"A situação é desoladora para os criadores locais que têm o gado como fonte de rendimento", disse ao NJOnline, Virgílio Tyova.
O governante, aproveitando a sua presença em Luanda ara participar na VII Reunião Ordinária do Comité Central do MPLA, na sexta-feira, acrescentou que a estiagem é a grande preocupação de todos no Cunene, e já gerou igualmente a preocupação do Executivo de João Lourenço..
Segundo Virgílio Tyova, o Presidente da República está "muito preocupado" com a situação do sul de Angola em particular a província do Cunene, "e Já estão equipas no terreno a trabalhar para aliviar a situação aflitiva que as populações atravessam".
O também primeiro secretário do MPLA no Cunene, sublinhou a importância que tem o facto de o CC do MPLA ter debatido as estratégias para enfrentar o problema da seca no sul do País que nos próximos tempos serão implementadas para se evitar catástrofes.
"Existem muitas localidades rurais que neste momento estão a beneficiar de água por cisternas que são atribuídas diariamente através do Serviço de Protecção Civil e Bombeiros e das administrações municipais", informou.
Apontou os municípios do Curoca, Cahama, Ombadja, principalmente nas localidades de Omahenge ya Shikungo, Omahenge ya Shivulo e Mucupe, e as comunas do Evale, Anhanca, Nehone, Oshimulo, Cuanhama e do Namacunde como as mais afectadas pelo fenómeno da seca.
"É muito difícil ver criadores de gado a perderem os seus animais diariamente", lamentou o governador, salientando que a seca no Cunene é um problema cíclico, cuja solução definitiva, passa pela construção de canais abertos junto dos rios que circundam a província, de modo a que as populações nas zonas rurais deixem de depender unicamente das chuvas para a agricultura, consumo humano e para os animais.
De acordo com Virgílio Tyova, devido a escassez das chuvas, no Cunene, homens e animais partilham o mesmo bebedouro com vários riscos para a saúde.
Problema repete-se no Kuando Kubango
Os municípios da província do Kuando Kubango, na região de fronteira com a Namíbia, nomeadamente Cuangar, Calai e Dirico estão igualmente a enfrentar graves problemas de estiagem, disse ao NJOnline, o governador do Kuando Kubango, Pedro Mutindi.
"Estamos preocupados com a situação. Por isso, estamos a mobilizar bens alimentares para apoiar as populações afectadas e ultrapassar, assim, a situação de penúria alimentar", informou reconhecendo que a seca agrava o problema da desnutrição na província.
"Grandes áreas da nossa província debatem-se com uma seca recorde. Muito gado morre, não há pasto. A seca no Kuando Kubango tem consequências devastadoras", lamentou.
Pedro Mutinde lembra que nalgumas regiões atingidas pela seca, as águas subterrâneas são as principais fontes de abastecimento para as populações e o gado, mas com a falta de chuva até essas já secaram ou estão a secar por completo.
Barragens contra a seca
O Governo vai construir barragens nas províncias do sul de Angola que estão entre as mais ameaçadas e afectadas pela seca que há vários anos se instalou em grande parte da África Austral devido às alterações climáticas.
Há anos que se repetem os avisos para a urgência de medidas atenuadoras para as catástrofes anunciadas e, por causa dos já sobejamente conhecidos fenómenos La Niña e El Niño, o futuro adivinha-se ainda mais árido com intervalos de intensas e devastadoras cheias.
O Namibe, o Cunene, o Kuando Kubango e a Huíla estão na linha da frente do impacto das alterações climáticas que nos últimos anos provocaram a mais grave e extensa seca em 35 anos na África Austral, resultando em mais de 700 mil pessoas, das quais cerca de 400 mil crianças, em risco, como ainda em Janeiro alertava o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação das Emergências Humanitárias (UNOCHA).
Para responder a esta realidade, e depois de, em 2017, a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), através do seu Departamento de Alimentação, Agricultura e Recursos Naturais, ter pedido aos estados-membros em risco que tomassem medidas, como a construção de represas e sistemas de armazenamento de alimentos para responder a situações de maior aperto, o Governo angolano acaba de anunciar que vai dar início a um programa de construção de barragens com esse propósito.
O ministro da Energia e Água, João Baptista Borges, anunciou que vão ser construídas duas barragens na província do Cunene, na região do Cuvelai, a mais severamente atingida pelos efeitos das alterações climáticas, seja por secas intensas ou por cheias devastadoras.
O objectivo prioritário destas represas é o armazenamento de água para os animais e para as pessoas mas podem ser ainda fontes abastecedoras de água para irrigação de campos agrícolas.
O concurso para a sua construção, adiantou Baptista Borges, será lançado nos próximos dias, estando ainda contemplado neste programa de resposta à calamidade cíclica que atinge esta região angolana, a construção de um sistema de transporte de água de zonas mais húmidas para as de maior exposição à seca.
