O anúncio destes afastamentos, que ainda são apenas suspensões no decurso de uma investigação sobre a actividade destas duas altas figuras do regime ucraniano, foi feito no Domingo, apanhando de surpresa os media internacionais porque se trata de duas das mais relevantes figuras do actual momento que o país atravessa, depois do início da invasão russa, a 24 de Fevereiro.
Nesse momento, a Presidência ucraniana justificou a decisão com suspeitas graves de colaboração entre Iryna Venediktova e Ivan Bakanov e as autoridades russas, mesmo quando a procuradora-geral se tem destacado ela ferocidade das acusações feitas às forças invasoras no que diz respeito às suspeitas de crimes de guerra que a própria investiga e o chefe da principal "secreta" do país, o SBU, que sucedeu ao KGB, cargo que ocupaa desde 2019.
Na mesma ocasião, Zelensky fez saber que estão em custo centenas de processos que envolvem funcionários da Procuradoria-Geral a carga de Iryna Venediktova, que está no cargo desde 2020.
Quanto ao caso de Ivan Bakanov, o líder ucraniano informou que estão igualmente identificados dezenas de elementos sob seu comando que mantêm contactos com a Rússia que contrariam os interesses da Ucrânia.
Ambos os casos representam "situações graves" porque demonstram que existem riscos sérios de duas das mais importantes instituições ucranianas, os serviços secretos e a procuradoria, estarem a agir contra a Ucrânia ou a mostrar fragilidades no cumprimento dos seus deveres.
Ambos foram já substituídos nos respectivos cargos.
Moscovo aponta unidade especial contra artilharia Made in USA ao serviço de Kiev
O ministro russo da Defesa, Sergey Shoigu (na foto), acaba de anunciar que deu ordens ao Grupo Vostok, uma unidade especial Spetsnaz do GRU (a secreta militar russa), para focar toda a sua acção na destruição das peças de artilharia de longo alcance ao serviço das forças ucranianas.
A ordem de Shoigu, que demonstra a inquietação das forças russas com a efectividade das unidades de artilharia de longo alcance enviadas pelos EUA e Reino Unido para os ucranianos, especialmente os obus 777 e os HIMARS, com alcance que pode ir às centenas de quilómetros, que estão a permitir a Kiev atingir locais estratégicos russos longe da linha da frente, como depósitos de armas e munições, ou ainda localidades distantes, incluindo no interior da Rússia, atingindo, diz Moscovo, áreas residenciais civis.
O Batalhão Vostok ficou célebre pela sua intervenção na guerra da Chechénia, na década de 1990.
Esta preocupação de Moscovo com as famosas peças de artilharia de longo alcance que fazem parte do alargado pacote de apoio militar dos EUA e do Reino Unido à Ucrânia, que estão a provocar danos no lado russo palpáveis, surgem depois de o embaixador russo na ONU, Vasily Nebenzia, ter dito que se trata da demonstração da irresponsabilidade do ocidente neste conflito, destacado o seu uso por Kiev nos ataques a civis nas repúblicas independentistas do Donbass, Lugansk e Donetsk.
A "solução final" de Medvedev
A questão da Crimeia, a península anexada por Moscovo em 2014 depois de um referendo popular, voltou a ser focada pela Rússia como ponto fulcral deste conflito, tendo Dmitri Medvedev, o número dois do Conselho de Defesa e Segurança da Rússia, e antigo Presidente e primeiro-ministro, ameaçado com recurso ao arsenal nuclear se alguma potência ocidental avançar para o território.
Medvedev, que é um dos principais e leais colaboradores do Presidente russo, Vladimir Putin, recorreu à expressão "solução final" para ameaçar tudo e todos que enveredarem por esse caminho de conflito directo com a Rússia a propósito da Crimeia, considerando que tal representaria uma "ameaça existencial" para o seu país.
Citado pela agência de notícias oficial russa, a TASS, Medvedev disse que o "dia do julgamento final virá de forma rápida e dura" se a Rússia pressentir que está existencialmente ameaçada, como seria o caso de uma operação militar ocidental na Crimeira, a península que alberga a poderosa frota russa do Mar Negro, no porto de Sabastopol.
Esta advertência de Medvedev surge depois de as chefias militares ucranianas terem vindo a público avisar para um eventual uso dos norte-americanos HIMARS, as unidades de artilharia lança-mísseis de longo alcance, que pode ir até aos 300 kms, contra forças russas estacionadas na Crimeia.
Contexto da guerra na Ucrânia
A 24 de Fevereiro as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação militar especial", sublinhando que o objectivo não é a ocupação do país vizinho mas sim a sua desmilitarização e desnazificação e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional.
O Kremlin critica há vários anos fortemente o avanço da NATO para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS, em 1991.
Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de Kiev da soberania russa da Península da Crimeia, invadida e integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro.
Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1991, com o colapso da União Soviética.
Kiev insiste que a Ucrânia é una e indivisível e que não haverá cedências territoriais como forma de acordar a paz com Moscovo, sendo, para o Presidente Volodymyr Zelensky, essencial o continuado apoio militar da NATO para expulsar as forças invasoras.
A organização militar da Aliança Atlântica está a ser, entretanto, acusada por Moscovo de estar a desenrolar uma guerra com a Rússia por procuração passada ao Exército ucraniano, o que eleva, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, o risco de se avançar para a III Guerra Mundial, com um confronto directo entre a Federação Russa e a NATO, que tanto o Presidente dos EUA, Joe Biden, como o Presidente Vladimir Putin, da Rússia, já admitiram que se isso acontecer é inevitável o recurso ao devastador arsenal nuclear dos dois lados desta barricada que levaria ao colapso da humanidade tal como a conhecemos.
Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país, mas que agora está concentrada no leste e sudeste da Ucrânia.
Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%, embora já tenha, entretanto, recuperado.
Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, a mais simbólica, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios, a banca e grande parte das suas exportações, ficando apenas de fora o sector energético, do gás natural e em pate do petróleo...
Milhares de mortos e feridos e mais de 5,5 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.
O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.