Os alemães e os franceses são, além das duas grandes potências económicas da Europa ocidental, os dois maiores fornecedores de apoio militar, político e financeiro à Ucrânia mas, também, as duas maiores vítimas das repercussões das sanções à Rússia por causa do conflito.

Com as sanções ao petróleo e ao gás russo, embora de forma mais acentuada na Alemanha, os motores industriais da União Europeia perderam tracção porque deixaram de ter acesso ilimitado a energia barata importada da Rússia.

Estão agora obrigados a ir comprar gás e crude três vezes mais caro aos Estados Unidos e a outros locais, como o Médio Oriente e mesmo África, o que, com o passar dos meses, foi enterrando todo o bloco numa depressão económica, muito porque o motor alemão está a fraquejar, tendo mesmo este gigante atravessado uma longa recessão.

Só que, curiosamente, o tema da economia europeia e o impacto nesta da guerra na Ucrânia foi mantido na sombra durante a campanha e, agora que os partidos que suportam os Governos em França, o Renaissance, do Presidente Emmanuel Macron, e, na Alemanha, o SPD (Social-Democrata) do chanceler Olaf Scholz, sofreram pesadas e humilhantes derrotas, começa a ser inevitável a ligação.

Até porque em França, Macron dissolveu de imediato o Parlamento e convocou eleições para 30 de Junho, e na Alemanha, a oposição está a exigir a Scholz que interprete correctamente a vontade dos eleitores, que é a sua resignação, embora este já tenha dito que não vai seguir o exemplo francês.

A par deste cenário, tanto em França como na Alemanha, foram duas forças políticas da extrema-direita, xenófoba e nacionalista, em França o Rassemblement National, de Marine Le Pen, e na Alemanha a Alternativa para a Alemanha (AfD), ainda mais extremista e racista, que mais cresceram, tendo em França vencido mesmo as eleições e na Alemanha ficado em 2º.

Sobre ambos os partidos, recaem, segundo os media ocidentais, sérias suspeitas de estarem há anos a ser financiados pela Rússia de Vladimir Putin, sendo que no caso de Marine Le Pen é factual que esta obteve em condições vantajosas avultados empréstimos de bancos russos.

E essa circunstância leva a que o impacto económico na Europa do conflito russo-ucraniano esteja a ser apenas abordado nos media pela via do apoio a Kiev e a eventual alteração a este rumo face aos resultados e eventuais mudanças drásticas nas políticas em Paris e em Berlim.

Porém, como alguns analistas destacam, o peso das crises económicas francesa e alemã, geradas pelas sanções à Rússia, está erradamente a ser negligenciado, porque grande parte dos eleitores foi a esse factor que reagiu, especialmente na sequência da inflação em alta, desemprego e até deficiente crescimento, sendo que a imigração é igualmente factor de peso.

Alias, para vincar bem que em Moscovo o resultado destas eleições foi e esta a ser seguido milimetricamente, o presidente da Duma, o Parlamento russo, Vyacheslav Volodin, já veio dizer que tanto Macron como Scholz deviam demitir-se de imediato após as humilhantes derrotas que sofreram.

Todavia, estas palavras de Volodin são, no mínimo, intempestivas, porque se é verdade que os maiores aliados de Kiev na Europa sofreram pesadas derrotas, a verdade é que os "aliados" de Putin entre os partidos europeus, quase todos de extrema-direita, ficaram longe de conseguir uma maioria no Parlamento Europeu, onde continua a "reinar" o Partido Popular Europeu (PPE), que é totalmente a favor do reforço do apoio a Kiev.

Alias, essa é a razão pela qual em Kiev a reacção às eleições europeias está a ser moderadamente festejada porque, mesmo correndo o risco de perder dois aliados de peso, caso em França as eleições legislativas de 30 de Junho sejam ganhas pelo partido de Le Pen, e na Alemanha Scholz se veja obrigado a resignar, no Parlamento Europeu deve eleger para liderar a Comissão Europeia a sua mais férrea aliada e o mais aguerrido falcão de guerra europeu, a alemã Ursula von der Leyen.

Entretanto, na Suíça, começa a ganhar corpo a Cimeira da Paz para a Ucrânia, com o Governo helvético a avançar que já estão confirmadas as presenças de 90 países, quase metade oriundos da Europa ocidental, mas com flagrantes ausências de pesos-pesados, como a China, a Arábia Saudita, a Índia, a Indonésia ou o Brasil e a África do Sul, e mesmo de Angola, sendo que outros se vão fazer representar por segundas e terceiras linhas, como é o caso dos EUA.

Com o crescente volume de notícias que apontam para o insucesso desta iniciativa, para a qual, oficialmente, por recusa de Kiev, o Governo suíço não convidou a Rússia, o que levou o Kremlin a considera tratar-se de "uma palhaçada inútil", começam a surgir evidências de contra-informação planeada.

Isto, porque o jornal britânico The Guardian, mesmo sendo notório e claro que os russos não foram convidados para esta Cimeira, sendo essa a razão para a ausência, por exemplo, de chineses, sauditas, brasileiros e sul-africanos, pelo menos ao mais alto nível, noticia esta segunda-feira, 10, que a Federação Russa recusou o convite do Governo da Suíça.

Todavia, The Guardian cita a Presidente suíça, Viola Amherd, como tendo dito que a Rússia "recusou participar nesta Cimeira", quando o facto de os russos não terem sido convidados é um facto conhecido e sem negação plausível, o que permite interpretar estas palavras como uma admissão de falhanço desta iniciativa, procurando atirar as culpas para os russos.

E, quando faltam apenas cinco dias para o início da Cimeira da Paz, de 15 e 16 deste mês, os russos, segundo relatos de bloggers de guerra russos, deram início à esperada ofensiva de Sumi, a norte da cidade de Kiev, o que abre mais uma frente de guerra nesta fronteira ao juntar-se à ofensiva de Kharkiv.

Esta ofensiva obriga ainda mais à dispersão das forças ucranianas, que já estão claramente em perda na frente leste e sul, onde os russos ganham terreno todos os dias.

A única esperança, para os próximos meses, de Kiev é que as armas ocidentais que vão chegar e os aviões de guerra, os norte-americanos F16, e os franceses Mirage 2000 5F, possam fazer alguma diferença no campo de batalha.