"São soluções de engenharia que passam pela transferência de caudais de zonas com alguma abundância para zonas mais secas", explicou o ministro.
O Cunene, recorde-se, está oficialmente em situação de calamidade devido à seca e as autoridades locais e a sociedade civil tem insistido junto do Governo de Luanda para a urgência de medidas atenuadoras da situação de catástrofe natural.
Uma situação que estava prevista
O aviso já tinha sido feito em meados de 2018 pela Organização Meteorológica Mundial e pelo Departamento de Alimentação, Agricultura e Recursos Naturais da SADC: A África Austral iria atravessar, de novo, dificuldades com a falta de chuva e o sul de Angola estava no mapa das preocupações.
As províncias do sul de Angola vivem há anos em permanente escassez de chuva, com mais de 700 mil pessoas, incluindo cerca de 400 mil crianças, em risco e a precisar de assistência permanente, como as agências das Nações Unidas têm sublinhado em repetidos relatórios e como o NJOnline tem noticiado.
Segundo um relatório recente da UNOCHA, o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação das Emergências Humanitárias, entre Outubro de 2018 e meados de Janeiro deste ano, as chuvas ficaram "muito abaixo do que é normal" em vastas áreas de Angola, Zâmbia, Zimbabué, norte da Namíbia, sul de Moçambique - a actual tragédia nas províncias de Sofala e Manica em nada servem para negar esta realidade - e ainda no Botsuana, Madagáscar e na África do Sul.
Estes países, onde se juntam ainda o Lesoto e a Tanzânia, receberam, em média, nas regiões afectadas, menos de 75 por cento do que é normal em matéria de pluviosidade, apesar de algumas melhorias na parte final de Dezembro e princípio deste ano, sendo que algumas áreas foram assoladas por intensas chuvas, sendo que também esta situação é considerada pelos especialistas como anormal, causando mesmo inundações em países como o Malawi ou no norte de Moçambique.
Ainda de acordo com a informação distribuída pelo UNOCHA, Angola, que está este ano a registar uma pluviosidade abaixo do normal em todo o território, provocando atrasos nas culturas que podem criar problemas em várias províncias no que diz respeito à segurança alimentar das populações, no sul registou uma acrescida preocupação devido ao acumular da falta de chuva com temperaturas bastante acima do normal, especialmente entre Outubro e Dezembro de 2018, o que provocou a destruição de algumas culturas essenciais, como o milho, entre outras.
O gado, essencial para as populações das províncias mais a sul em Angola, está igualmente a ser severamente fustigado pela falta de chuva e, por essa razão, pela escassez de alimento natural.
A este cenário, junta-se a possibilidade de as chuvas permanecerem escassas, segundo as previsões meteorológicas, e ainda a permanência de temperaturas anormalmente elevadas, pelo menos até ao mês de Março, o que poderá aumentar de forma significativa o stresse das culturas e, em algumas regiões, colocando mesmo em causa as colheitas.
Resposta no sul de Angola
Para analisar o problema que se vive no sul de Angola, uma missão governamental liderada pelo ministro da Administração do Território e Reforma do Estado, Adão de Almeida, esteve em Janeiro no Cunene, devendo ser criado um grupo de trabalho para propor soluçõe salargadas para este problema que tem evoluído para a condições de crónico e de cujo trabalho resultou o anúncio agora feito de construção de represas na área do Cuvelai.
Adão de Almeida, após essa visita, fez saber que o Presidente João Lourenço está preocupado com este problema e que este já disse que vai criar condições para que sejam implementadas "algumas soluções rápidas" enquanto são preparadas respostas de maior envergadura e sustentáveis para que no futuro a seca seja menos dramática.
Para além do Cunene, também o Namibe, a Huíla e o Kuando Kubango, sofrem ciclicamente com a falta de chuva, que afecta a vida a mais de 700 mil pessoas, incluindo 400 mil crianças, que, nalguns casos, impõem a intervenção de emergência, tanto das unidades sanitárias nacionais como das agências da ONU.
A abertura de pontos de água, poços artificiais, a reparação de equipamentos de extracção de água, e a criação de postos médicos nas áreas afectadas mais deslocadas, são algumas das medidas criadas nos últimos anos para combater a falta de chuvas e as suas consequências.
A falta de chuva no sul de Angola, tal como quase em todos os países da África Austral, resulta do impacto de fenómenos meteorológicos bem conhecidos, como El Niño e La Niña, cujas causas são igualmente bem conhecidas: as alterações climáticas provocadas pela emissão de gases poluentes, na maior parte pela queima de combustíveis fósseis (hidrocarbonetos).
La Niña e El Niño
O fenómeno meteorológico que ajudou a que a África Austral, nos últimos anos, sofresse uma das mais severas secas do último século, com o sul de Angola claramente no mapa das zonas afectadas, já estava anunciado desde meados de 2018, pela Organização Meteorológica Mundial (OMM).
