Na visão do velho "guru" de Harvard, ser um verdadeiro amigo dos americanos implica não apenas uma relação de amizade baseada em interesses mútuos, mas igualmente num compromisso genuíno com os valores partilhados pela América como o fortalecimento da democracia, o respeito pelos direitos humanos, entre outros.

O cenário geo-político no mundo é extremamente volátil e está a sofrer mudanças rápidas e imprevisíveis. As implicações das alterações que se produzem nas relações internacionais podem ser multifacetadas e requerem análises que considerem, não apenas as relações bilaterais, mas igualmente os mais amplos contextos regionais e globais.

As interacções entre os diferentes países muitas vezes reflectem uma variedade de considerações estratégicas, económicas, políticas, históricas e culturais. Após um passado de clivagens e de permanentes desencontros , os Estados Unidos da América sob a presidência do democrata Bill Clinton (1993-2001), reconheceram formalmente o Governo angolano em 19 de Maio de 1993, um ano após o termo da guerra civil.

Neste curto apontamento, procurámos abordar alguns dos cuidados que Angola deve observar na gestão da sua política externa, face à expectativa de uma mudança na administração americana, com a eleição de Donald Trump em 5 de Novembro de 2024. Ao contrário de Joe Biden, a Administração Trump durante o exercício do anterior mandato (2017-2021), não incrementou quaisquer programas de relações estratégicas com novos parceiros no continente africano.

Pelo contrário, a presidência Trump foi marcada por um gradual desengajamento americano em relação aos problemas africanos, mantendo apenas como prioridades o combate aos grupos da jihad nos Camarões, no Níger, na Nigéria e o controle da região da Somália. No restantes cenários, observou-se um desligamento quase completo, até ao fim do mandato do presidente, sendo substituído pelo veterano da política americana, o antigo senador democrata Joe Biden.

Em Agosto de 2022, a Administração Biden publicou um documento intitulado "Nova Estrategia Americana para África". O documento trouxe elementos inovadores na política americana em relação ao continente africano, colocando-a nas prioridades globais para os próximos anos. Os seus funcionários e mandatários realizaram inúmeras viagens ao continente, com destaque para os secretários da defesa Loyd Austin e o secretário de Estado, Antony Blinken.

No quadro dessa estratégia, a administração Biden demonstrou um interesse renovado em fortalecer as relações com os países de África, inclusive por meio de compromissos com questões no âmbito da saúde pública, da segurança alimentar e do desenvolvimento económico e da cooperação multilateral. Por essa razão, é relevante considerar as nuances das políticas externas de cada Governo, ao avaliarmos o impacto nas relações entre Angola e os Estados Unidos da América em qualquer cenário.

Ao buscar uma parceria estratégica com os Estados Unidos, Angola procurou diversificar o leque das suas relações internacionais e ampliar opções de cooperação económica, diplomática e de segurança. Isso veio reflectir o reforço de uma política externa focada na redução da dependência de um único parceiro global.
Na actual geo-política mundial, Angola deve adoptar uma abordagem cautelosa e estratégica na gestão da sua política externa. Como foi referido, encontramo-nos perante uma expectativa de mudança na administração americana, especialmente, considerando a possível eleição de Donald Trump. Durante o mandato anterior do republicano, as relações com o continente africano foram marcadas por uma abordagem menos engajada, em comparação com a administração de Joe Biden. Nesse contexto, torna-se crucial que Angola esteja preparada para possíveis mudanças na dinâmica das relações bilaterais com os Estados Unidos.

Diante da perspectiva de uma administração liderada por Donald Trump, ou no caso de Biden ser reeleito para um segundo e último mandato, Angola pode considerar obter melhoramentos em alguns aspectos na gestão da sua política externa, nomeadamente:
i) Manter uma avaliação contínua dos posicionamentos e políticas da administração americana em relação à África e identificar possíveis áreas de interesse mútuo que possam ser exploradas para fortalecer as relações bilaterais. O actual incremento do projecto do "Corredor do Lobito", nas suas variadas vertentes, é uma dessas possibilidades. O projecto tem potencial para impactar positivamente no seio das camadas da população angolana, cujas comunidades se encontram implantadas ao longo do corredor, melhorando as suas condições de vida.
ii) Com a diversificação de outras parcerias internacionais, diante de eventuais desafios resultantes da complexidade das relações com os Estados Unidos, Angola pode e deve buscar continuamente novas parcerias, baseadas na prossecução de interesses comuns e no fortalecimento da Paz mundial, mantendo laços com outras potências regionais e globais, bem como na promoção da cooperação Sul-Sul.
iii) O fortalecimento da integração regional é outra das linhas de força para a sustentabilidade da sua política externa. Angola deve priorizar a promoção de esforços para fortalecer a integração regional e a cooperação intra-africana. Trabalhar continuamente na consolidação de parcerias estratégicas no continente, que possam contribuir para o desenvolvimento económico e político e na promoção da paz, sobretudo na região dos Grandes Lagos e da África Austral.
iv) A manutenção de um diálogo construtivo permanente, independente da orientação da administração americana a sair das eleições de 2024. Angola pode manter um diálogo construtivo com os Estados Unidos e identificar novas áreas de colaboração e interesse comum que possam beneficiar ambas as partes.

A efectivação destes cuidados dependerá, inevitavelmente, das dinâmicas específicas no desenvolvimento das relações bilaterais entre Angola e os Estados Unidos, perante a expectativa da subida de uma administração republicana chefiada por Donald Trump, ou mesmo com a manutenção da actual. Mas, feitas as contas, o importante é que todos os passos a encetar por Angola, deverão estar em conformidade com as estratégias e prioridades do seu Governo, no âmbito das linhas-mestras da política externa angolana, cujo pilar fundamental é o estrito respeito pela soberania nacional.
Ainda assim, pensamos que, mais importante do que um exercício de comparação entre as abordagens das administrações Trump e Biden na relação dos EUA com o continente africano, voltando as premissas de Henry Kissinger, o mais importante é reconhecer que cada Governo tenha suas próprias prioridades e estratégias em matéria de política externa.

A administração Biden, mesmo em fim de mandato, renovou o interesse em fortalecer as relações com a África, inclusive por meio de compromissos com questões do âmbito da saúde pública, da segurança alimentar, do desenvolvimento económico e da cooperação multilateral.
Perante a possibilidade de uma mudança na administração americana com a putativa subida do republicano Donald Trump para a presidência, é relevante considerar as nuances da política externa para avaliarmos o impacto de uma mudança dessa envergadura nas relações entre Angola e os Estados Unidos da América.

Qualquer que seja o cenário depois de 5 de Novembro de 2024 nos EUA, o importante para Angola será a busca permanente do equilíbrio nas relações com os diferentes actores globais, procurando sempre preservar os seus próprios interesses nacionais e regionais.

*Advogado e jornalista