João Lourenço destacou com igual crueza a guerra na Ucrânia, reforçando o posicionamento de Angola sobre o conflito que lavra no leste europeu há quase dois anos, desde a invasão da Rússia a 24 de Fevereiro de 2022, sublinhando que "o mundo não pode aceitar que a lei do mais forte prevaleça" sobre a ordem internacional estabelecida.
É, porém, sobre a crise no Médio Oriente que o Chefe de Estado angolano mais se debruça nas palavras que dirigiu, na noite desta terça-feira, 23, ao corpo diplomático acreditado no país, sublinhando que se o "silêncio cúmplice" se mantiver sobre "o massacre de civis na Faixa de Gaza", é certa a crua condenação da História que o futuro trará para toda a comunidade internacional, enfatizando os mais de 25 mil civis mortos, uma grande maioria mulheres e milhares de crianças que, "como sabemos (- enfatizou -), não são terroristas".
"Nunca é demais recordar que, quando na década de quarenta (do século XX) a existência do povo judeu estava ameaçada, compreendendo o seu grande sofrimento e o direito que tinha a um território para habitar, a comunidade internacional foi solidária criando o Estado de Israel. Esta mesma solidariedade deve ser hoje demonstrada para com o povo palestino, porque tem o mesmo direito a um território dentro de um Estado livre e soberano por criar", notou.
Apelou a essa mesma comunidade internacional e, em especial, ao Conselho de Segurança das Nações Unidas, que actue urgentemente "antes que o povo palestino seja completamente exterminado" exigindo "passos concretos para a materialização das suas próprias resoluções, que reflectem a vontade expressa da esmagadora maioria dos seus Estados membros, criando o Estado independente e soberano da Palestina".
No que diz respeito ao longo conflito no leste europeu, João Lourenço defendeu, expondo a posição de Luanda sobre esta guerra da forma mais nítida até agora, que "o mundo não pode aceitar que a lei do mais forte prevaleça sobre a ordem internacional estabelecida, que se rege por princípios aceites por todos os Estados membros das Nações Unidas".
Sem nomear a Rússia mas referindo-se claramente à invasão da Ucrânia em Fevereiro de 2022, o Presidente angolano disse aos membros do corpo diplomático que não pode ser considerado normal a anexação de territórios de outros países "apenas porque se sentem nesse direito e porque são uma potência militar", desdobrando esta perspectiva para todas as circunstâncias semelhantes.
Se essa visão e método prevalecerem, advertiu João Lourenço, "então estaremos a transformar o nosso planeta numa verdadeira selva sem regras e a abrir caminho para o perigo da corrida armamentista à escala global, o que levará necessariamente à redução dos investimentos em infra-estruturas, educação, saúde, habitação e criação de emprego".
O Presidente da República não deixou igualmente de evidenciar o papel estratégico que Angola tem desempenhado na procura de mecanismos para estabilizar o continente africano, e reduzir tensões e acabar com conflitos, deixando claro que Luanda tem como prioridade diplomática "a questão da paz, da estabilidade e da reconciliação nacional em África".
E apontou para destacar as situações na República Democrática do Congo, na República Centro-Africana, em Moçambique e no Sudão, onde Angola promoveu iniciativas voltadas para a resolução dos conflitos que assolam estes países.
"Temos seguido muito de perto a situação no Sudão e no Sahel, sem descurar, naturalmente, os outros que geram igualmente insegurança e afectam, na mesma dimensão, a estabilidade de que África necessita para prosseguir no caminho do desenvolvimento", acrescentou.
Foi ainda destaque nas palavras de João Lourenço, que ainda esta semana recebe em Luanda o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, na fase final do seu périplo por quatro países africanos que começou em Cabo Verde, passou pela Costa do Marfim, está na Nigéria, e chega à capital angolana esta quinta-feira, a sua convicção no progresso da democracia e do Estado de Direito no país (ver links em baixo nesta página).
Este destaque ganha dimensão acrescida porque Angola está já a concluir a sua mudança de agulha geoestratégica para ocidente, mudando a sua bussola dos interesses estratégicos da China e da Rússia para os EUA e aliados ocidentais e no enunciado das prioridades desta visita de Blinken a África o Departamento de Estado destaca a questão dos Direitos Humanos, do Estado de Direito e da democracia.
"É nossa convicção que as conquistas internas alcançadas por Angola no plano material terão uma sustentabilidade mais duradoura e sólida se tudo isto se processar dentro do quadro da construção do Estado Democrático e de Direito", disse.
Notou ainda que foi com esse fim que foram desenvolvidos esforços no sentido de resolver "algumas das grandes preocupações" da Nação, que têm a ver com "a melhoria e consolidação dos direitos, liberdades fundamentais e garantias dos cidadãos, da transparência na governação e proximidade governativa, o combate à corrupção e à impunidade, bem como a necessária independência e harmonia entre os diferentes poderes do Estado".
E concluiu: "Pretendemos dar seguimento às políticas de credibilização das instituições do Estado, realçando a importância do estabelecimento de uma democracia sólida numa nação próspera e preocupada com os principais anseios dos seus cidadãos".