A proibição do debate nacional sobre o pacote legislativo eleitoral, a brutal repressão à vigília ocorrida no Bengo, as detenções arbitrárias por ocasião da manifestação do MEA e ainda em Março o bloqueio à entrada no País de participantes da conferência da Plataforma dos Democratas Africanos, onde se incluía a UNITA - eis uma ténue amostra do cerco sistemático ao exercício das liberdades fundamentais em Angola, ao arrepio da CRA, que nas hostes do partido da situação com os guardiões reais e virtuais do regime a cabeça invocam defender, via de regra.
Para os menos atentos será mister recordar que as violações dos direitos humanos, sobretudo das liberdades de expressão, manifestação, reunião - se transformaram numa prática comum e não numa excepção. O episódio do bloqueio ao debate público almejado pela OAA fez soar sinos de alarme, não apenas por se tratar de uma classe profissional tida como fundamental no dito Estado democrático e de direito - a dos advogados - mas também pelo facto do bloqueio ter sido travestido na praxis e de jure, por vestes legais, sancionadas por um tribunal, mesmo ao arrepio da CRA. A onda de indignação e protestos generalizados que o episódio provocou, tanto ao nível nacional como internacional, dá conta da gravidade do sucedido.
As tentativas seguintes de impedir a realização de vigílias propostas pela UNITA, maior partido na oposição, umas veladas mascaradas na tradicional prosápia legal, outras manu militari como foi a sangrenta repressão no Bengo, juntam-se ao conjunto de episódios que, do nosso ponto de vista, demonstram que o denominado campo fundamentalista no seio do regime, que impedir a todo o custo a conclusão da transição para a democracia real.
No arsenal dos arautos do status quo enquistados no partido da situação e nos círculos castrenses, além da infelizmente recorrente intimidação a todas vozes que não alinham na batuta do pensamento único, sejam das oposições ou da social civil e mesmo no interior do partido governamental, juntam-se mudanças substantivas na arquitectura jurídico-legal dos processos eleitorais, a nova divisão político-administrativa, implosões e cavalos de Tróia entre as oposições, súbita multiplicação de partidos políticos proveta, violações correntes de direitos humanos.
Este triste rosário dos inimigos da democracia não estaria completo sem um factor fundamental nos tempos hodiernos - o da comunica social e dos media. De resto, com o quase monopólio dos media pelo governo, com destaque para as Televisões, de forma explícita ou implícita, o contraditório e o pluralismo desapareceram e a independência editorial esta sob sequestro no âmbito da Captura de Estado.
O encontro entre o Presidente da República, João Lourenço e o líder da UNITA, Adalberto da Costa Júnior, da pretérita terça-feira, 13, após um hiato de três anos em que ergueram não só barreiras físicas à participação de ACJ no dialogo directo com o mais alto mandatário da República, como também se assistiu ao banimento da sua figura e do seu nome no espaço público das TVs controladas pelo governo, trouxe alguns laivos de esperança que não chegam para amainar a maré montante de cepticismo e descrédito das famosas elites governantes, onde a arrogância, a tradição do arbítrio, o autismo fazem morada vitalícia de braço dado com um despesismo perdulário, a fome e o desemprego, a corrupção sistémica, que alimentam o descontentamento e a revolta social.
O diálogo político e o diálogo social deveriam sim ser a norma e não a excepção, num país que se pretende democrático. O partido da situação, MPLA, e seu governo possuem aqui e agora mais uma oportunidade de ouro para comprovar, a breve trecho, que as promessas correspondem aos actos, não obstruindo o exercício de direitos humanos, em particular das liberdades de manifestação, reunião, associação, expressão, opinião e informação plural e contraditória. Nesse sentido o diálogo deveria continuar a todos os níveis, envolvendo todos actores políticos, económicos e sociais.
A democracia só pode construir-se com a livre participação de todos os cidadãos e não no seu enclausuramento num qualquer «partido que está na moda» agora ou no porvir, no fato da alfaiataria ditatorial. Os angolanos estão cansados da ladainha do pensamento único. Acreditamos que a imensa maioria dos Angolanos almeja por um devir democrático e pacífico, capaz de fazer sair o País do buraco miserabilista em que está mergulhado. E todos, todos, todos - são necessários.