Enquadradas na divulgação de motivos africanos, os visitantes do pavilhão de Angola,a na Expo Milão tiveram a oportunidade de conhecer um pouco mais de África, tendo Angola como epicentro. A gastronomia, a moda, a música e a dança lideraram as celebrações alusivas ao continente. A ocasião foi também escolhida para o lançamento da obra reeditada de Óscar Ribas, 'Alimentação regional Angolana'.

Ainda neste corredor de apresentações, esteve a estilista Nadir Tati que, com uma selecção apropriada da suas colecções africanas, não deixou de surpreender pela positiva. Noutro ângulo, o Ballet Folclórico do Amazonas apresentou como proposta um espectáculo denominado 'Herança Africana' que começa com uma apresentação que mostra ritos tribais da região como a "pajelança".

A referida peça estará em exibição num dos pavilhões nos dias 2, 4 e 6 de Junho, sob a coordenação do maestro e director dos Corpos Artísticos da Secretaria de Estado de Cultura do Amazonas, Marcelo de Jesus. Assim, as danças e manifestações folclóricas oriundas dessa miscigenação entre negros e índios serão exibidas na segunda parte do espectáculo, tais como a capoeira, o samba de roda, o maçariquinho, o lundu, o gambá e a dança do rapachão.

A data que assinala o dia do nosso continente, 25 de Maio, foi escolhida para a abertura da 'Africa Africans', maior exposição sobre arte contemporânea africana já realizada no Brasil. A mostra fica em cartaz no Museu Afro-Brasil, no Parque do Ibirapuera, em São Paulo, até 30 de Agosto. A referida exposição reúne cerca de 100 obras, de mais de 20 artistas, em diversos suportes e linguagens.

A exposição tem como foco a criação de artistas africanos, nascidos e residentes no continente ou fora dele, assim como artistas de origem africana que, mesmo tendo nascido fora de África, dialogam com a pluralidade de experiências estéticas e sociais presentes nas diversas regiões do continente. Uma das obras de maior destaque da exposição é a 'The British Library', do artista plástico nigeriano- britânico Yinka Shonibare.

A instalação é formada por mais de seis mil livros coloridos, encapados por tecidos dutch wax, conhecidos como tecidos africanos, mas fabricados na Holanda, com uso de técnicas inspiradas na arte milenar do batik. Shonibare debate nesta obra questões como colonialismo, pós-colonialismo e hibridismo e explora o impacto da imigração sobre todos os aspectos da cultura britânica, considerando as noções de território e lugar, identidade cultural, deslocamento e refúgio.

Outro nome que chama a atenção é El Anatsui, ganês radicado na Nigéria e considerado o mais importante artista africano da atualidade. As suas criações fazem parte das colecções públicas do Metropolitan Museum of Art, em Nova Iorque e alguns outros museus. O criador está presente na mostrapaulistana por meio da escultura 'Skylines', de 2008. A primeira etápa do projecto 'Africa Africans' aconteceu em Abril, durante o São Paulo Fashion Week, Verão 2016.

Esta acontece ao mesmo tempo em que cinco estilistas africanos apresentaram seus trabalhos num desfile realizado no Museu Afro-Brasil. Palesa Mokubung da África do Sul, Amaka 'Maki' Osakwe da Nigéria, Jamil Walji do Quênia, Xuly Bët do Mali e Imane Ayissi dos Camarões. Segundo a crítica, a iniciativa foi uma excelente oportunidade de conhecer, sem estereótipos, a visão e a produção de moda de um continente com referências tão fortes e inspiradoras.

A MÍSTICA DA ARTE NO CONTEXTO ALÉM-FRONTEIRAS

A arte africana é constituída por um conjunto de manifestações artísticas produzidas pelos povos da África subsaariana ao longo da história. O continente africano acolhe uma grande variedade de culturas, caracterizadas cada uma delas por um idioma próprio, tradições e formas artísticas características. O deserto do Saara continua a actuar como uma barreira natural entre o norte da África e o resto do continente.

Os registos históricos e artísticos demonstram indícios que confirmam uma série de influências entre as duas zonas. Estas trocas culturais foram facilitadas pelas rotas de comércio que atravessam a África desde a antiguidade. Pesquisas arqueológicas demonstram uma forte influência cultural e artística do Egipto Antigo nas civilizações africanas do sul do Saara. A história da arte africana remonta o período pré-histórico.

