Depois da "aliança" no campo da segurança mútua assinado pelos três países do Sahel que estão sob domínio de juntas militares golpistas, Burquina Faso, Mali e Níger, a censura sobre a revista de maior abrangência pan-africana, em língua francesa e com sede em Paris, deverá chegar igualmente ao Mali e ao Níger.

Mas esta nova vaga de censura sobre órgãos de comunicação social aplicada por decisão de governos e sob a condição de política oficial, teve na Europa Ocidental um momento de viragem com a Comissão Europeia, presidida pela alemã Ursula Von Der Leyen, cargo de nomeação e não de eleição, a impor a todos os 27 países do bloco como política oficial a proibição de difusão de um conjunto de media russos sob a justificação de que são meios difusores de desinformação e propaganda de Moscovo.

A mesma Comissão Europeia que criticou severamente todos os países africanos que limitaram ou interditaram a difusão dos media franceses RFI e France24 que alegaram exactamente a mesma razão para a medida a que Bruxelas recorreu para fechar o acesso às tv"s, jornais e sites russos no espaço da Europa Ocidental, a difusão de propaganda, manipulação e desinformação ao serviço de Paris, que viu com esta sucessão de golpes de Estado militares ofuscar-se fortemente a sua influência e presença nesta vasta região africana, conhecida pejorativamente por "FranceAfrique".

Com esta medida anunciada em Ouagadougou, que fecha as fronteiras ao grupo de media francês, embora tenha sido fundado na Tunísia, em 1960, Jeune Afrique, que tem existência através da sua revista e um site de grande abrangência, o Governo do Presidente de transição, o capitão Ibrahim Traoré, castiga a publicação por artigos onde se revelam alegadas tensões entre as fileiras do Exército sobre a governação do país.

A medida foi anunciada esta semana pelo porta-voz do Governo de transição e ministro das Comunicações, Rimtalba Ouédraogo, imediatamente após a divulgação do artigo onde a Jeune Afrique revela que as Forças Armadas burquinenses estão fortemente divididas e graça o descontentamento nos quartéis.

O que Rimtalba Ouédraogo garante ser falso e que toda a informação a este propósito divulgada pela revista "é apresentada sem uma única prova", tendo apenas como "objectivo criar perturbação e o descrédito" no e do Exército.

Recorde-se que o novo poder em Ouagadougou, tendo o capitão Traore assumido o cargo há cerca de um ano, já expulsou antes os jornalistas correspondentes de media franceses como o Le Monde e o Liberation, além do fecho da televisão LCI.

Claramente em rota de colisão com a França, estes três países cortaram relações quase a 100% com Paris, tendo o Níger acabado de ver o embaixador francês abandonar o país depois de uma ordem de expulsão a que Paria resistiu por duas longas semanas, saindo com o diplomata toda a presença militar francesa.

No entanto, como tem sido, de resto, recorrente nestes países sujeitos a golpes militares, o ataque dos novos poderes aos media antecede sempre o aumento de tensão com a antiga potência colonial, a França, que é o elemento comum, além da origem nos quarteis dos golpistas, aos últimos golpes ocorridos no continente: Guiné-Conacri, Mali, Burquina Faso, Níger, Gabão...

Novo ataque à liberdade de imprensa, acusa Jeune Afrique

Na reacção à expulsão do Burquina Faso, a direcção da Jeune Afrique acusa o novo poder em Ouagadougou de ter desferido "mais um ataque à liberdade de informação" e disse, segundo o site AfricaNews, esperar que o regime burquinense reconsidere a sua decisão.

Na mesma resposta, a Jeune Afrique diz que esta medida do Governo do capitão Traore é "fruto de uma censura de outras épocas" e que tal acrescenta mais uma estaca na construção de uma região em África de "não-informação" e onde o jornalismo é o inimigo.

No mesmo enunciado, este media com sede em Paris sublinha que não se trata de nada de novo, recordando que o mesmo já sucedeu anteriormente à RFI, à France24, à LCI, a vários correspondentes de media internacionais, mas também a um conjunto alargado de media nacionais, com destaque para as rádios locais, e uma repetição constante de ameaças à vida de jornalistas que não aparecem alinhados com o poder.

"Isto é um severo ataque ao direito do povo burquinense à informação e aos jornalistas que procuram fazer o seu trabalho", diz a Jeune Afrique, deixando em evidência que o jornalismo não é bem visto nas sedes de poderes autoritários e ditaduras.