O Índice Global da Fome (IGF) 2022 expõe uma escala de gravidade da fome que inclui os níveis "baixo, moderado, grave, alarmante e extremamente alarmante". Segundo o relatório, "a fome elevada persiste em demasiadas regiões", com os níveis de população que se encontram subnutridos a aumentar e sem previsões de qualquer melhoria até 2030, o que põe em causa as metas definidas na chamada Agenda 2030 (delineada pela ONU e constituída por 17 grandes objectivos de desenvolvimento sustentável).
O Índice Global da Fome 2022 reflecte, segundo os especialistas que realizaram o relatório, "tanto o escândalo da fome alarmante em muitos países, quanto a trajetória de mudança em países onde décadas de progresso no combate à fome estão a ser destruídos".
No relatório do IGF 2022 lê-se que a fome foi agravada pelas últimas crises e pelas actualmente em curso, como o impacto da pandemia de covid-19, a guerra na Ucrânia e as alterações climáticas, "todas elas poderosas potenciadoras de fome"
O Sul da Ásia, segundo o documento, é a região com os valores mais elevados, sendo a África subsaariana a segunda região com os níveis de fome mais graves, com a subalimentação e a taxa de mortalidade infantil "mais altas do que qualquer outra região do mundo".
Os valores de regiões como a África oriental, a Ásia ocidental e o norte de África também são "preocupantes".
No documento, o IGF revela que "a percentagem de pessoas sem acesso regular a calorias suficientes está a aumentar", em relação aos "cerca de 828 milhões de pessoas subalimentadas em 2021, o que representa uma inversão de mais de uma década de progresso no combate à fome", devido a "uma onda de crises".
"A guerra na Ucrânia veio aumentar ainda mais os preços globais dos alimentos, de combustíveis e fertilizantes e tem o potencial de agravar ainda mais a fome em 2023 e nos anos seguintes", lê-se no relatório, que observa que "estas crises vêm juntar-se a factores subjacentes, tais como pobreza, desigualdade, governação inadequada, fracas infra-estruturas e baixa produtividade agrícola, que contribuem para a fome e vulnerabilidade crónicas".
"A nível mundial e em muitos países e regiões, os actuais sistemas alimentares são inadequados para enfrentar estes desafios e acabar com a fome", afirmam os especialistas que elaboraram o documento, defendendo que, "sem uma mudança significativa, existe um potencial de agravamento da situação já em 2023".
Os especialistas alertam para o facto de cinco países do mundo num nível alarmante - quatro deles africanos e o Iémen, um país em guerra civil desde 2014, que provocou, segundo a ONU, "a pior crise humanitária do mundo" e que, em Outubro de 2020, a edição anual do IGF incluía já entre os países com níveis de fome alarmantes.
Além disso, o IGF coloca quatro países num nível provisoriamente alarmante - mais três países africanos e a Síria, também palco de uma guerra civil desde 2011 - e 35 países num nível grave de fome (a maioria dos quais também africanos, além de Timor-Leste, Haiti, Índia e Paquistão, Papua-Nova Guiné, Coreia do Norte e Afeganistão, onde os talibãs retomaram o poder há pouco mais de um ano e que enfrenta uma grave crise económica).
As possíveis soluções indicadas no relatório passam pela transformação dos sistemas alimentares, bem como pela importância do papel que os Governos locais desempenham nestas regiões.
"Num sistema alimentar global que ficou aquém do fim sustentável da fome, é importante olhar para a governação dos sistemas alimentares a nível local, onde os cidadãos estão a encontrar formas inovadoras de responsabilizar os decisores pela resolução do problema da insegurança alimentar e nutricional", refere uma das especialistas, Danielle Resnick, num ensaio incluído no relatório do IGF deste ano.
"Embora a transformação dos sistemas alimentares demande, em última análise, intervenções a múltiplos níveis, justifica-se uma maior concentração na governação local dos sistemas alimentares", porque "as práticas de gestão dos recursos naturais, os métodos agrícolas e pecuários e as preferências alimentares assentam frequentemente nas tradições culturais locais, experiências históricas, e condições agro-ecológicas", defende Resnick.
O Sul asiático é também a região com maior taxa de atraso no crescimento infantil (raquitismo) e, "de longe, a maior taxa de emaciação infantil do que qualquer outra região do mundo".
A emaciação infantil (percentagem de crianças com menos de cinco anos com baixo peso para a sua altura, o que é reflexo de subnutrição aguda), a subalimentação, o atraso no crescimento infantil (que reflecte subnutrição crónica) e a taxa de mortalidade infantil de crianças com menos de cinco anos, são os quatro indicadores em que se apoia o relatório "para medir e acompanhar de forma abrangente a fome a nível global, regional e nacional ao longo dos últimos anos e décadas".