Neste caso, não será minha preocupação saber quem serão os vencedores. As eleições não serão gerais, apesar de incluírem as presidenciais, são legislativas e têm de ser vistas como tal. E como tal, não está em causa quem as vencerá: se o MPLA, detentor do poder desde a independência, se a UNITA ou a CASA-CE (as três principais forças políticas da IV Legislatura que terminou no passado dia 15 de Agosto).
Está em causa que o País precisa de uma urgente e significativa mudança na sua gestão legislativa e governativa. Ganhe quem ganhar. Sejam os mesmos, sejam novos!
O País não pode continuar a viver da e na estagnação política, social e económica em que se encontra.
Não basta apresentarem programas apelativos, muito bem elaborados, bem-apresentados, mas que, na realidade e na prática, grande parte do seu conteúdo é pouco menos que nada.
É necessário que os novos legisladores sejam isso mesmo. Legisladores em toda a assunção da palavra e do cargo e que produzam a mudança que tanto é necessária para o País.
E são diversas as mudanças infra-estruturais de que carecemos, independentemente de outras tão necessárias como essas.
A essencial alteração começa pela principal infra-estrutura nacional: Revisão Constitucional. Com a ressalva que esta revisão não terá efeitos sobre os eleitos, mas tem de ser o segundo passo da tal mudança de que o País carece.
Entre as alterações que a Revisão Constitucional terá de produzir, teríamos:
- deliberar sobre a real e efectiva divisão administrativa nacional - evitar (impedir constitucionalmente) "dividir" as províncias conforme os interesses eleitorais, e, sempre que "alguém" o desejasse, teria de ser previamente confirmado por referendo local;
- adoptar uma administração específica sobre a província de Cabinda, um exclave que não deve continuar a ser olhado só como fornecedor dividendos (petróleo, madeiras, minérios) para os cofres de Luanda, mas deve ter uma administração própria como uma província autónoma, na linha, por exemplo das ilhas portuguesas espanholas. Nunca está ou estará em causa a integridade territorial;
- redistribuir melhor o OGE entre os diferentes organismos, com especial destaque para a Educação e Saúde. Não é aceitável, com 20 anos de Paz - efectiva e consolidada, apesar de haver quem por vezes, "faça mexer papéis" de dúvidas, principalmente em períodos eleitorais - que as FAA continuem a ter direito a mais de 1,6% do PIB - reconheça-se que tem vindo a diminuir desde 2016, quando, já inexplicavelmente, recebeu 2,95% do PIB (Index Mundi e The Military Balance, que nos coloca entre os cinco países com maior despesa orçamental para as Forças Armadas, em África), mesmo quando o PIB estava em crescimento negativo;
- promover a eleição de todos os órgãos autárquicos - todos, incluindo governadores provinciais e líderes municipais - independentemente das eleições legislativas e aberto, também, a todos os cidadãos independentes, desde que agrupados em coligações locais;
- distribuição mínima, prevista constitucionalmente, de parte do OGE para as comunidades locais poderem exercer a sua actividade sem interferência política de quem domina o poder nacional; sem que seja colocada em causa a redistribuição geral, normal, prevista para cada província em função de actividades locais de interesse nacional, regional e ou local;
E, finalmente, ainda que, certamente haveria outras mudança necessárias na Constituição, como o fim da Vice-Presidência...
- seja feita a eleição directa e universal para a Presidência da República - pode, e for conveniente, ser em simultâneo com as Legislativas, nada o impede até porque os candidatos podem ser apoiados pelos respectivos partidos candidatos ao Parlamento, ainda que, em situações de impedimento total, seja necessário proceder-se a uma eleição presidencial imediata - que passará a ser o Presidente de todos os angolanos e sem ligação directa ao partido de onde for originário;
- a vice-presidência, figura não-oficial e em substituição, por qualquer ausência do Presidente, devido ao exercício de funções no exterior ou por qualquer eventual incapacidade temporária, - seria detida - sempre - pelo presidente em exercício da Assembleia Nacional;
- alterar a forma de Governo que poderia ser entre um semipresidencialismo muito próximo do francês (apesar de haver um primeiro-ministro, o efectivo líder governativo é o Presidente);
- a Assembleia Nacional dever - tem de - ter capacidade para fazer um controlo efectivo das actividades governativas.
É certo que, para haver estas alterações, nomeadamente constitucionais, mesmo que alguma força política obtenha, nestas eleições - o que seria democraticamente pouco crível - os 2/3 necessários, ou seja, maioria qualificada, para levar por diante estas e outras eventuais alterações, deve ter sempre, mas mesmo sempre, a humildade de obter consensos alargados junto da oposição e ouvir a sociedade civil.
Estas eleições têm de nos trazer mudanças. Não se pode continuar a manter o tipo de actividade política, económica e social - e os cinco últimos anos mostraram-no - bem como a verborreia política sem nexo, por vezes termântica, terciárias e terceirista próprias de indivíduos que, sob capa de defesa política, mais não estão que tentar salvaguardar, unicamente, os seus interesses pessoais.
É altura de todos perceberem que está na hora da mudança. Seja qual for a via...
Temos de olhar o futuro com outros olhos, com outras visões estruturais e mentalidades mais modernos, mais adaptados à realidade actual do sistema internacional.
Tem de haver mudança, também nas políticas públicas e nas relações internacionais. Os dirigentes têm de começar a compreender, e de uma vez, que os interesses políticos e os seus estatutos partidários não podem interferir e muito menos podem sobrepor-se aos interesses nacionais e do Estado.
É bom que os novos dirigentes nacionais - mesmo que alguns sejam repetentes - tenham de inferir, definitivamente, que o País, a Nação e o Estado estão acima dos interesses partidários.
Por isso e para isso, tem de haver mudanças, e o 24 de Agosto terá de ser o primeiro dia dessa mudança.

*Investigador Integrado do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE-IUL (CEI-IUL) e Investigador-Associado do CINAMIL e Pós-Doutorado pela Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Agostinho Neto**
** Todos os textos por mim escritos só me responsabilizam a mim e não às entidades a que estou agregado.