Apontando a pandemia da Covid-19 e os conflitos militares, desde logo o mais recente e dos que apresenta maior impacto no mundo, que é a guerra na Ucrânia, como razões cimeiras para os grandes desafios que o mundo vive hoje, e, em especial, África, o Chefe de Estado angolano defendeu, na presença do líder em exercício da União Africana (UA), uma acção continental "coordenada e com políticas bem definidas".
João Lourenço coloca esta exigência no sentido de ajudar a "dinamizar o potencial agrícola disponível" no continente africano, de forma a "suprir o défice de produção alimentar que se vai registando no mundo", especialmente depois de reduzidas que foram as exportações de cereais da Rússia e da Ucrânia, os dois maiores produtores de grãos do mundo, devido ao conflito.
Este apelo e desafio lançado por João Lourenço tem em pano de fundo o alastramento da fome em algumas regiões de África, como o Corno de África, onde milhões de pessoas começam a não ter acesso a alimentos devido à sucessão de crises globais, da pandemia às guerras, admitindo o Secretário-Geral da ONU, António Guterres, que África está perante os efeitos de uma "tempestade perfeita" e em modo de agravamento.
No decurso desta visita, Lourenço voltou a insistir, algo que tem feito noutras ocasiões, na necessidade de uma mudança na arquitectura do Conselho de Segurança da ONU, por não reflectir hoje a realidade global, deixando de fora o continente africano, a América Latina e uma grande parte da Ásia, referindo-se aos lugares cativos nesta órgão de extrema importância no funcionamento das Nações Unidas, onde estão "apenas" garantidos lugares com direito a veto à Rússia, China, França, Reino Unido e EUA, os grandes vencedores da II Guerra Mundial.
E um lugar no Conselho de Segurança par África será a melhor forma de dar voz ao continente, defende o Presidente angolano, é modificar a estrutura actual deste órgão, garantindo que passa a ter uma representação equitativa daquilo que é hoje a Humanidade.
O Presidente angolano não deixou. Igualmente, de enfatizar igualmente a retoma das relações bilaterais com o Senegal, o foco principal desta visita de 72 horas de Macky Sall a Angola, que começou na terça-feira.
Sendo a primeira visita de um Presidente do Senegal a Angola, Macky Sall aproveitou o momento para anunciar a abertura de uma Embaixada em Luanda, confirmando aquilo que João Lourenço, no discurso de recepção, na quarta-feira, definiu como um "momento de viragem nas relações de cooperação e intercâmbio" entre Angola e o Senegal.
O Presidente da República lembrou ainda a "história comum" que junta os "valorosos filhos africanos que inspirados e liderados por António Agostinho Neto e Leopold Sedar Senghor, não pouparam esforços nem sacrifícios na luta que enveredaram" pela "conquista do grande sonho" de liberdade dos povos do Senegal e de Angola e de todo o continente.
E sublinhou a assinatura de vários acordos no âmbito do novo quadro jurídico-diplomático sobre o qual assenta toda a cooperação e intercâmbio entre os dois países, destacando o Acordo Geral de Cooperação Técnica, Científica e Económica, estando já prontos outros instrumentos como o acordo de Supressão de Vistos em Passaportes Diplomáticos, Oficiais e de Serviço, e a criação da Comissão Mista Bilateral.
Lourenço destacou como áreas de especial interesse para a expansão da cooperação bilateral a agricultura, transportes, petróleo e gás, cultura, hotelaria e turismo, finanças, banca e negócios, indústria e comércio e a saúde, considerando que serão "a alavanca impulsionadora do relançamento e dinamização da cooperação económica e do intercâmbio empresarial entre Angola e o Senegal".
Por sua vez, nesta visita a Angola, Macky Sall, em declarações à imprensa, também na quarta-feira, destacou a convergência de ideias para estreitar as relações políticas e diplomáticas e para a intensificação das relações comerciais e de investimento.
Mas foi na condição de líder da UA que Sall foi mais longe ao apontar a sua atenção para a diluição das barreiras fronteiriças, ideológicas ou linguísticas, o que compreende uma alusão à almejada zona de comércio livre continental
E sobre uma possível reformulação do Conselho de Segurança da ONU, Sall, que concorda sem pestanejar com a reivindicação de Lourenço, lembrou, todavia, que quando a actual ONU foi arquitectada, os países africanos era colónias europeias, na sua esmagadora maioria, o que determina a evidência de que o continente não está hoje dignamente representado nesta órgão determinante entre as instituições que regem o mundo.
O Presidente senegalês, Macky Sall, que deixou hoje, 26, manhã cedo, Luanda, rumo a Malabo, na Guiné-Equatorial, onde vai ter lugar, sexta-feira e Sábado, uma Cimeira Extraordinária sobre Terrorismo e Mudanças Inconstitucionais de Governos em África - que é uma iniciativa de João Lourenço -, disse concordar com os argumentos de João Lourenço, considerando que as regras que definem os países, naquele órgão das Nações Unidas, foram estruturadas no cenário em que os países africanos "eram apenas colónias".