Há um aspecto com o qual tenho a mais absoluta reserva. Como entender que médicos formados com os recursos do Estado estivessem a viver aquele drama por tanto tempo, num quadro onde a província em causa tinha uma gritante falta de pessoal da área nos seus quatro municípios. Não concordo que os médicos, sobretudo os bolseiros, tenham de ser submetidos a concurso público para o seu ingresso na função pública. Se os estudantes são controlados pela entidade do Governo que acompanha a sua formação, no caso o INAGBE, se a sua trajectória académica e aproveitamento são do conhecimento daquela estrutura, como perceber a existência deste entrave para prestarem um serviço de importância vital para a vida das pessoas?

E, depois, deparamo-nos com episódios tristes como aqueles que ocorreram num dos últimos concursos públicos onde médicos em concurso com médias altas não foram admitidos, a favor de outros com notas inferiores. Num país como o nosso, onde a cobertura sanitária à escala nacional é das mais baixas do mundo, onde o número de médicos por habitante está a milhas dos mínimos recomendados pela Organização Mundial da Saúde, é perfeitamente inaceitável a actual política de enquadramento dos médicos no Serviço Nacional de Saúde. Não podemos dar-nos ao luxo de deixar em casa profissionais da saúde quando morrem cidadãos nossos por falta de médicos . É normal esse quadro? Não há como arranjar outros expedientes para enquadrar os médicos que não sejam obrigatoriamente os concursos públicos?

Se há um sector que deve merecer uma visão diferente da actual é, sem margem para dúvidas, o sector da Saúde.

Outra questão de suma importância, no que à gestão dos médicos diz respeito, é a sua transferência para as mais diferentes localidades do País. Se, por uma lado, os médicos colocados nas grandes cidades não enfrentam dificuldades maiores para o exercício da profissão, o mesmo não se pode dizer daqueles que são alocados nas áreas mais recônditas. As condições de trabalho chegam a raiar o descaso absoluto. Chegam a faltar as mais elementares condições para o exercício da profissão. E a agravar o quadro, as condições de habitabilidade dos médicos chegam a ser indigentes e, por força disso, a maioria deixa os seus postos de trabalho, deixando os pacientes à mercê.

Se o propósito do Executivo é levar a saúde para todos os cidadãos, independentemente do seu local de residência, é mister a criação de condições condignas para os médicos nos seus postos de trabalho, habitabilidade aceitável e de incentivos de vária ordem que os convença a exercer a profissão fora das grandes cidades.

Saúda-se a construção de grandes unidades hospitalares, mas afigura-se imperioso apetrechar os centros e postos médicos e o erguer de outros nos mais distintos pontos do País.

O exercício da Medicina, sem desprimor para todas as outras, é das mais nobres, e os seus executores devem merecer a devida atenção por parte de quem de direito.

Senhor Presidente, para os propósitos a que se propõe o seu Executivo para o período 2022/ 2027, a Saúde deve ser encarada com outros olhos.

*Jornalista e Politólogo