Ainda nesta semana, que se abeira claramente da sua pior semana desde o início da guerra, há quase 20 meses, o Presidente Volodymyr Zelensky viu publicada uma sondagem, financiada e realizada sob supervisão norte-americana, do Instituto Republicano Internacional (IRI) e da USAID, a Agência Internacional para a Ajuda ao Desenvolvimento, onde é claramente esmagado pela impopularidade, recebendo apenas a aprovação inequívoca de 42% da população, embora outros 40% não desaprovem totalmente.
Apesar de parecerem bons números quando comparados com sondagens semelhantes noutras geografias, neste caso não o são porque Zelensky, logo após a invasão russa, a 24 de Fevereiro, viu a sua popularidade subir em flecha para quase 100%, estando de forma evidente numa trajectória descendente, o que pode ser demonstrado com o facto de, em Abril deste ano, um estudo de opinião semelhante, ter indicado que a sua aprovação sem rodeios estava nos 58% e a aprovação com dúvidas nos 33%, enquanto a severa desaprovação chegou aos 9%, quando era apenas de 3% anteriormente.
Mas, provavelmente, o golpe mais dilacerante na reputação do Presidente ucraniano vem de um seu ex-colaborador próximo, Oleksiy Arestovych, que, em entrevista a um jornal polaco, citado pelo Observador, Volodymyr Zelensky tem "delírios de grandeza" e é "arrogante" e pensa que "manda no mundo", de tal modo que já começou a ser visto como insuportável por muitos dos seus aliados ocidentais, causando-lhe "irritação" só ao pensarem que têm de o aturar de novo.
Apesar de Arestovych ser suspeito ao falar desta forma do seu antigo chefe, porque foi demitido do seu gabinete, onde pontuava entre os mais próximos do chefe do regime ucraniano, depois de ter feito declarações onde explicava que uma explosão num prédio habitacional, que Zelensky acusava a Rússia da autoria e de um "terrível crime de guerra", era, afinal, resultado do abate de um míssil russo pela artilharia ucraniana, a verdade é que as suas palavras coincidem com algumas posições já assumidas por líderes europeus, nomeadamente dos seus mais robustos apoiantes, a Polónia, que chegaram a acusá-lo de se comportar com um náufrago que, no seu desespero, está a levar consigo para a morte quem o tenta ajudar.
Ainda não fica por aqui a semana "mais sombria" do líder ucraniano. A Eslováquia, que era o segundo país mais empenhado da Europa de Leste no apoio a Kiev, a seguir à Polónia, observou uma reviravolta de 180º e acaba de mudar totalmente de lado, com a tomada de posse, na terça-feira, de Robert Fico, o novo primeiro-ministro, do Partido Social-Democrata, que ganhou as eleições em Outubro, posicionando-se claramente como aliado de Moscovo e prometendo "não enviar nem mais uma bala" para Kiev.
Isto é especialmente severo para o lado da "barricada" ucraniana porque, também na Polónia, o primeiro-ministro da extrema-direita nacionalista e que não escondia o seu ódio político e pessoal à Rússia, Mateusz Morawiecki, perdeu as eleições de 15 de Outubro para o social-democrata Donald Tusk, cuja tomada de posse está para breve, e que, embora alinhando com a maioria dos países europeus no apoio à Ucrânia, não é, nem de perto nem de longe, comparável com o empenho incansável do ainda chefe do Executivo.
Mas há ainda mais para atormentar a existência de Volodymyr Zelensky.Na guerra, apesar de um sucesso circunstancial nos ataques recentes a bases russas com os mísseis de longo alcance norte-americanos ATACMS, na linha da frente, o poderio militar russo tem conseguido não só anular o que restava da contra-ofensiva ucraniana, como tem conseguido ganhar algum do escasso terreno perdido desde 04 de Junho.
Porém, o que verdadeiramente é um "tiro pelas costas" de Zelensky vem dos media internacionais que, ainda antes da guerra em Gaza, despoletada pelo ataque aterrador de 07 de Outubro do Hamas ao sul de Israel e a demolidora, e mortífera como nunca visto, resposta de Telavive sobre Gaza, ter sugado toda a atenção mediática, atirando a guerra na Ucrânia para as páginas esquecidas dos jornais, já os grandes media norte-americanos estavam a mudar a sua linha editorial de apoio incondicional a Kiev para uma postura crítica à governação de Zelensky, salientando a corrupção pantanosa em que se move e a falta de resultados militares na frente de combate.
Isto, quando é inequívoco que foram os media ocidentais que mais fizeram por elevar a figura de Zelensky aos píncaros da popularidade, como herói em todo o mundo, concatenados com a Administração norte-americana, limpando totalmente as suspeitas que enchiam páginas de jornais antes do conflito, nomeadamente a sua exposição feita pelo processo que ficou conhecido como "Panama Papers", que mostravam as suas contas milionárias em paraísos fiscais.
Embora as questões de imagem e de perda de apoios na Europa, ou mesmo entre os seus concidadãos, dos quais pode estar a salvo porque as eleições, previstas pelo calendário eleitoral para o início de 2024, deverão ser adiadas sine die pelo estado de lei marcial em que o país está, do que Zelensky dificilmente se poderá salvar é da mudança de azimute nas preocupações do Presidente norte-americano Joe Biden e do Congresso, que tem agora na Câmara dos Representantes um líder crítico do apoio sem freio em dinheiro e armas para a Ucrânia.
A linha republicana liderada por Donald Trump tem defendido travão a fundo aos milhões enviados por Joe Biden para Kiev, e é isso mesmo que Mike Jonhson, o novo "speaker" da "House", e 3º na linha de sucessão do Presidente, deverá certificar já na próxima semana, quando chegar para votação mais um pacote de 24 mil milhões USD que os democratas tinham preparado antes da crise que levou à queda do anterior líder da Câmara dos Representantes, Kevin McCarthy, pelos seus "colegas" republicanos que possuem a maioria da câmara baixa do Congresso.
E sem o apoio ilimitado dos EUA, a Ucrânia não tem qualquer possibilidade de manter o esforço de guerra que permita conter a Rússia no actual mapa das trincheiras, porque os outros aliados ocidentais, os europeus, estão a atravessar, quase em uníssono, processos eleitorais internos ou para o Parlamento Europeu que dificilmente lhes poderão permitir manter o apoio avultado a Kiev face às severas crises económicas e sociais que vivem intramuros.
Alias, tem sido o próprio Presidente da Rússia, Vladimir Putin, que, em diversas ocasiões, tem advertido para o facto de Kiev não aguentar sequer uma semana sem o apoio de Washington, o que pode vir a ser uma realidade em breve, até porque não só esta sobre brasas por essa via mas também porque Donald Trump, com quem tem efectivamente más relações, se apresta para regressar à Casa Branca nas eleições de 2024, como todas as sondagens o demonstram, com larga margem de vantagem sobre o democrata Joe Biden.