As mudanças de paradigma das políticas da nova administração Trump vão afectar não apenas o comércio internacional e regional, com efeitos drásticos em sectores sociais, como a saúde, ajuda humanitária, mas também influenciar o curso dos acontecimentos através do aumento das disputas geopolíticas e económicas, como está a ficar patente não só com o conflito na RDC e noutras latitudes do continente, como também com as querelas políticas com a África do Sul, na sequência da nova legislação de expropriação de terras.

Tudo aponta para que em Trump 2.0, na sequência da olímpica ignorância a que foi votado no primeiro mandato do actual Presidente dos EUA, se assista a um simples engajamento selectivo com África, que, para além de priorizar os interesses estratégicos norte-americanos, vai enfatizar as relações bilaterais, casuísticas.

Sem esquecer que Trump também já brandiu a arma do aumento de tarifas em relação ao grupo dos países membros dos BRICS, onde, ao nível do continente africano, pontificam a África do Sul, a Etiópia e o Egipto.

Parece, assim, pouco expectável o estatuto de acesso dutry-free ao mercado dos EUA por parte de países africanos, para que determinados produtos específicos mantenham o mesmo quadro, sendo mais provável que o seu alcance venha a ser mais limitado, alinhado com os interesses geopolíticos de Washington na disputa com a China.

Depois do sinal de alarme dado com a suspensão por 90 dias do plano de emergência na luta contra a SIDA, na ordem de $7.5 mil milhões USD, sob tutela do Departamento de Estado, seguiu-se o anúncio de encerramento do USAID e o congelamento geral de ajudas humanitárias. O despoletar desta crise também irá contribuir para a diminuição do fluxo de divisas no continente africano, acentuando a escassez da moeda norte-americana em muitos países.

Segundo vários analistas, as políticas de Trump poderão manter taxas de juro elevadas, na sequência de novas pressões inflacionistas catapultadas pelas tarifas impostas por Washington, o que contribuirá, também, para o aumento do custo dos empréstimos feitos por países africanos. Por consequência, os países que se confrontam com severas crises de dívida soberana poderão ser constrangidos a regressar aos mercados de capital em condições menos favoráveis, exacerbando a asfixia financeira.

Desde 2022 que os Governos africanos se viram afastados dos mercados internacionais de capital, devido às altas de juro, quando os custos dos empréstimos subiram assustadoramente. Mais recentemente, alguns países, tais como a Costa do Marfim, Benim, Camarões, Quénia, Nigéria e África do Sul, conseguiram regressar aos mercados dos eurobonds.

A situação pode mostrar-se desafiadora se, como se espera, a nova administração Trump regresse a políticas menos ortodoxas, dificultando a tarefa dos países africanos com pesado fardo de dívida externa. Numa palavra, maiores taxas de juro nos EUA e um dólar forte complicaram mais o pagamento do serviço da dívida e o financiamento de novos projectos. O regresso aos mercados internacionais será feito sob condições mais draconianas.

Para a MCB Global Markets, a combinação de elevadas taxas de juro e constrangimentos nas receitas fiscais interna em muitos países africanos empurrara os Governos a aumentar empréstimos em moeda local, conduzindo a diminuição de rendimentos e condicionando as receitas, aumentando a dívida pública.

A mudança global para um paradigma de nacionalismo de costas para a recente globalização, tal como foi evidenciado em diferentes fóruns internacionais como em Davos recentemente, sugere aos países africanos a busca de parcerias alternativas e reforço da cooperação regional. Para Angola, a braços com um pesado fardo de dívidas, num cenário global de grandes incertezas políticas e altamente dependente ainda da exportação de petróleo bruto, o desafio parece agigantar-se.

Em resumo, o regresso de Trump à Casa Branca traz consigo um ambiente internacional mais desafiador para toda África, que, diante de um panorama de taxas de juro elevadas, presença de um dólar forte, alterações das políticas comerciais, redução drástica das ajudas externas, precisam de novas estratégias fiscais, maior cooperação regional para aliviar estes impactos negativos e garantir o crescimento.