Numa altura em que alguns analistas militares independentes admitem que as ferozes batalhas em curso na linha da frente, especialmente nas cidades de Bakhmut e Avdiivka, na região de Donetsk, estão a provocar um dramático desgaste na capacidade humana das forças ucranianas, Volodymyr Zelensky veio a terreiro divulgar um pedido urgente de mais voluntários para as fileiras nacionais.
Este pedido, feito, como costume, com o líder ucraniano, vestido com roupa ao estilo militar, trouxe como novidade uma possível confirmação das informações que apontam para um número de baixas, entre mortos e feridos, de tal modo volumoso que pode estar a impedir o avanço para a já previamente anunciada contra-ofensiva da Primavera pelo lado ucraniano.
Sendo igualmente verdade que também do lado russo as baixas são volumosas, os especialistas militares recordam que a Federação Russa conta com uma avassaladora vantagem no universo de recrutamento, que as estimativas internacionais apontam para até 20 milhões de indivíduos, ao passo que do lado de Kiev, esse universo não vai além de algumas centenas de milhar.
No vídeo onde Zelensky apela aos ucranianos que se envolvam mais nos combates, alistando-se para integrar o Exército, depois de várias notícias e vídeos nas redes socias mostrarem que os cranianos estão a fazer raides em várias localidades para arregimentar reforços à força, é ainda dito que este é o momento de os ucranianos mostrarem o seu empenho na vitória sobre os invasores e que desse empenho depende o futuro da Ucrânia livre e soberana.
Na frente de Donetsk, onde se situam os principais campos de batalha desta guerra, especialmente Bakhmut, considerada estratégica pelos dois lados, alguns organismos internacionais independentes estimam que já terão morrido ou sido feridos, de ambos os A
A maior parte das baixas, embora seja extremamente difícil verificar estes dados, estão, ainda segundo essas indicações, registadas do lado ucraniano devido à dificuldade de fazer chegar apoio à cidade que está "operacionalmente cercada" pelas unidades de combate russas, quase em exclusivo do privado Grupo Wagner.
Alarga-se a geografia nuclear na Europa
Entretanto, nas últimas horas, o mundo foi sobressaltado pelos relatos dos media internacionais, russos e ocidentais, por notícias que indicam que a Bielorrússia, país aliado de Moscovo localizado entre a Rússia, a Letónia, a Lituânia e a Polónia (os três mais aguerridos adversários da Rússia entre os aliados ucranianos), além da Ucrânia, acordou na deslocalização de sistemas de armas nucleares tácticas russas para o seu território.
Este passo, que a NATO já considerou "perigoso e irresponsável", tem, desde logo, como consequência, o alargamento da geografia europeia polvilhada de armas nucleares, aproximando os sistemas russos de nível táctico (armas nucleares de capacidade reduzida, destinadas a uso para contenção de avanço de unidades de infantaria mecanizadas ou apeadas) das fronteiras da NATO.
No entanto, de Moscovo, a resposta a esta reacção ocidental foi a esperada, que a NATO já possui em diversos locais equipamento militar nuclear norte-americano, como se sabe existir, por exemplo, na Turquia e na Polónia, havendo suspeita de haver outros locais, e que este acordo com a Bielorrússia é uma consequência natural dos avanços ocidentais nesse sector, como foi o caso do anúncio por parte do Reino Unido que vai enviar munições revestidas a urânio empobrecido para as forças ucranianas, sabendo-se que estas têm consequências dramáticas nas populações atingidas, como sucedeu no Iraque e na Jugoslávia, onde acontecerem bombardeamentos da NATO com este tipo de armamento.
Recorde-se que, com a adesão iminente da Finlândia à NATO, esta organização militar ocidental, liderada pelos EUA, ganha mais perto de 2.000 quilómetros de fronteira com a Rússia, o que Moscovo já admitiu que vai reagir com a colocação de unidades militares nessa área, sendo uma boa parte da retórica do Kremlin assente na ideia de que os EUA usam os seus subservientes aliados europeus para "cercar" a Rússia com fortes destacamentos ao longo das fronteiras ocidentais do país.
