares de polacos, numa referência aos inúmeros judeus polacos assassinados às mãos das unidades de nacionalistas ucranianos que se aliaram aos nazis de Hitler.

Este é o primeiro momento de divisão no sólido muro constituído pelo eixo Kiev-Varsóvia na oposição à invasão russa, embora isso só tenha sido assim mantido devido à opção pelo regime de Kiev de manter Bandera fora da sua retórica anti-russa depois deste ter sido formalmente erguido como herói nacional em 2010, quando nesse ano, a 01 de Janeiro, se celebrava mais um aniversário do mais conhecido dos nazis-fascistas ucranianos.

Face a este episódio, como se pode perceber através da leitura dos media polacos, embora não seja de antecipar uma ruptura no eixo Kiev-Varsóvia, é de admitir que a Polónia comece a ser menos lesta no apoio à Ucrânia nos corredores das organizações internacionais que integra, como a NATO e a União Europeia.

A voz incómoda ou lançar o barro à parede?

Quando os líderes europeus, como o Presidente francês Emmanuel Macron, ou o chanceler alemão Olaf Scholz, reafirmam a sua decisão de manter uma linha de diálogo sempre aberta com o Kremlin e não abdicam de apelar ao cessar-fogo, embora sem tirar o pé do acelerador no apoio a Kiev, o regime ucraniano, embora contido, não deixa de mostrar o incómodo, tal como o Governo polaco, sempre crítico da postura mansa de Berlin e Paris - (resta saber se assim se manterá depois do episódio Stepan Bandera) -, mas como será agora que um antigo comandante da NATO vem a público dizer que é inevitável um cessar-fogo negociado por ser impossível uma vitória militar no terreno?

O general alemão Hans-Lothar Domröse, antigo comandante do Comando Brunssun, das Forças Conjuntas Aliadas da NATO, com sede na Holanda, e uma das mais importantes estruturas de resposta militar da Aliança Atlântica, veio agora afirmar que um cessar-fogo nos primeiros meses de 2023 é inevitável por ser impossível desatar este nó da guerra no leste europeu através de uma vitória no terreno, o que é muito próximo daquilo que já disse publicamente o chefe do Estado-Maior Conjunto dos Estados Unidos, general Mark Milley, ao apoiar publicamente a via negocial para acabar com o conflito entre a Ucrânia (com apoio ilimitado dos EUA e da NATO) e a Rússia.

No entanto, sendo claro que a este nível de comando, mesmo quando se deixam os cargos, as palavras têm um peso incontornável e não são usadas declarações sem algum nível de concertação prévia, estas chocam claramente com a abordagem oficial do regime ucraniano, cuja retórica é mais coerente com o discurso histórico de Stepan Bandera, no sentido de não abdicar de uma vitória inequívoca sobre as forças russas no campo de batalha, tal como é a abordagem oficial da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que pugna por uma derrota sem tréguas dos russos neste conflito sem admitir a opção negocial.

É por isso que as palavras de Hans-Lothar Domröse, ou mesmo de Mark Milley, são vistas por alguns analistas militares como algum tipo de engodo para conseguir obter informação sobre a sensibilidade de um dos lados, ou dos dois, desta guerra para a via negociada além da retórica abrasiva que os estrategas impõem como abordagem "oficial" ao decorrer da guerra.

No caso do general Hans-Lothar Domröse, a confirmação sobre a sua intenção, apressar a ida para a mesa das negociações ou apenas para apalpar terreno, ficará claro nos primeiros meses deste ano, até ao Verão, que é o prazo delineado para que a sua visão para o fim das hostilidades seja visível no terreno.

"Eu espero um cessar das hostilidades até ao Verão", disse Domröse a um jornal alemão, sublinhando que isso resulta do facto de "ambos os lados estarem conscientes de que não há qualquer utilidade na continuação da guerra" para alcançar os objectivos e que vai ser preciso fazer cedências de uma e de outra posição, que são actualmente bem conhecidas: Kiev quer os russos fora de todo o território ucraniano, incluindo a Crimeia, e Moscovo não admite sequer negociar a cedência mínima nas províncias anexadas desde 2014 (Crimeia) e depois, já em 2022, Zaporijia, Kherson, Donetsk e Lugansk.

Esta cada vez mais sonoramente exigida cessação das hostilidades não é apenas nas cúpulas ocidentais, é igualmente cada vez mais ruidosa nas base, ou seja, nas sociedades europeias, onde o efeito de refluxo das sanções atiradas contra a Rússia pela União Europeia produzem tiro no pé atrás de tiro no pé das famílias, desde logo por causa do aumento brutal do custo de vida, no rasto de uma inflação histórica de mais de quatro décadas.

Isso mesmo tem sido visível nas capitais europeias, onde se multiplicam as manifestações, seja em Paris, Berlim, Praga, Madrid... embora ainda dirigidas contra os problemas sociais e não directamente contra - embora nalguns casos já assim seja - o continuado apoio militar e económico à Ucrânia pelos seus governos...

União Europeia reúne com regime ucraniano para analisar situação ou consolidar aliança?

A União Europeia e o governo ucraniano estão reunidos em Kiev num encontro de alto nível para analisar a actual situação do país e do conflito, bem como o estado da cooperação entre Bruxelas e o regime de Zelensky, sendo o apoio europeu, militar e financeiro o mais saliente dos tópicos a abordar, num contexto de preparação da Cimeira EU-Ucrânia, previsto para 03 de Fevereiro, na capital ucraniana.

Segundo Volodymyr Zelensky, em cima da mesa está, entre outros pontos, o envio da primeira tranche do pacote de 18 mil milhões de euros - mais de 20 mil milhões USD - aprovado por Bruxelas para a Ucrânia, já em Janeiro.