A OMM, agência da ONU para as questões meteorológicas, criada em 1950 e que reúne alguns dos mais respeitados meteorologistas dos 191 países que a compõem, analisou os dados actuais do clima planetário e concluiu existir uma probabilidade de 70 por cento para que as consequências do El Niño se voltassem a fazer sentir a partir de finais de 2018 e nos primeiros meses deste ano
O El Niño é resultado do aquecimento das águas do Oceano Pacífico que, por sua vez, geram correntes quentes que se dirigem para vários pontos do globo, alterando a direcção dos ventos e gerando, na sua passagem, fenómenos localizados de intensas secas, como é, usualmente, o caso da África Austral, mas também de chuvas intensas, com cheias e tempestades destruidoras.
Em alguns países do sul do continente africano, este fenómeno meteorológico produziu uma das mais dramáticas secas em mais de um século, como é o caso da África do Sul, com a destruição da agricultura local, a falta de água em cidades como Cape Town, mas também nos vizinhos Namíbia, Botsuana, Moçambique e no sul de Angola, obrigando os governos respectivos a criar programas de ajuda extraordinários ou a declarar o estado de emergência.
No sul de Angola, como o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação dos Assuntos Humanitários, também por causa das alterações climáticas e, muto em especial, do El Niño, tem divulgado, existem mais de 750 mil pessoas com carências alimentares, de água potável ou por causa de doenças favorecidas por situações de penúria, com cerca de 400 mil crianças a necessitar de ajuda permanente, incluindo dezenas de milhar em situação de emergência.
Apesar de nos últimos meses a situação ter melhorado em toda a extensão sul do continente africano, de acordo com o mais recente estudo da OMM, a partir de Outubro estava previsto um agravamento da situação.
Recorde-se que entre 2015 e 2016 o mundo assistiu a uma das mais intensas e impactantes "viagens" do El Niño, produzindo catástrofes em série, sejam secas no continente africano, sejam tempestades em algumas regiões da Ásia e das Américas.
Segundo referia Petteri Taalas, secretário-geral da OMM, em Setembro do ano passado, este regresso do El Niño não deverá ser de intensidade semelhante ao que ocorreu há três anos, mas "ainda assim irá provocar um impacto considerável".
Este responsável adiantou, citado pelas agências, que as alterações climáticas como um todo estão a provocar alterações ao comportamento do El Niño, mas também no fenómeno "primo" denominado La Niña, cujas dinâmicas são agora mais imprevisíveis e, nesse seguimento, também os seus resultados e impactos nas vidas das pessoas.
O La Niña opõe-se ao El Niño pela forma como evolui, resultando, não do aumento mas sim da diminuição da temperatura das águas do Pacífico, provocando, todavia, alterações em todo o mundo igualmente graves, nomeadamente nos padrões da pluviosidade e na temperatura de vastas áreas do planeta e que, segundo a OMM já está a suceder este ano.
Um dos riscos das alterações climáticas continuarem sem travão, por causa da poluição, nomeadamente dos gases com efeito de estufa e da queima de hidrocarbonetos (petróleo e gás), é que tanto o La Niña como El Niño deixem de ser fenómenos sazonais para emergirem como situações permanentes, com consequências catastróficas para a humanidade.
SADC lança alertou e pediu decisões rápidas e eficazes
Face a estes riscos, recorde-se, e no que mais importa especificamente para Angola, a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral, através do seu Departamento de Alimentação, Agricultura e Recursos Naturais, lançou, também em meados do ano passado, um alerta onde pedia aos países membros para providenciarem no sentido de criar stocks alimentares para ocorrer a emergências criadas pela estiagem na estão das chuvas que se aproxima, e por causa dos esperados efeitos na produção agrícola.
Domingos Gove, o moçambicano que dirige este departamento da SADC, (FANR, na sigla em inglês) desde Abril de 2018, tinha mesmo advertido, numa conferência de imprensa em Windoek, capital da Namíbia, em Agosto desse ano, que a próxima estação das chuvas (a que estamos a viver actualmente) deverá ser, mais uma vez, escassa para as necessidades agrícolas.
A África Austral vive há vários anos uma situação de prolongada seca, com picos de seca extrema em vários países, onde, por exemplo, na Namíbia ou na África do Sul, levou os respectivos governos a tomarem medidas extremas para controlar os efeitos nefastos da falta de chuva, declarando situações de calamidade e impondo regras restritivas ao consumo de água.
Por isso, Domingos Gove, em Agosto do ano passado, apelava aos agricultores da África Austral para que procurassem encontrar forma de manter em stock parte das colheitas da última campanha agrícola, não vendendo a sua produção, como forma de fazer frente às dificuldades que se avizinham, perspectivadas pelas análises dos especialistas à evolução do La Niña e do El Niño