Menos audível e menos visível do que João Lourenço durante a campanha eleitoral, centrada na figura do hoje Presidente da República, o vice Bornito de Sousa deverá ganhar maior protagonismo com a entrada em funções do novo Executivo, ontem empossado.
Enquanto isso não acontece, recuperamos as ideias transmitidas pelo número dois do Estado angolano sobre aquela que tem sido apontada como uma das prioridades da governação para os próximos cinco anos: a luta contra a corrupção.
Se para João Lourenço, o problema não está na corrupção em si - visto tratar-se de um fenómeno que afecta todas as sociedades -, mas na "forma como encaramos a corrupção e como a combatemos, porque não podemos aceitar a impunidade perante a corrupção", para Bornito de Sousa a discussão sobre o tema faz-se muitas vezes de forma infundada.
"O que tem ocorrido é que a oposição aponta sobretudo um conjunto de situações que não configuram casos de corrupção comprovados. Por exemplo, ser titular ou accionista de uma ou várias empresas não é corrupção. Ser titular de bens, em si, não é corrupção", apontava o governante em 2012, em entrevista ao Novo Jornal.
Na altura ministro da Administração do Território, pasta que assumiu até à sua indicação para a vice-Presidência, Bornito considerava que o foco da discussão na alegada riqueza dos governantes foi a única forma que os adversários do partido no poder encontraram "para tentar minimizar o efeito demolidor da quantidade de obras que o Governo do Presidente Dos Santos e do MPLA fizeram ao longo dos recentes anos, um pouco por todos os cantos de Angola".
Referindo-se directamente aos líderes da UNITA e da CASA-CE, respectivamente Isaías Samakuva e Abel Chivukuvuku, o hoje número dois do Estado angolano comentou a publicação da declaração de bens rendimentos pelo primeiro e questionou o património do segundo.
"Claro que Samakuva publicou a sua declaração de bens e rendimentos que afirma que é titular de uns tostões em bancos. Isso não lhe dá prestígio, como pensa. A imagem que passou é que ou está a esconder muita coisa ou levaria Angola à falência", considerou Bornito, acrescentando que "o indivíduo que nem sequer consegue gerir a vida privada e familiar, não pode gerir um País inteiro".
Já sobre o líder da CASA-CE, na altura uma formação recém-nascida, o hoje vice-Presidente lamentou que apelidasse "toda a gente de "gatunos"", quando ele próprio é titular de bens, "dentre os quais se fala de um edifício de vários andares", em Luanda.
"Seguindo então a sua própria lógica: Abel nasceu já com esses bens ou é igualmente um "gatuno"?", interrogava.
O exemplo dos filhos de José Eduardo dos Santos
Bornito de Sousa contestava igualmente os ataques constantes aos filhos de José Eduardo dos Santos.
"Se é verdade que a sua situação pode favorecer o acesso a bens e negócios, também é verdade que com o recurso a parceiros estratégicos e ao crédito bancário é hoje possível fazer negócios", lembrava Bornito de Sousa, para quem os herdeiros do agora ex-Chefe de Estado têm o seu mérito.
"É também verdade que é preferível e exemplar que os filhos do Presidente Dos Santos se tenham todos formado e tenham uma postura séria perante a vida em vez de uma vida frustrada como o "revolucionário" Luaty Matafrakus [Luaty Beirão], que cresceu junto dos filhos do Presidente e a quem não terão faltado oportunidades, tendo optado por ser hoje o profeta da inveja e da anarquia".
O então ministro sublinhava que não pretendia afirmar que não existam casos de corrupção que urge atacar, salientando que "um conjunto de instituições e de legislação tem estado a ser posto em acção para contrariar esse fenómeno negativo".
"É ainda de acentuar que a contratação da empresa de auditoria internacional ERNEST & YOUNG para a reorganização das Finanças Públicas e para tornar ainda mais transparentes as operações do Estado só pode vir do gesto de quem nada tem a esconder", reforçou.
Na entrevista, o governante considerou também que os buracos nas obras públicas são uma realidade em todos os países do mundo. "Basta ver que a crise económica e financeira mundial teve origem nos países que se diziam mais apurados em termos de regulamentação e transparência da gestão pública e privada", defendia Bornito, reafirmando, porém, os esforços do MPLA em combater este fenómeno.
"O MPLA e o seu Governo não devem fechar os ouvidos nem os olhos às denúncias legítimas de irregularidades ou insuficiências na gestão da "coisa pública", e devem estar permanentemente atentos aos anseios e aspirações das populações, das famílias e dos cidadãos, em particular os mais jovens e os mais vulneráveis e desprotegidos", apontava o hoje número dois do Estado angolano.