As formas artísticas mais antigas são as pinturas e gravações em pedra de Tassili e Ennedi, na região do Saara,6000 AC ao século I da nossa era. Outros exemplos da arte primitiva africana são as esculturas modeladas em argila dos artistas da cultura Nok,norte da Nigéria, feitas entre 500 a.c. e 200 d.c.

Destacam- se também os trabalhos decorativos de bronze de Igbo-Ukwu (séculos IX e X) e as magníficas esculturas em bronze e terracota de Ifé (do século XII al XV). Estas últimas mostram a habilidade técnica e estão representadas de forma tão naturalista que, até pouco tempo atrás, se acreditava ter inspirações na arte da Grécia Antiga.

Os povos africanos faziam os seus objectos de arte utilizando diversos elementos da natureza. Esculturas de marfim, máscaras entalhadas em madeira e ornamentos em ouro e bronze. Os temas retratados nas obras de arte remetem para o quotidiano, a religião e os aspectos naturais da região. Desta forma, esculpiam e pintavam mitos, animais da floresta, cenas das tradições, personagens do dia a dia, etc.

A arte africana chegou ao Brasil através dos escravos, que foram trazidos para lá pelos portugueses, durante os períodos colonial e imperial. Em muitos casos, os elementos artísticos africanos fundiram-se com os indígenas e portugueses, para gerar novos componentes artísticos de uma magnifíca arte afro-brasileira.

Dados recolhidos numa publicação digital sobre arte africana concluem que a expressão arte africana pode parecer muito redutora mas é a que permite lembrar que as artes das sociedades africanas foram, antes, rotuladas no singular, depois de terem sido chamadas de "arte primitiva" ou "selvagem". Isso quer dizer, segundo a mesma publicação, que se trata de uma arte única no mundo que, infelizmente, foi minimizada diante das ideologias que se vêm construindo desde o renascimento europeu, que culminou na escravidão das Américas e na colonização do continente africano e que, até hoje, ameaçam a aceitação das diferenças individuais e colectivas do pluralismo cultural em todo o mundo.

Nisto enquadra-se também a arte moderna africana que, segundo a 'Artáfrica', tem sido uma anomalia no mapa da modernidade artística do século XX. Acompanha-nos desde os começos do modernismo e no entanto, numa espécie de ritual cíclico, parece ter sido frequentemente necessário validar a sua inclusão no estudo da arte do século XX.

Acresce que as marcas de uma consciência moderna na obra de artistas africanos têm sido invariavelmente ligadas à missão civilizadora e à acção disciplinadora do projecto colonial europeu. Quer o colonialismo tenha ou não inadvertidamente plantado as sementes da arte moderna africana, a medida em que essa arte continua a dever-se a metodologias europeias permanece sujeita a intenso debate.

Os primeiros estudos argumentavam muitas vezes que as raízes do movimento moderno em África assentam na introdução dos currículae convencionais europeus nas escolas secundárias coloniais no início do século XX, mas esta versão da história, segundo este centro de estudos da Fundação Calouste Gulbenkian, exige um exame mais cuidado.

Pois que a sua lógica obedece à suposição de que a emergência da África na modernidade se deveu em larga medida à mediação do colonialismo A perspectiva que vê na educação colonial o agente da emergência da arte moderna africana defronta-se com várias contradições e com um paradoxo.

Para começar, apesar da introdução da educação artística europeia em zonas neo-islâmicas do continente ter acarretado uma mudança na atitude do colonizado face ao colonizador, a missão colonial não foi aí de modo nenhum o principal agente de produção artística.

Na realidade, inicialmente não prestou qualquer atenção às artes visuais, centrando sobretudo as suas preocupações na satisfação das necessidades dos poderes coloniais em recrutar o trabalho de mão-de-obra subalterna. Por exemplo, funcionários para a administração pública.

Nos casos em que a arte fazia parte dos curriculae coloniais, restringia-se à noção de artesanato. A inclusão da arte nos programas apenas se iniciou quando africanos escolarizados o exigiram.