E nem os já tradicionalmente eficazes anúncios de mais cortes na produção por parte da OPEP+, a organização que junta no esforço de manter os mercados equilibrados e a favor das suas contas nacionais os Países Exportadores (OPEP) e a Rússia, a encimar um grupo de desalinhados, parecem conseguir estancar esta hemorragia.

Para se certificar de que este cenário é bem real, e merecedor de atenção especial pelas economias petrodependentes, basta ir consultar um dos muitos gráficos dos sites especializados no negócio do crude, onde ofusca a queda brutal dos mais de 93 USD por barril em finais de Setembro para os actuais 76 USD por barril, e em queda, de pelo menos 1,23 %, para 76,29 dólares, perto das 13;00, hora de Luanda, nesta quarta-feira, 06 de Dezembro.

O que pode estar a pressionar desta forma o barril, quando a OPEP+ foi ao arsenal buscar a sua arma mais pesada para combater o inimigo principal, o esgar de que a produção pode ultrapassar a procura, que é anunciar novos cortes na produção que é de quase 50% do crude consumido diariamente no mundo, cujo total passa ligeiramente os 102 milhões de barris por dia (mbpd)?

Embora o fortalecimento do dólar dos EUA não possa ser ignorado como causa, alguns analistas dizem que foi principalmente a fragilidade do anúncio da OPEP+ na sua última reunião, a 30 de Novembro, que não passou muito do que era já conhecido, com os 2,6 mbpd que vigoram há quase um ano, mais os 1,3 mbpd, que são cortes voluntários de sauditas e russos, e que devem prolongar-se para 2024, sendo que Moscovo aumentou a sua quota parte de 300 mil bpd para 500 mil bpd, sendo uma parte de 2 mbpd remanescentes deverá ser anunciada singularmente pelos países-membros.

Ora, aqui surge um ponto onde Angola pode estar a contribuir para esta falta de solidez do anúncio, porque, coincidindo com uma incandescente aproximação político-diplomática de Luanda a Washington, encimada pelo encontro recente de João Lourenço e Joe Biden na Casa Branca, o Governo angolano, segundo a Bloomberg, anunciou que não vai respeitar a quota de redução que lhe foi atribuída, indo produzir 1,18 mbpd em vez dos 1,11 mbpd.

Não sendo um valor refulgente, é, simbolicamente, denunciador de fricções no seio do "cartel" que, até aqui tem sido eficaz no controlo dessas... fragilidades, o que não escapa aos radares apurados dos mercados, sempre em busca de brechas na muralha erguida pelo eixo Riade-Moscovo.

E a Guiana?!!

Mas o problema pode ser ainda mais grave, como o poderá deixar esclarecido a deslocação do Presidente russo, Vladimir Putin, à Arábia Saudita e aos Emirados Árabes Unidos, esta quarta-feira, recebendo na quinta-feira, 07, em Moscovo, o Presidente do Irão, que constitui o grupo dos cinco quatro maiores produtores da OPEP+.

Esta deslocação foi de tal modo importante pela Moscovo que ignorou por completo o mandato de captura do TPI que impende sobre o chefe do Kremlin. Mas o quê? Além da questão séria do conflito em Gaza, que pode incendiar o Médio Oriente, há um elefante na sala neste momento, que, mesmo sendo pouco citado como razão para a actual crise, pode ser uma das mais sérias brechas na muralha.

A Guiana, pequeno país entalado entre a Venezuela e o Brasil, surgiu recentemente quase do nada como detentor de gigantescas reservas de crude que já estão a ser exploradas pela ginate norte-americana Chevron e que pode, em breve, representar mais 3 mbpd nos mercados, o que, em tese, pode atirar a estratégia da OPEP+ para um buraco sem fundo...

Ora, também coincidindo com este contexto, complexo na solução, simples no diagnóstico, a Venezuela de Nicolas Maduro ameaça agora invadir militarmente uma região da Guiana, Essequibo, sobre a qual tem pretensões históricas, desde o século XIX, mas que agora engrossou o interesse com a descoberta das reservas brutais de crude no seu offshore.

Sendo a Venezuela um aliado sólido de Moscovo e membro da OPEP, se fosse Caracas a controlar as vastas reservas da Guiana, o "cartel" liderado por sauditas e russos deixaria de ter este problema em mãos, embora isso fosse contra os interesses estratégicos dos Estados Unidos da América, que anseiam por ver a matéria-prima muito mais barata e abundante de forma a controlar a sua crise inflacionista que vive há dois anos, praticamente desde o início da guerra entre a Rússia e a Ucrânia, e as colateralidades provenientes das sanções ao sector energético de Moscovo, especialmente as disrupções no fornecimento global.

Para Angola...

... estas contas são complicadas de fazer, porque, se por um lado, permitem satisfazer os interesses do seu novo aliado estratégico, os EUA, por outro, reduzindo o valor do barril, decresce o superavit conseguido depois de o OGE2024 ter sido elaborado com base num preço médio de 65 USD, embora nestas circunstâncias, o Executivo espere sempre que esse valor não seja alcançado em baixa, o que pode bem vir a suceder em breve se a queda global não for travada.

Angola é um dos produtores e exportadores que mais dependem da matéria-prima em todo o mundo, devido à escassa diversificação económica, e ter o Brent nos 76 USD não permite diluir os efeitos devastadores da crise cambial e inflacionista, até porque o país enfrenta também o problema da persistente redução da produção diária.

No entanto, com o OGE 2024 elaborado com um valor de referência médio para o barril de 65 USD, estes valores actuais permitem um relativo optimismo, mas aumentar a produção é o factor-chave.

O Presidente da República, João Lourenço, deposita esperança, no curto e médio prazo, de conseguir o objectivo de manter a produção nacional acima de 1,1 mbpd, gerando mais receita no sector de forma a, como, por exemplo, está a ser feito há anos em países como a Arábia Saudita ou os EAU, usar o dinheiro do petróleo para libertar a economia nacional da dependência do... petróleo.

O aumento da produção nacional não está a ser travada por falta de potencial, porque as reservas estimadas são de nove mil milhões de barris e já foi superior a 1,8 mbpd há pouco mais de uma década, o problema é claramente o desinvestimento das majors a operar no país.

Aliás, o Governo de João Lourenço tem ainda como motivo de preocupação uma continuada e prevista redução da produção de petróleo, que se estima que seja na ordem dos 20% na próxima década, estando actualmente pouco acima dos 1,1 milhões de barris por dia (mbpd), muito longe do seu máximo histórico de 1,8 mbpd em 2008.

Por detrás desta quebra, entre outros factores, o desinvestimento em toda a extensão do sector, deste a pesquisa à manutenção, quando se sabe que o offshore nacional, com os campos a funcionar, está em declínio há vários anos devido ao seu envelhecimento, ou seja, devido à sua perda de crude para extrair e as multinacionais não estão a demonstrar o interesse das últimas décadas em apostar no país.

A questão da urgente transição energética, devido às alterações climáticas, com os combustíveis fosseis a serem os maus da fita, é outro factor que está a esfumar a importância do sector petrolífero em Angola.