O nome masculino para esta tempestade é ainda inapropriado porque faltam nomes às equipas de socorro e às autoridades líbias para atribuir aos milhares de se suspeita estarem soterrados em milhões de toneladas de lama e água que varreram aldeias umas atrás das outras com o colapso de duas barragens.

O que choveu no Domingo, para segunda-feira, no nordeste mediterrânico da Líbia foi mais que aquilo que chove, por vezes, em anos, neste país coberto pelo deserto do Saara na sua grande maioria do território, e isso foi demais para as represas situadas na zona de Derna, a cidade mais atingida por esta catástrofe que ainda, quatro dias após a enxurrada, está longe de ter dados consolidados sobre o número de vítimas e a dimensão da destruição material.

A tempestade "Daniel", uma das mais severas do norte de África em décadas, formou-se bastante a norte, na Europa, tendo deixado igualmente um rasto de destruição em países como a Bulgária, com passagem pelos Balcãs e, na Grécia, onde até agora tinha deixado as marcas de morte mais rugosas.

O britânico The Guardian chama a esta situação na Líbia, um "desastre para lá da capacidade humana de compreensão", face aos esforços em curso para varrer o território que ficou coberto por este manto de morte e sofrimento, no qual já ficaram também vários elementos das equipas de socorro, nomeadamente três do Crescente Vermelho (Cruz Vermelha), enquanto socorriam pessoas levadas pelas cheias repentinas que se formaram com a cegada da "Daniel".

Com o país dividido em dois lados por uma guerra civil que tem a sua raiz na "primavera árabe" e na morte, em 2011, do coronel Kaddafi, a capacidade de resposta da Líbia está claramente diluída e isso verificou-se, segundo algumas testemunhas, na demora da resposta local, mas também no tempo excessivo que levou para lançar um pedido de ajuda internacional.

As imagens lancinantes de famílias inteiras a serem levadas com as suas casas estão a encher de negrume as redes sociais mas, ao mesmo tempo, mostrando a fragilidade da capacidade de resposta gerada pela guerra civil e pelo desmembramento do Estado, um dos mais ricos social e materialmente em África, com o golpe que derrubou Kaddafi, apoiado e financiado pelos países ocidentais, nomeadamente EUA e França.

Além deste impacto imediato tanto em vidas humanas levadas pelas chuvas como na destruição de localidades, nalguns casos totalmente arrastadas para o mar, a Líbia tem ainda como parcela trágica da passagem da "Daniel" a disrupção do seu sector petrolífero, com parte da produção suspensa, o que está ainda a impactar nos mercados internacionais face à importância que este produtor africano tem enquanto o 2º maior produtor do continente, atrás da Nigéria.