Apesar de o ministro da Defesa guineense ter garantido, a meio da tarde de Domingo, que os golpistas tinham sido travados pelas forças leais a Condé, a difusão de um vídeo onde o Presidente da República, que tinha sido eleito para um 3º mandato no ano passado, surge rodeado de militares que assumem ter tomado o poder, deixava poucas dúvidas para o sucesso do golpe.
Aos 83 anos, Alpha Condé liderava a Guiné-Conacry desde 2010 e a 07 de Novembro de 2020 tinha sido, finalmente, confirmado no cargo depois de muita contestação e denúncias de massiva fraude eleitoral, especialmente pelo seu principal concorrente, Cellou Diallo, com alguns dos seus antigos correligionários a virem a público dar corpo a essa denúncia.
Internamente, Condé tem estado sob fogo da oposição e das organizações da sociedade civil devido ao que alegam ser uma deriva autoritária do velho Presidente, bem como uma imensa lista de problemas sociais, desde o desemprego galopante ao cerceamento dos direitos civis e políticos, que estão na génese do descontentamento.
Isto, apesar, como sublinham analistas da realidade política guineense, dos avanços consentidos no primeiro mandato de Alpha Condé, cujo histórico de opositor ao longo dos anos dos sucessivos regimes autoritários instalados em Conacri lhe conferia um estatuto singular de aceitação popular mas que, agora, especialmente a partir do meio do seu segundo mandato, começou a seguir por caminhos que há muito a sociedade guineense rejeitara, como foi disso exemplo a procura, com sucesso, da alteração constitucional para se candidatar a um terceiro mandato.
O tenente-coronel Mamady Doumbouya fez declarações à televisão francesa France24 no sentido de garantir que o país estava sob o seu controlo e que o grosso das Forças Armadas estavam a apoiar o afastamento de Alpha Condé.
Este golpe, no entanto, não foi uma surpresa total para os analistas mais atentos à política local, porque, ao longo de 2019 e 2020, quando Condé preparava o seu "golpe" para conseguir um terceiro mandato, Conacri viveu momentos de grande tensão e de manifestações populares fortemente reprimidas pelas forças de segurança, tendo as mais participadas sido aquelas que visavam contestar a intenção do Presidente de manter-se no poder além do prazo legal existente na altura.
Estes protestos populares e a reacção pesada por parte das forças policiais e de segurança causaram dezenas de mortes em 2020 até à realização das eleições de 18 de Outubro, em que veio a suceder uma vitória de Condé muito contestada interna e externamente devido às alegações de fraude massiva.
Para alterar a Constituição que lhe permitiu manter-se no poder, Condé alegou ser necessário modernizar as instituições e dar mais espaço às mulheres e aos jovens no aparelho do poder guineense.
E é neste contexto de permanente tensão que as forças do tenente-coronel Mamady Doumbouya tomaram o poder, prendendo, como o atesta um vídeo distribuído pelas agências de notícias, o Presidente, e dissolvendo as instituições do Estado, pondo ainda termo ao Governo que tinha como chefe o Chefe de Estado.
Neste vídeo, como se pode ver na foto que acompanha esta notícia, Alpha Condé aparece sentado num sofá, em traje informal e numa pose reveladora, mas rodeado de militares golpistas.
O vídeo tem por objectivo mostrar que o Chefe de Estado está sob o seu domínio mas este aproveita para mostrar um à-vontade desafiador aos militares golpistas.
No entanto, tiros ouvidos pelos jornalistas no terreno junto ao Palácio Presidencial em Conacri - há relatos de mortes entre militares de um e outro lado - mantinham em relativo suspense o desfecho definitivo deste golpe militar.
A Guiné-Conacri é um país rico em recursos naturais mas consta da lista dos mais pobres do mundo.