Com as autoridades em Teerão obrigadas, para não perderem a face, a vingar o ataque israelita ao seu consulado na capital da Síria, onde foram mortos dois generais de topo do corpo de elite da Guarda Revolucionária, a Força Quds, a situação deteriora-se diariamente.
O ataque ao consulado em Damasco teve lugar a 01 de Abril e, desde então, tanto o Presidente iraniano, Ebrahim Raisi, como o líder supremo, aiatola Ali Khamenei, têm multiplicado ameaças a Israel de vingarem os 11 mortos nesse ataque, entre estes os dois generais.
Face ao crescendo da retórica vingativa iraniana, o Governo israelita veio esta quarta-feira, através do seu ministro dos Negócios estrangeiros, Israel Katz, avisar que qualquer ataque contra Israel oriundo do território do Irão terá como resposta imediata um ataque israelita contra o território iraniano.
O que está subjacente a esta ameaça é uma clara guerra aberta e total entre as duas maiores potências militares da região do Médio Oriente, que tem como "bónus" o facto de, nessa eventualidade, os Estados Unidos seguramente sairiam em apoio ao seu mais importante aliado em todo o mundo.
O que, do outro lado, corresponde, embora sem o mesmo nível de compromisso histórico que une EUA e Israel, aos acordos firmados entre a Rússia e a China e o Irão, o que faz de um conflito israelo-iraniano um potencial detonador de uma guerra de intensidade e consequências jamais vistas neste complexo xadrez do Médio Oriente.
Porém, este contexto, que envolve o recente incendiar das ameaças entre Teerão e Telavive, é mais abrangente que o ataque em Damasco e o próprio conflito em Gaza.
Isto, porque ainda bem presente na memória iraniana está o assassinato do comandante da Guarda Revolucionária, Qassem Soleimani, em Bagdad, Iraque, com um míssil disparado por um drone norte-americano e para a qual também Raisi e Khamenei juraram vingança sem que tal tenha acontecido até agora, pelo menos na intensidade afirmada então.
Que tipo de vingança saciará a "fome" de retaliação de Teerão, é difícil definir, mas, nas últimas horas, o comandante da Marinha de Guerra iraniana deu uma pista, falando na possibilidade de, assim que o entender, fechar o Estreito de Ormuz ao tráfego marítimo, cujas implicações seriam devastadoras para a economia mundial, como se pode compreender aqui.
A questão é, porém, de tal forma séria e sem paralelo nos tempos mais próximos que Israel na última semana, retirou dezenas de milhares de soldados de Gaza para formar uma capacidade de reacção à esperada vingança iraniana.
Isto, porque uma forte possibilidade é que o Irão recorra aos seus "proxys", como o Hezbollah, no sul do Líbano, para atacar o norte de Israel, ou os Houthis, do Iémen, embora estes, devido à distancia, surjam como menos prováveis ferramentas de retaliação.
Já o Hezbollah é de tal forma poderoso e bem organizado que, por exemplo, em 2006, em inferioridade numérica, desferiu uma humilhante derrota militar a Israel numa guerra que durou 34 dias de grande intensidade, tendo Telavive sido obrigado a pedir apoio à ONU para diluir a dimensão da vergonha.
Alguns analistas dizem que o ataque em Damasco foi pensado para criar uma situação de inevitável entrada dos Estados Unidos no conflito, como forma de permitir ao Governo de Benjamin Netanyhau diluir a situação complicada em Gaza, onde, ao fim de seis meses, e a destruição do território, com mais de 34 mil mortos entre civis, nenhum dos objectivos iniciais foi conseguido.
Mas se o Irão optar por abrir uma frente de guerra de alta intensidade na fronteira israelo-libanesa, então o apoio dos EUA não sofrerá alterações, mantendo a actual forma de ilimitado fornecimento de equipamento militar e financiamento da guerra.
E, para essa circunstância, o Governo de Netanyhau, o mais radical de sempre, tanto ideológica como religiosamente, vai precisar de empregar os milhares de tropas que têm actualmente em Gaza.
Só que em nenhuma das juras de vingança dos lideres iranianos, como a mais recente, de Ali Khamenei, numa discurso alusivo ao fim do Ramadão, o mês sagrado islâmico, este sublinhou que o ataque israelita ao consulado iraniano na Síria é o mesmo que atacar território iraniano.
"Por isso, o diabólico regime israelita deve ser punido e vai ser punido", disse, em Teerão, o líder supremo, que é a mais alta, acima do Presidente, autoridade iraniana que aproveitou ainda para acusar os EUA e o Reino Unido de apoiarem Israel na sua actividade criminosa.
Como vai evoluir esta situação, só nos próximos dias se saberá, mas alguns analistas entendem que pode estar em formação a tempestade perfeita, que é nenhuma das partes ter condições para recuar, seja porque disso depende o seu prestígio regional, seja porque internamente as suas populações possam exigi-lo.