Desde o início deste conflito, a 07 de Outubro (ver links em baixo nesta página), aquando do ataque audaz e surpreendente do braço-armado do Hamas, as Brigadas Al Qassam, sobre o sul de Israel, onde deixou um rasto de morte e destruição, com 1200 mortos e dois mil feridos, prontamente condenado por toda a comunidade internacional, e com especial severidade pelo português que chefia a ONU, e da resposta avassaladora das IDF, com uma barragem de artilharia e misseis lançados por aviões de guerra, que ainda se mantém, que o Governo de Benjamin Netanyhau demonstra não estar satisfeito com António Guterres.

Começou logo no dia seguinte ao raide do Hamas no sul de Israel, com Televive a exigir mais severidade nas condenações internacionais e, em especial, da ONU, embora isso tenha sido evidente, até no universo dos países árabes vizinhos, mesmo que de forma mais moderada, mas tudo se complicou, nas relações entre as Nações Unidas e o Secretário-Geral, quando este começou a criticar a dimensão exacerbada e assimétrica da resposta israelita, que logo nos primeiros dias não só destruiu centenas de prédios em Gaza como somou milhares de mortios e feridos, atingindo especialmente crianças e mulheres.

As coisas pioraram quando Guterres, sem nunca deixar de condenar com veemência os ataques do Hamas, numa intervenção em Nova Iorque, na sede da ONU, criticou severamente a mortandade provocada pelas IDF em Gaza e defendeu que o que se passou a 07 de Outubro "não saiu do nada (vácuo)" mas sim de décadas de ocupação israelita da Palestina e da violência dessa ocupação que nunca parou desde a criação do Estado de Israel, em 1948.

Este foi o ponto de ruptura entre o Governo extremista de Netanyahu, que mantém o poder em Israel sobre uma coligação de partidos radicais, de extrema direita, alguns deles defendem mesmo a expulsão de todos os palestinianos, mais de 6 milhões, da região, ou mesmo o uso de bombas nucleares sobre Gaza, e encontrou no ataque do Hamas uma cobertura eficaz para se proteger do momento difícil que estava a enfrentar até ai, seja por causa dos processos judiciais onde estava como suspeito de corrupção d peculato, seja por causa dos milhões que inundavam diariamente as ruas de Israel em protesto contra a sua polémica reforma da Justiça, que o livraria do risco de ser preso.

Desde então, os ataques cerrados ao chefe da ONU não cessaram e esta semana foi aberta uma nova frente, com o ministro dos Negócios Estrangeiros israelita, Eli Cohen, a dizer que António Guterres não é merecedor do cargo que ocupa porque nada fez para abrir caminho, ou "encorajar", um processo de paz em Gaza.

O chefe da diplomacia israelita, um dos extremistas do Governo de Benjamin Netanyhau, esteve esta semana em Genebra, na Suíça, na sede de diversas organizações internacionais, ONG"s e ligadas à ONU, como a Organização Mundial de Saúde (OMS), ou da Cruz Vermelha Internacional, para procurar apoio nos esforços de libertação dos reféns levados para Gaza pelos combatentes do Hamas, e ali deixou claro que Guterres é agora um "alvo" prioritário a "abater" por Telavive.

Cohen disse que o português "não é merecedor do cargo que ocupa", adiantou que este "nada fez para encorajar um processo de paz em Gaza" e sublinhou que o actual Secretário-Geral da ONU, a cumprir o seu segundo mandato de cinco anos, "devia já ter defendido sem subterfúgios que apoia a expulsão completa do Hamas de Gaza".

Por outras palavras, o que o ministro israelita dos Negócios Estrangeiros quer é que António Guterres apoie publicamente a resposta israelita aos ataques do Hamas, onde surge em destaque, além da invasão terrestre em curso, os bombardeamentos aéreos das últimas cinco semanas, que fizeram mais de 11 mil mortos, metade destes crianças, mais de 60 funcionários da ONU no território perderam a vida, quase meia centena de jornalistas morreram, e mais de 1,2 milhões de pessoas foram deslocadas das suas casas à força das bombas, sem acesso a água, luz, alimentos... mais de metade dos 36 hospitais fecharem por alta de combustível ou foram destruídos e os centros de acolhimento da ONU estão a ser demolidos uma atrás do outro...

