O combate às guerrilhas organizadas que actuam nas regiões fronteiriças da RDC, Ruanda e Uganda, apesar de importante, não é o foco principal do acordo histórico assinado em Agosto em Luanda entre Paul Kagame e Yoweri Musevini, que prevê e aponta para a não-agressão sob todas as formas entre estes dois pequenos mas fundamentais países desta região de África, mas não deixa de ser uma das questões abrangidas no Memorando de Entendimento de Luanda.
Agora, depois de na passada sexta-feira terem sido mortas 14 pessoas num ataque junto à fronteira com a RDC, ainda em território ruandês, com a detenção dos alegados autores dos assassinatos que se identificaram como rebeldes da FDLR, uma das mais antigas e activas guerrilhas a actuar na RDC, este tema do combate aos grupos armados que desestabilizam a região ganha uma dimensão nova porque até aqui as suas acções violentas estavam delimitadas ao interior do Congo Democrático.
As 14 pessoas foram assassinadas numa área próxima da fronteira com a RDC mas ainda em território ruandês.
Apesar de não ser a primeira vez que ataques sucedem nesta geografia, é uma situação rara, envolvendo esta força rebelde, de génese étnica Hutu, que foi criada na década de 1990, no rescaldo do genocídio do Ruanda, onde mais de 800 mil tutsis foram mortos às mãos da maioria Hutu, tendo o território da RDC como sua zona de acção, onde, à força do terror sobre as populações, explora os recursos minerais das províncias do Kivu Norte, Sul e Ituri.
Os cinco detidos faziam parte de um grupo alargado, quase integralmente dizimado pelas forças ruandesas numa acção de perseguição aos guerrilheiros, tendo-os exposto frente aos jornalistas, a quem confessaram pertencer à FDLR.
O "Memo" de Luanda
Os Presidentes do Ruanda, Paul Kagame, e do Uganda, Yoweri Musevini, assinaram, a 21 de Agosto, na capital angolana um Memorando de Entendimento que é um "mapa" para encontrar a paz e a segurança definitivas entre estes dois países mas também para toda a turbulenta Região dos Grandes Lagos, que contou com a participação activa do Presidente angolano, João Lourenço, na sua preparação.
O documento foi assinado por ambos os Presidentes, Kagame e Musevini, sob os auspícios de João Lourenço e de Félix Tshisekedi, Presidente da República Democrática do Congo, tendo assistido à cerimónia que teve lugar em Luanda o Presidente Denis Sessou-Nguesso, do Congo-Brazzaville.
Sobre este acordo agiganta-se a expectativa de ser um ponto final no prolongado cenário de conflito no leste da RDC e entre os dois pequenos, mas estratégicos, países dos Grandes Lagos, o Uganda e o Ruanda, cujas relações se deterioraram bastante nos últimos meses, a ponto de terem surgido acusações mútuas de invasões militares dos respectivos territórios.
A par deste problema localizado entre Ruanda e Uganda, no encontro de Luanda esteve ainda colocada a forte expectativa de se tenha dado início a um processo de limpeza dos grupos que estão por detrás da violência que há décadas perturba o leste do Congo, especialmente as guerrilhas com origem no Uganda, as ADF, e no Ruanda, as FDLR- ou outros grupos sucedâneos, bem como as milícias locais, quase todos criados na década de 1990, no rescaldo do genocídio de mais de 800 mil tutsis no Ruanda pela maioria Hutu.
Antes, em Julho, em Luanda, já os quatro lideres fizeram um esboço do que era pretendido ver consolidado num acordo definitivo entre Kigali e Kampala que, já este ano, chegaram a estar de fronteiras encerradas, num pico de tensão que levou estes dois países para a beira da confrontação militar.
Mas o objectivo é ir mais longe no vasto rasto de violência que abrange os grupos de guerrilha e milícias no leste da RDC, que, segundo vários organismos internacionais, contam com apoios fora das fronteiras do Congo, especialmente dos dois vizinhos mais importantes, o Ruanda e o Uganda, cujos interesses passam, ainda segundo as mesmas fontes, pela exploração dos ricos recursos naturais existentes na parte congolesa, nomeadamente as províncias dos Kivu, Norte e Sul.
O que está em cima da mesa é ainda a extensão destes acordos à criação de condições para o desenvolvimento da região, a integração de todos aqueles que fizeram da participação nas guerrilhas e nos grupos de milícias, como o famigerado M23, em actividades económicas que sejam atractivas, fechar os canais de apoio e financiamento a este grupos e lançar as bases para uma efectiva integração regional, que, por exemplo, do ponto de vista de Angola, tem como ponto central o potencial económico dos seus portos para exportar os recursos naturais legalmente explorados na área, e outras.
Recorde-se que a União Africana, através do seu Conselho de Paz e Segurança (CPS), já anunciou que vai adoptar o resultado da Cimeira de Luanda para a definição das suas decisões e elaboração de políticas sobre a Região dos Grandes Lagos.