O facto de Joe Biden estar em fim de mandato não diminui a importância desta visita. Há quase 10 anos que um Presidente dos EUA não visitava o continente africano. Em 2015, Obama foi o último, e Donald Trump nunca deu cavaco ao nosso continente. A visita de um Presidente norte-americano a qualquer país e em qualquer condição tem sempre peso, relevância política, histórica e diplomática. É a primeira visita de um Presidente dos EUA a Angola e a uma Nação PALOP (Países africanos de língua portuguesa), uma visita directa para um país do nosso continente e sem aqueles habituais períplos africanos com passagens por alguns Estados. Haviam ocorrido, antes, as visitas ao nosso País do secretário de Estado Antony Blinken, do secretário de Defesa Lloyd Austin e da administradora da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID), Samantha Power.

Tudo isso eram sinais evidentes de um aprofundar de relações e reforço de parcerias, sem esquecermos a audiência que Joe Biden concedeu a João Lourenço na Casa Branca, em finais do ano passado. Nesta audiência, Biden disse aos jornalistas que Angola era o País mais importante em África para os EUA e, se dúvidas existiam, esta visita vem confirmar aquilo que havia afirmado na altura. Também procurou deixar a mensagem aos jornalistas que conhecem bem os dossiers sobre África e Angola, em concreto. Já escrevi noutros editoriais que há muito Joe Biden olha para África e para suas questões concretas, e Angola é uma realidade que conhece e domina desde os tempos em que era senador.

Já em Fevereiro de 1976, o então senador Joe Biden defendia, no Subcomité dos Estados Unidos para África, a necessidade de se iniciarem "tentativas de dialogar directamente com o MPLA". Se João Lourenço vive agora com Joe Biden, esta "Paixão Americana", há quase 50 anos, Joe Biden vive uma "Paixão Angolana".

A viagem do Presidente Biden a Angola é uma mensagem que deixa para vários destinatários. O primeiro é a China, o seu principal rival e concorrente em África. Os EUA querem reduzir, senão mesmo acabar com a presença chinesa na exploração de recursos minerais em Angola, Zâmbia e República Democrática do Congo (RDC). Pretendem criar a primeira rede ferroviária transcontinental de acesso livre a África, que se começa na cidade do Lobito e acaba por ligar o Oceano Atlântico ao Índico, passando pela RDC e pela Zâmbia, sendo que os Chefes de Estado desses dois países poderão estão em Angola durante a visita de Biden e formalização do referido projecto, segundo fontes do NJ.

A China é o maior credor de Angola, foi o país que nos abriu os cordões à bolsa após o período da conquista da paz e da necessidade de reconstrução nacional. A China tem capital e capacidade de investimento, tem muitos projectos em Angola, sendo que é, também, muito paciente. O segundo é a Rússia. Os EUA entram num país onde os russos têm influência desde a Independência Nacional e pretendem reduzi-la. A parceria nas Forças Armadas, com formação e instrução militar, é um sinal inequívoco sobre uma área estratégica que querem dominar. O terceiro destinatário é a África do Sul. Washington não aprecia, nem aprova os posicionamentos de Pretória em relação ao conflito Rússia- Ucrânia. Há, no entendimento dos EUA, certo apoio/favorecimento ou inclinação da África do Sul de Cyril Ramaphosa à Rússia de Vladimir Putin. A África do Sul e a Rússia são parceiros nos BRICS, além da frente judicial que os sul-africanos lideram contra o seu "aliado e parceiro" Israel, por causa do conflito com a Palestina.

Biden vai excluir e penalizar a África do Sul, assim como lhes vai mostrando que, nesta região subsariana, Angola é o seu principal aliado político e económico, o seu principal parceiro estratégico e militar. João Lourenço já adiou, no ano passado, dois convites de Cyril Ramaphosa para visitar aquele país, mas ainda não deu garantias se vai responder positivamente ao terceiro convite para viajar no início de Dezembro próximo. É que, "quando avançar fica difícil, o difícil vai avançando".
Continuo o texto na próxima edição. Até já!