Os murmúrios invadem e sacodem os pensamentos, e a necessidade abraça todos os quereres e desejos.
A verdade feminina é um pouco assim, louca e avassaladora, penetrante e intensa, chama a atenção e tem tanto de desmerecedora como de acolhedora.
Aos 40 anos as cobranças da sociedade chegam como as contas do mês e as promessas não são a ideologia da luz da manhã. Para o meu género, todas as palavras são demasiadas, todo o fardo é negro qual escrita de Basil Davidson, porém a maré também transporta coisas boas numa visão muito individual e até narcisista.
Casamento e filhos não são sinónimos de gracejo e regozijo para todas as mulheres. Nem todas vêem nisso o mais poderoso e maravilhoso dos ditames, assim como uma carreira profissional ou política não é um manto de luxúria para outras.
O que sei é, seja o que se tenha como meta é sempre mais duro e difícil de conquistar quando se é mulher e principalmente acima dos 35 anos.
Não se trata de perpetuar a apologia do pseudovitimismo, mas de confrontar o mundo para o constante desrespeito e violação dos direitos das mulheres que continuam a ser raptadas, encarceradas, espancadas e inferiorizadas, seja com gestos contundentes ou sorrisos de lagarto.
Que bandeira erguer num mundo, onde a sensualidade feminina é a luta mais aplaudida? Onde quem tem voz tem que gritar duas vezes mais alto? Onde quem apresenta os seus ímpetos é criticada? Onde se vendem bonecas de luxo como passagem grátis e conformista para o sucesso?
A essência certa ou errada não deve anular a minha consciência e juventude. E a provar está a minha recente gravidez aos 41 anos, onde tive pessoas a perguntarem-me porquê voltar a ter filhos numa fase mais consoladora da vida, porquê parar tudo e recomeçar já com dois filhos adolescentes?
O meu impulso não é fraco, não é linear e eu não deixo de querer conquistar o mundo.
A minha futurologia sempre foi selectiva, nunca me imaginei para lá da idade que tenho e talvez por isso fui caminhando sem grandes planos. E se nesta fase o meu projecto era voltar a experimentar a maternidade, porque não?
Estou no meu sublime recomeço, paira aqui uma névoa agridoce onde dou por mim a rir e a chorar, a pular de alegria e a bravejar de exaustão. Voltei a apaixonar-me pela vida de modo mais viril e poético, vejo em mim um esboço com requisitos para ser arte, para ser beleza e volúpia.
Dentro de dias faço 42 anos, devo olhar para os limites e barreiras impostos por quem não me reconhece ou ousa conhecer-me?
Não há nada que me faça fechar o livro na minha cabeceira ou apagar a voz que acende a minha madrugada que nem silêncio altivo. Não há estrela maior do que o amor que eu digo que gosto, que eu sinto acender aqui dentro e que vou traçando na minha alma.
Esta imensidão de sentimentos assume tudo quanto me proponho ser de forma desordenada, complexa e sem qualquer queixa, ou não fosse eu uma adepta afã de tudo que me liberta e me envolve.
A chamada da redescoberta e o reconhecimento do meu lugar valorizaram a morada no meu amor-próprio, ergueram o prazer de dizer que estou aqui e estou viva!

*Jornalista