A cidade de Mbandaka fica a cerca de 500 quilómetros a norte da capital da RDC, Kinshasa, e a cerca de 800 da fronteira com Angola, mas tem uma ligação fluvial directa entre estes dois pontos, o Rio Congo, cuja intensa utilização pelas populações locais para a sua mobilidade diária é um acrescido factor de risco, especialmente para os milhões de habitantes de Kinshasa, para onde existem, nos dois sentidos, ligações por barco diárias.
Segundo o boletim periódico do Instituto Nacional de Investigação Biomédica (INRC, na sigla em francês) do Congo, os 43 casos positivos e os 18 mortos foram detectados na área de Mbandala, que é considerado neste documento oficial o epicentro da epidemia.
Mas o mesmo boletim identifica cinco localidade tocadas pela febre hemorrágica, todos no Equador: Bikoro, com 14 casos e cinco mortos, Bolomba, oito casos e um morto, Iboko, quatro casos e um morto, Mbandaka, 15 casos e 10 mortos, e Wangata, com dois casos e um morto.
Esta é a 11º epidemia de Ébola registada na RDC, país onde o vírus foi detectado em humanos pela primeira vez, decorria o ano de 1976, e foi declarada quando uma outra, no leste do país, nas províncias de Ituri e Kivu Norte, ainda estava activa - foi declarada extinta em finais de Junho -, sendo uma preocupação extra o facto de a RDC estar igualmente a debater-se com um número elevado de casos da Covid-19, contabilizando até hoje 7.432 casos e 182 mortos.
OMS preocupada
A Organização Mundial de Saúde (OMS) já se pronunciou sobre esta nova epidemia, sublinhando que é uma advertência para o facto de o mundo ter mais com que se preocupar que a Covid-19, sublinhou o seu director-geral, Tedros Adhanom Ghebreyesus.
O Ébola é uma doença hemorrágica que tem nos fluídos corporais a principal via de transmissão, sendo a sua letalidade, dependendo das condições sanitárias das comunidades atingidas, entre os 25% e os 85%, tendo a última, no leste da RDC, chegado aos 60% de mortalidade.
A concentração de pessoas e o deficiente saneamento básico são factores que facilitam a dispersão do vírus, o que em Mbandaka é um risco acrescido porque ambas as situações ocorrem, com muitos milhares de pessoas a viverem em comunidades pobres e degradadas e sem qualquer tipo de saneamento, bem como escassa resposta em unidades de saúde - a fotografia que acompanha esta notícia é de um dos acessos ao Rio Congo na cidade de Mbandaka.
Porém, esta doença já conta com uma vacina considerada eficaz no seu tratamento, embora não a 100%, mantendo-se como um perigo real e grave à saúde pública em África.
A primeira vez que foi detectada, em 1976, na província do Equador, onde esta nova epidemia está a deflagrar agora, os especialistas concluíram que o vírus chegou aos humanos através da carne de animais selvagens consumidos localmente, desde macacos a morcegos, entre outros, tal como se crê ter sido a causa da actual pandemia de Covid-19.
O risco de o Ébola chegar a Angola é real
Com esta nova epidemia localizada em Mbandaka, o risco de Angola, embora não evidente e reduzido, é, no entanto, real, porque esta cidade tem uma ligação directa com a fronteira norte angolana, o Rio Congo, uma espécie de auto-estrada fluvial nesta região de África, onde escasseiam as vias terrestres.
Isso mesmo lembrava em Agosto de 2019 o representante da OMS em Angola, Hernando Agudelo, reconhecendo que o ébola é uma ameaça para o país, depois de ter sido declarada a epidemia no leste da RDC, localizada em torno da cidade de Goma, a capital do Kivu Norte, que fica a cerca de 2.000 quilómetros de Angola e a cerca de mil de Kinshasa, a capital congolesa, que tem o maia directo acesso a Angola.
Neste caso, Mbandaka fica apenas a cerca de 600 quilómetros de Kinshasa e há, segundo informações recolhidas em sites de viagens, dezenas de barcos a fazer o percurso, embora as ligações directas sejam menos frequentes, embora existam várias por semana.
Nessa altura, como o Novo Jornal noticiava, Hernando Agudelo lembrou que, desde que o surto chegou à província do Goma, região com ligação directa com a cidade de Kinshasa, capital da RDC, que partilha a fronteira com Angola, a preocupação deveria ser maior.
O responsável confirmou, em declarações à imprensa, que embora esteja no nível dois em termos de territórios em risco, que partilham fronteira com a República Democrática do Congo, Angola deve ter capacidade de reacção rápida diante de um caso suspeito de ébola, uma vez que as medidas exigem supervisão e simulações, para garantir uma preparação adequada.
Segundo o representante da OMS em Angola, nas províncias que fazem fronteira com a RDC - Zaire, Uíge, Lundas Norte e Sul e Moxico - havia, na altura, há cerca de um ano, várias equipas de efectivos das Forças Armadas e da polícia fronteiriça a receber treino com o apoio da OMS, para aprenderem a lidar com o surto e passar os ensinamentos à população, pois, segundo o responsável, "é fundamental, em caso de diagnóstico, a população saber os procedimentos respeitantes à prevenção e ao manuseamento do risco clínico, nomeadamente no contacto com doentes e cadáveres, porque "a doença é altamente transmissível".