Para quem é obrigado a dobrar a mola de manhã, à tarde e à noite para poder enfrentar as crescentes dificuldades do dia-a-dia, os três primeiros anos de governação de João Lourenço estão muito longe de ser suficientes para a sua reeleição ser vista como uma mera proforma.
Falta continuar a mostrar trabalho para resgatar a confiança perdida. Falta deixar de recorrer à mercantilização de métodos básicos de mobilização que, tendo sido úteis no século XX, estão hoje completamente desajustados, no tempo e no espaço, dos desafios do século XXI.
Falta moldar o cérebro de muitos dos decisores políticos com uma nova visão do activismo, que, não podendo continuar a ser rude, populista e demagógica, é agora chamado a enfrentar as novas dinâmicas de comunicação das sociedades de hoje: as redes sociais.
Falta visão para que ninguém volte a esfregar na cara de quem aspira a continuar a ser poder, borradas como as que esta semana foram expostas em público por alguns motociclistas, que denunciaram o envolvimento de figuras do regime na tentativa de os tratarem como mercadoria partidária.
Falta apresentar resultados para poder ser reeleito. E falta criar condições para ter governabilidade e estabilidade no futuro. É isso que, a partir de agora, o MPLA vai, seguramente, pedir aos cidadãos.
Depois de ter experimentado uma nova vivência política com a liderança de João Lourenço, o MPLA sairá à rua para garantir que, no próximo mandato, fará o que a pandemia e a crise financeira internacional não permitiram que fizesse nos últimos três anos.
Mas, ao optar esta semana por um brutal aumento da quantidade de membros do seu Comité Central, sem que isso garanta melhor qualidade, o MPLA, se calhar, esqueceu-se DE que na Coreia do Norte são 235 e na China apenas 204.
E que essa duplicação da tribo não vai atenuar os sinais de clientelismo e de desgaste perante uma oposição que nunca como agora foi tão ameaçadora.
Ou perante um sistema de "eleição" com o braço no ar, que voltou a dar mostras de que o caciquismo, lá dentro, afinal, continua a ser a arma predilecta para caucionar uma anedota política sem graça em democracia.
Mas, cá fora, longe dos cozinhados internos, apresentando-se com uma nova chaparia, MPLA e UNITA estão agora confrontados com um fenómeno político novo na política angolana.
Um e outro, nos últimos três anos, viram nascer um novo eleitorado que carreiam na alma preocupações, que não podem ser subestimadas por quem quer ficar com as chaves do Palácio.
Desde logo porque o cenário político em que se realizaram as eleições em 2017 e as anteriores é completamente diferente da realidade sociológica em que se realizarão as eleições dentro de nove meses.
É certo que muitos daqueles que se sentem chateados com o MPLA chateados continuarão, mas não deixarão de estar absolutamente convictos de que o seu partido renovará o mandato no próximo pleito.
É certo que a UNITA tem um eleitorado fixo e fiel, que se assemelha a uma seita, mas muitos daqueles que, de um momento para outro, passaram a agarrar-se às suas saias não o fazem por estar convictamente alinhados com os seus valores.
Fazem-no unicamente porque estão cansados do MPLA. E na falta de outro meio, estão apenas a utilizar a UNITA como plataforma política para se posicionarem contra o MPLA, sem estarem necessária e genuinamente comprometidos com a UNITA.
O que este cenário revela é que há agora uma nova franja do eleitorado que, descontente e desesperada, já não olha a meios nem a cor da camisola partidária que possa vestir desde que esta ajude a abrir caminho para atingir os seus anseios.
Se, nas eleições anteriores, as únicas bandeiras que subiam ao mastro eram as do MPLA e da UNITA, agora, alicerçada no poder da cidadania, "a mudança" é a bandeira que, de forma transversal, congrega hoje as aspirações de toda a gente, independentemente das afinidades que possa ter com um e com outro partido.
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