Por esse facto ainda é desconhecido qual o grau de afluência ao acto eleitoral. Mas, apesar destas "inconveniências" religiosas, a maioria dos especialistas eleitorais senegaleses, como El Hadji Saidou Nourou Dia, citado pelo site da rádio Deutsche Welle (DW), acreditam ter conseguido - como tudo parece indicar pelos primeiros resultados - e uma grande afluência às urnas terá sido um dos maiores desafios, no contexto do Ramadão.
É que estas são as primeiras eleições que ocorrerão durante o Ramadão, no que foi criticado pelo imã de uma mesquita na capital, Dakar, Iman Ndiaye, que defende que o mês sagrado deveria ser respeitado no dia das eleições, porque, será natural que quer no dia das eleições, quer nos dias seguintes, haverá manifestações, passeios e "gritarias" no período diário do Ramadão.
Não esqueçamos que o Senegal é, maioritariamente, um país de confissão muçulmana.
A estas eleições concorreram 19 candidatos distribuídos entre os próximos do cessante presidente Macky Sall (entre 2012 e 2024, que tudo fez para estender a 2025) e os que deste se distanciaram - isto dentro do aparelho governativo - os adversários habituais e os que foram "cooptados" à última hora com o indulto presidencial de Sall, após os distúrbios que ocorreram no período entre a "tentativa" de manutenção de Macky Sall na presidência - com adiamentos das eleições que deveria ter ocorrido mais cedo.
As eleições deveriam ter ocorrido em 25 de Fevereiro, mas Sall tentou adiá-las por 10 meses - deveriam só ocorrer, no mínimo, em Dezembro - no que acabou impedido por decisão do Conselho Constitucional (CC) que determinou a marcação imediata das eleições.
Sobre esta matéria, e para não tornar este texto maçudo proponho-vos que leiam o meu texto «O Senegal confiscado por Macky Sall e o "desimpacto" das iniciativas externas», publicado na edição 825, de 23 de Fevereiro passado, onde faço uma "estoriografia" deste pré-acto eleitoral.
Sabe-se que ao acto, estão registados 19 candidatos que tiveram pouco mais de duas semanas para convencer os mais de 7 milhões de eleitores registados.
Entre os candidatos, há 5 que se destacam, principalmente:
- o candidato do regime, ou seja, escolhido por Sall, o até há pouco primeiro-ministro Amadou Ba, de 62 anos, que abandonou o cargo para fazer campanha para a presidência, sob o lema "Prosperidade Partilhada". De notar que, segundo site "Africa Inteligence", na última semana de campanha, este candidato terá contado com o discreto apoio de comunicadores - assessor, propagandista, marqueteiro, ou como se diz agora "influencers" - franceses e senegaleses, que estariam a ser apoiados pelo "spin doctor" -manipulador de resultados, estatísticas e informações desvirtuadas - israelita Aron Shaviv, fundador e CEO da Vantage Influence, uma empresa de consultoria internacional com sede em Dubai , e antigo comunicador de Benjamin Netanyahu, por sinal muito activo no continente Africano; e
- Bassirou Diomaye Faye, do partido PASTEF que, na sua campanha, prometeu "dar forte luta" nestas eleições. O inspector fiscal de 49 anos era relativamente desconhecido até ser apoiado por Ousmane Sonko, que foi impedido de concorrer devido a uma condenação por difamação, entretanto amnistiado mas já sem condições de poder se candidatar - ainda que o CC tenha determinado que os amnistiado, poderiam fazê-lo -, pelos seguidores de Faye, esperam que o apoio de Sonko seja visto como um sinal de esperança, uma vez que este político da oposição é muito popular entre os mais jovens, frustrados com a falta de emprego. Entretanto, o candidato Cheikh Tidiane Dieye, na última semana de campanha, desistiu a favor de Faye o que permite aumentar as expectativas deste principal candidato oposicionista a uma vitória eleitoral;
- Além do antigo primeiro-ministro Idrissa Seck, que ficou em segundo lugar em 2019; Khalifa Sall, por duas vezes presidente da câmara de Dakar; e a empresária Anta Babacar Ngom, de 40 anos, a única mulher a concorrer ao acto eleitoral.
Sendo que o Senegal, desde a sua independência, em 1960, tem realizado eleições regulares, nunca foi alvo de um golpe de Estado e tem sido visto como um exemplo de democracia e estabilidade na região, apesar da crise política que Sall criou e provocou, é de esperar que, apesar de tudo, as eleições tenham decorrido com um espírito de «um escrutínio pacífico, honesto e transparente» como preconizava, ao site da DW, Djibril Gningue, directo-executivo da "Plataforma da Sociedade Civil para a Transparência das Eleições no Senega"l, no que, citando o site da Rádio France Internationale (RFI), foi secundado por Mamadou Mbodj, coordenador da "Plataforma F24".
No final do dia do acto eleitoral que tudo indicou decorreu normalmente e com boa afluência, há a destacar a menor afluência na região de Ziguinchor, na conturbada área de Casamanse, região fronteiriça a Guiné-Bissau, em particular no período da tarde; nesta região votou aquele que sempre foi considerado o maior opositor das políticas de Sall, Ousmane Sonko, recorde-se apoiante de Faye. Segundo alguns observadores eleitorais, citados pela RFI, esta menor afluência teria sido devido ao facto de o país estar no Ramadão e a área ser muito quente...
De uma coisa os senegaleses manifestam ter uma certeza: o próximo presidente vai ter de reestruturar a vida política interna, melhorar a economia, procurar diminuir o desemprego, em particular o desemprego jovem - um dos maiores problemas por que passam a maioria dos países e políticos do Continente Africano - e tentar que o fluxo migratório seja diminuído.
A estes factos com que se vai debater o novo presidente, há que acrescentar, em termos diplomáticos e securitários, reafirmar a posição do Senegal no concerto regional, em particular no da organização regional CEDEAO, tendo em conta que o Senegal - como já atrás se deixou implícito - continua muito próximo da França e da "france-afrique" e há um crescente mal-estar entre países da CEDEAO, nomeadamente, Burkina Faso, Mali e Níger, que criaram o grupo de Países do Sahel e que desejam sair da CEDEAO, e da República da Guiné - de recordar que Conaky, desde Sékou Touré, se mostrou sempre distanciada de Paris.
Outro facto importante e que não se deve menos graduar, prende-se com Bissau e com o seu presidente Sissoco Embalo, dado que este sempre manteve uma forte proximidade com Sall. As recentes afirmações de Embalo sobre críticos, mostra que pode já estar a começar a sentir que Dakar, independentemente do vencedor, poderá alterar algumas das políticas "demasiado" proteccional e "narcisista" de Macky Sall sobre e relativo a Bissau. Veremos...n
* Investigador do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE-IUL (CEI-IUL) e Investigador-Associado do CINAMIL e Pós-Doutorado da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Agostinho Neto**
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