Na troca de acusações entre NATO e Rússia, o secretário do Conselho de Segurança russo, Nikolái Pátrushev, acusou hoje a organização militar ocidental de participar de forma directa no conflito na Ucrânia porque fornece armas e informação estratégica aos ucranianos.
"Os membros da NATO fazem parte do conflito. Eles transformaram a Ucrânia num enorme campo militar. Enviam armas e munições às tropas ucranianas, fornecem informações, inclusive de satélites e drones", disse o secretário do Conselho de Segurança ao jornal Russian Rossiiskaya Gazeta, citado pela Lusa.
Pátrushev adiantou que a NATO está a preparar os militares ucranianos, destacando igualmente que na linha da frente "estão mercenários dos países que lutam ao lado das Forças Armadas" ucranianas.
"Ao tentar prolongar ao máximo este confronto bélico, não escondem o seu objetivo principal, que é derrotar a Rússia no campo de batalha e depois desintegrá-la", acrescentou.
Kiev pede reunião urgente da ONU para travar "chantagem nuclear" russa
Entretanto, ainda segundo a Lusa, a Ucrânia pediu uma reunião urgente do Conselho de Segurança das Nações Unidas e pediu o fim da "chantagem nuclear" da Rússia, depois de o Kremlin ter anunciado a colocação de armas nucleares na Bielorrússia
"A Ucrânia espera ações efetivas para combater a chantagem nuclear do Kremlin por parte do Reino Unido, China, Estados Unidos e França", disse o Ministério dos Negócios Estrangeiros da Ucrânia, num comunicado.
"Exigimos que uma reunião extraordinária do Conselho de Segurança das Nações Unidas seja imediatamente convocada para esse fim", acrescentou a diplomacia ucraniana no comunicado, pedindo ao G7 (o grupo das sete economias mais desenvolvidas) e à União Europeia para pressionarem a Bielorrússia, ameaçando-a com "sérias consequências" se aceitar a imposição russa.
Contexto da guerra na Ucrânia
A 24 de Fevereiro de 2022 as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação militar especial", sublinhando que o objectivo não era (é) a ocupação do país vizinho, condição que evoluiu depois para a anexação de territórios no Donbass mas também as regiões de Kherson e Zaporijia, mas sim a sua desmilitarização e desnazificação e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional.
O Kremlin critica há vários anos fortemente o avanço da NATO para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS, em 1991.
Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de Kiev da soberania russa da Península da Crimeia, invadida e integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro, tendo acrescido a esta reivindicação as províncias de Kherson e Zaporijia, depois da realização de referendos que a comunidade internacional, quase em uníssono, não reconhece.
Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1991, com o colapso da União Soviética.
Kiev insiste que a Ucrânia é una e indivisível e que não haverá cedências territoriais como forma de acordar a paz com Moscovo, sendo, para o Presidente Volodymyr Zelensky, essencial o continuado apoio militar da NATO para expulsar as forças invasoras.
A organização militar da Aliança Atlântica está a ser, entretanto, acusada por Moscovo de estar a desenrolar uma guerra com a Rússia por procuração passada ao Exército ucraniano, o que eleva, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, o risco de se avançar para a III Guerra Mundial, com um confronto directo entre a Federação Russa e a NATO, que tanto o Presidente dos EUA, Joe Biden, como o Presidente Vladimir Putin, da Rússia, já admitiram que se isso acontecer é inevitável o recurso ao devastador arsenal nuclear dos dois lados desta barricada que levaria ao colapso da humanidade tal como a conhecemos.
Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país, mas que agora está concentrada no leste e sudeste da Ucrânia.
Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%, embora já tenha, entretanto, recuperado.
Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, a mais simbólica, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios, a banca e grande parte das suas exportações, incluindo o sector energético, do gás natural e em parte do petróleo...
Milhares de mortos e feridos e mais de 9,5 milhões de refugiados internos e nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.
O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.