Mas, segundo alguns analistas, este encontro terá ainda como ponto incontornável a análise de uma solução para o conflito a prazo considerando a insustentabilidade da sua continuidade devido aos pesados efeitos que este tem já nas sociedades europeias e na diluição acelerada da qualidade de vida na generalidade dos países europeus.

Ucranianos atingem com ruído moral russo

Num ataque sem precedentes até agora, as forças ucranianas atingiram, com recurso aos sistemas norte-americanos HIMARS, os mísseis mais sofisticados entregues ao Exército ucraniano, um aquartelamento militar russo na cidade de Makeyevka, Donetsk, Donbass, onde estavam centenas de recém-mobilizados, tendo este episódio sangrento nas fileiras russas voltado a incendiar as críticas às chefias das forças militares do Kremlin.

Segundo Kiev, neste ataque, realizado de Domingo para segunda-feira, morreram mais de 400 soldados russos, embora Moscovo admita que apenas 63 miliares perderam a vida neste conseguido ataque das forças de Kiev.

Independentemente do número de vítimas, este foi o mais bem conseguido ataque ucraniano a um aquartelamento russo, com maior número der vítimas admitidas até hoje num só ataque, o que levou a um novo tsunami de críticas às chefias russas, que chegaram inclusive às páginas russas de apoio à guerra.

Para já não há, além da admissão do elevado número de baixas, quaisquer acções do Kremlin sobre as chefias militares, mas as críticas mais ferozes passam por considerar uma falha indesculpável que os misseis HIMARS ucranianos tenham passado pela defesa anti-aérea das forças russas, equipadas com os sistemas mais avançados do mundo, de acordo com Moscovo, como os S-400, ou mesmo os S-300.

Segundo o tenente-coronel Igor Konashenkov, porta-voz do Ministério da defesa russo, citado pelo site da Russia Today, "em resultado de um ataque a um campo temporário de militares, com quatro mísseis equipados com ogivas altamente explosivas, morreram 63 soldados".

Este ataque teve lugar às 00.01 do dia 01 de Janeiro de 2023, altura em que os ucranianos diziam que estavam à espera de um ataque em larga escala dos russos às principais cidades ucranianas, o que permite perceber que os analistas militares russos foram, claramente, ludibriados pela táctica ucraniana, criando a ilusão de estar à defesa quando se prepara para atacar, tal e qual como explica Sun Tzu que deve ser feito em "A Arte da Guerra".

Nessa reacção russa, além da admissão das mortes em grande número, embora longe dos 400 mortos apontados por Kiev, foi feita por Moscovo uma forte crítica aos EUA por estarem a fornecer armas sofisticadas, de elevada tecnologia e alcance, além de informação pela sua "intelligentsia" sobre a localização dos alvos, porque os ucranianos não tinham forma de saber deste local sem as imagens fornecidas pelos satélites norte-americanos.

Para os analistas ocidentais e também russos, este episódio pode levar Vladimir Putin a exigir aos seus comandantes militares uma resposta superior à que exigiu - e que levou a sucessivas barragens de misseis sobre a Ucrânia e as suas infra-estruturas - quando em Outubro foi atacada a ponte que liga a Crimeia à Rússia continental, naquele que foi, até então o mais bem conseguido ataque de Kiev a uma infra-estrutura estratégica dos russos.

O que se seguirá é uma incógnita, mas, depois deste ataque ao quartel russo, com 63 mortos, diz Moscovo, mais de 400, garante Kiev, provavelmente a transferência das hostilidades do campo de batalha para a mesa das negociações ficou mais distante...

Onde vai atacar Putin?, é agora a dúvida, não se o vai fazer... porque as críticas à capacidade militar russa começam a ser ensurdecedoras...

Contexto da guerra na Ucrânia

A 24 de Fevereiro de 2022 as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação militar especial", sublinhando que o objectivo não é a ocupação do país vizinho, condição que evoluiu depois para a anexação de territórios no Donbass mas também as regiões de Kherson e Zaporijia, mas sim a sua desmilitarização e desnazificação e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional.

O Kremlin critica há vários anos fortemente o avanço da NATO para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS, em 1991.

Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de Kiev da soberania russa da Península da Crimeia, invadida e integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro, tendo acrescido a esta reivindicação as províncias de Kherson e Zaporijia, depois da realização de referendos que a comunidade internacional, quase em uníssono, não reconhece.

Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1991, com o colapso da União Soviética.

Kiev insiste que a Ucrânia é una e indivisível e que não haverá cedências territoriais como forma de acordar a paz com Moscovo, sendo, para o Presidente Volodymyr Zelensky, essencial o continuado apoio militar da NATO para expulsar as forças invasoras.

A organização militar da Aliança Atlântica está a ser, entretanto, acusada por Moscovo de estar a desenrolar uma guerra com a Rússia por procuração passada ao Exército ucraniano, o que eleva, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, o risco de se avançar para a III Guerra Mundial, com um confronto directo entre a Federação Russa e a NATO, que tanto o Presidente dos EUA, Joe Biden, como o Presidente Vladimir Putin, da Rússia, já admitiram que se isso acontecer é inevitável o recurso ao devastador arsenal nuclear dos dois lados desta barricada que levaria ao colapso da humanidade tal como a conhecemos.

Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país, mas que agora está concentrada no leste e sudeste da Ucrânia.

Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%, embora já tenha, entretanto, recuperado.

Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, a mais simbólica, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios, a banca e grande parte das suas exportações, ficando apenas de fora o sector energético, do gás natural e em pate do petróleo...

Milhares de mortos e feridos e mais de 5,5 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.

O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.