No início de Junho de 2019, e durante um pronunciamento realizado na Cúpula de Juízes Pan-Americanos sobre Direitos Sociais e Doutrina Franciscana, o Papa Francisco disse que tal prática jurídica representava um risco para a democracia dos países: "O Lawfare, além de colocar a democracia dos países em sério risco, geralmente é utilizado para minar os processos políticos emergentes e incentivar a violação sistemática de direitos sociais. Todos estamos familiarizados com o julgamento antecipado pelos media", disse, na altura, Francisco. O pronunciamento ocorreu uma semana após o Papa Francisco ter enviado uma carta em solidariedade a Lula da Silva. Perseguição política por meio da Justiça é o elemento-chave em tudo isso.

O Lawfare tem sido o instrumento de intervenção externa no cenário político de alguns países (Brasil e Argentina são bons exemplos), com a ajuda de operações mediáticas paralelas, permitindo um julgamento antecipado da imprensa, com o objectivo de formar e formatar a opinião pública, criar indignação social e destruição da imagem pública. A prática do Lawfare é inerentemente negativa, é o oposto da busca pela justiça. Na verdade, a estratégia é a apresentação de processos judiciais frívolos e manipulação de processos legais para atacar, intimidar ou frustrar adversários políticos. Usa-se e abusa-se do sistema legal e dos meios de comunicação social para criar a tal indignação social, repulsa e levantar a opinião pública contra os inimigos políticos e económicos declarados ou previamente seleccionados. Usar abusivamente da lei como "arma de guerra" é utilizar (ou abusar) o Direito como substituto dos tradicionais métodos militares para obter sucesso num conflito.
Por exemplo, na guerra, a estratégia de invasão e conquista de território do inimigo é um dos principais eixos da dominação. No Lawfare, a tal conquista de território é substituída pela influência, pela ingerência e por recomendações do poder político e os julgamentos antecipados feitos pela comunicação social. É uma forma de intimidar adversários e de os silenciar politicamente. Como há dias me disse um amigo e professor de Direito: "Estão todos acantonados e com medo de serem presos". Tácticas ou práticas muito comuns no Lawfare começam a ser observadas também com alguma preocupação em Angola: manipulação do sistema legal com aparência de legalidade para fins políticos; abuso do direito para prejudicar ou descredibilizar os adversários; promoção de acções judiciais para desacreditar os adversários; tentativas de influenciar negativamente a opinião pública; a utilização da lei e dos meios legais para obter publicidade negativa, promoção da desilusão e indignação social (nestes casos a comunicação social é orientada, e as milícias digitais prestam um grande apoio); acusação das acções dos adversários políticos como imorais e ilegais. Em nome de uma agenda de moralização do País, de combate à corrupção, ao nepotismo e à impunidade, facilmente o sistema judicial cafricado consegue "legitimidade" para agir "politicamente" sempre estimulado, incentivado ou sob "recomendação" dos poderes políticos vigentes (vide caso do juiz Moro, no Brasil). Começa a aparecer entre nós certo activismo judicial, em que vão surgindo juízes e procuradores superstars, que começam a ganhar gosto pelos holofotes da televisão, pelas primeiras páginas e títulos dos jornais. O poder político vive, convive e alimenta-se do populismo. É uma prática comum e é assim que manipula as massas em busca dos votos que lhes garantem a manutenção no poder. Quando o populismo atinge juízes, procuradores e tribunais, o quadro começa a ficar preocupante, porque potencia o surgimento de um perigoso "populismo judicial", que, muitas vezes, não está ao serviço da Justiça, mas de interesses de políticos ou corporativo.
Surge um sistema judicial cafricado pelo poder político, que se vê agraciado com imóveis ou viaturas de alta cilindrada para agir em conformidade. O Lawfare é uma estratégia eficiente porque também é menos cansativa e dispendiosa.
Desgasta a imagem e arrasa a credibilidade dos adversários. Nada melhor do que aniquilar/travar adversários políticos ou financeiros, usando esta via bastante letal, ainda que tenha um cunho legal e sempre acompanhada de um forte suporte mediático. Quem tem poder político, económico e mediático leva muito mais vantagem neste processo de perseguição política por meio da justiça. É claro que esta estratégia gera frutos, dá resultados em curto-prazo, mas no longo-prazo torna-se insustentável e difícil de manter. Por outro lado, a estratégia é bem-sucedida quando se consegue iludir e manipular a opinião pública. É também desastrosa quando esta mesma opinião pública já se vai apercebendo da jogada e reage mal à manipulação imposta. Aí o cafricador e o "cafricado" levam uma boa bassula popular e levam tempo para recuperar da queda. cafricar a Justiça é uma má opção e nunca foi solução.