A este ataque cerrado de Israel ao Secretário-Geral da ONU, respondeu o próprio, durante as últimas semanas, indirectamente, mantendo a coerência das críticas à extrema violência da resposta israelita em Gaza e a severa condenação do ataque do Hamas, deixando claro que Israel tem o direito de se defender mas igualmente a obrigação de cumprir a Lei Internacional de protecção dos civis, dos hospitas, dos campos de refugiados e dos centros das Nações Unidas no território.

Mas também saiu a terreiro em sua defesa o subsecretário-geral da ONU, Jorge Moreira da Silva, que considerou a barragem de ataques israelitas a Guterres "injustos", disparando com o "orgulho e o apoio total" dos funcionários da ONU ao seu "chefe".

Citado pela Lusa, o também português Moreira da Silva, disse ter achado "injustas e surpreendentes" os ataques de Telavive a António Guterres, "na medida em que a argumentação que [Guterres] utilizou - e que nós [chefes de agências da ONU] temos utilizado - tem sido sempre a mesma".

A retórica da ONU tem sido pautada, segundo o subsecretário-geral, por "uma fortíssima condenação aos ataques perpetrados pelo Hamas, ataques hediondos, horrendos, que não têm perdão e, portanto, uma condenação cabal" dos mesmos, e também pela "exigência da libertação sem qualquer tipo de condição dos reféns israelitas".

Este sublinhou, ainda em declarações à Lusa, que quer António Guterres, quer vários funcionários da ONU, têm feito afirmações claras: "Primeiro, os palestinianos não podem sofrer uma punição colectiva pelos crimes perpetrados pelo Hamas, porque não faz qualquer sentido confundir os civis palestinianos com o Hamas", e em segundo lugar, "uma claríssima afirmação de que até as guerras têm regras e que infra-estruturas civis não podem ser atacadas, os civis não podem ser atacados e a ajuda humanitária tem que poder chegar em condições de segurança a todos os cidadãos mais necessitados".

O líder das Nações Unidas tem feito nas últimas semanas apelos por um cessar-fogo humanitário na guerra entre Israel e o Hamas que transformou a Faixa de Gaza "num cemitério de crianças" palestinianas, segundo as suas palavras, e, numa reunião do Conselho de Segurança, afirmou que os ataques do grupo islamita "não vieram do nada", lembrando que os palestinianos foram "sujeitos a 56 anos de ocupação sufocante".

A "guerra" declarada por Israel ao Secretário-Geral da ONU está a ganhar tracção, curiosamente, numa altura em que cresce de forma acelerada o números de países, incluindo os principais aliados de Israel, como os EUA ou o Reino Unido, que exigem que as IDF cumpram as "leis da guerra", protegendo as populações civis, hospitais e infra-estruturas sociais, aceitem pausas humanitárias ou cessar-fogo prolongados por razões humanitárias, e que Telavive permita a entrada de apoio humanitário de forma mais regular e abundante, porque as escassas centenas de camiões que entraram na fronteira de Raffah, entre Gaza e o Egipto, são, no dizer de Guterres, "uma gota de ajuda num oceano de necessidades" geradas pelos continuados bombardeamentos israelitas.

Na última referência feita pelo chefe das Nações Unidas que enfureceu o Governo de Netanyhau, este critica a situação dramática de quase todos os hospitais em Gaza, onde as IDF dizem estar a ser usados pelo Hamas como protecção contra as operações em curso, sendo disso demonstração clara a invasão da maior unidade de saúde do território, o Hospital Al-Shifa, actualmente sob controlo das forças israelitas, que justificam a situação com a procura de terroristas nas suas caves, e que o Hamas nega categoricamente, acusando mesmo os israelitas de inventarem provas para os media internacionais.

Além das mortes de civis, do lado israelita, no primeiro dia desta guerra, 1200, e dos mais de 11 mil do lado palestiniano, ao longo de cinco semanas, os dois lados referem elevadas baixas entre as forças dos dois lados, com as IDF a avançarem que abateram mais de mil combatentes do Hamas, das Brigadas Al Qassam, enquanto o Hamas diz que foram já destruídos cerca de 180 carros de combate e mortos centenas de militares das IDF nesta incursão terrestre em Gaza que visa objectivamente "destruir por completo e para sempre" este grupo que os países ocidentais consideram terrorista e no universo muçulmano é visto como a resistência à ocupação israelita da Palestina.