O Enes e o José são figuras de referência nas suas áreas de estudo. Acompanham, de longe, mas profundamente, a realidade nacional. E as suas opiniões são seguidas com interesse, senão com devoção, por quem as lê. Ou ouve. Mantêm a ligação com o País por via hertziana, ou através das redes sociais. E o País agradece.

O Blaise, a Patrícia e o William conquistam troféus por esse mundo fora. Com outras camisolas, mas com o sangue (senão o cordão enterrado) dos seus ancestrais angolanos. Fazem a sua vida. Conquistam os seus objectivos. E nós alegramo-nos (não sem alguma íntima frustração).

A São conquistou o direito de viver numa capital europeia. E recebe os sobrinhos, a quem propicia condições para ali estudar e, quiçá, serem bons cidadãos desses países que os acolhem. Relutantemente.

O Eduardo escreve livros e ganha prémios. Distribui as costelas por vários continentes. Mas tem opiniões vigorosas sobre o que está bem e o que está mal e exprime-as em controversos artigos que são lidos avidamente, pois o seu estatuto assim obriga.

Os filhos de (quase) todos eles não terão muito contacto com Angola. São cidadãos dos países onde (quase todos) nasceram. Onde os seus pais os criaram. Onde vivem. Alguns tentam restabelecer esses laços ancestrais. Mas raros o conseguem. Os seus amigos não estão aqui. Os cônjuges não se identificam com esta terra, onde a vida é indubitavelmente mais complicada do que nos seus locais de origem, e onde têm, salvo raríssimas e honrosas excepções, muita dificuldade em se estabelecer.

E o País fica mais pobre.

O patriotismo implica identidade. E a identidade é um conceito actual. Em discussão. Porque o radicalismo se tem vindo a alimentar de questões identitárias que descambam em atitudes perniciosas, perigosas mesmo, chegando ao terrorismo. Cidadãos sem norte identificam-se com religiões. Raças. Nações. Orientação sexual. Ou até com clubes de futebol! A redução da nossa identificação identitária a um único critério, cria, amiúde, barreiras quase intransponíveis na comunicação com o outro, tornando-o, num ror de vezes, um inimigo. A quem, nos casos extremos - e parece haver na cabeça dessas pessoas, cheias de certezas, verdades absolutas, uma tendência para soluções últimas - é preciso aniquilar.

Como defende Amartya Sen, se nunca fez sentido essa visão do mundo, que tanta dor trouxe ao longo dos séculos, hoje menos se justifica, pois a globalização deveria aproximar as pessoas. Fazê-las sentirem-se parte de um todo. E, para tal, assumirem as suas múltiplas identidades. E a ter uma, só uma é aceitável: a de se ser cidadão universal.

E como fica o País?

Não sei. Mas gostava que, mesmo sem patriotismos extremos que nos afastem dos outros, fôssemos capazes de construir uma ligação mais forte com ele. Para que dele não desertássemos com tanta facilidade.

Não como o único e exclusivo pedaço do mundo que tem que merecer a nossa atenção. Mas como um pedaço do mundo que precisa da nossa atenção. E essa só produz resultados, se quando saltarmos para este navio, o fizermos de forma decidida. Dando-lhe o melhor de nós para que flutue e singre.

Como se não tivesse botes salva-vidas.